Vale do Ribeira em estado de calamidade

Defesa Civil contava, até ontem, 18 mil pessoas atingidas em 9 cidades da região

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Por José Maria Tomazela
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ENVIADO ESPECIAL / REGISTROSentada em um barranco em Registro, a aposentada Aparecida Ribeiro dos Santos, de 66 anos, vigia as águas amareladas que vão marcando as paredes brancas de sua casa. E conta os prejuízos. "Geladeira, guarda-roupa, colchão. O botijão está para boiar." Dona Cida está entre os 18 mil moradores do Vale do Ribeira, no sul do Estado de São Paulo, atingidos pela enchente que, desde segunda-feira, tirou do leito o Rio Ribeira de Iguape.Quatro cidades decretaram estado de calamidade pública: Ribeira, Eldorado, Iporanga e Sete Barras. Segundo a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Estado, outras cinco tinham sido afetadas: Barra do Turvo, Jacupiranga, Registro, Pariquera-Açu e Itapirapuã Paulista. Ao todo, segundo a Defesa Civil do Estado, são 5.162 desabrigados (dependem de abrigos públicos) e 3.248 desalojados (foram para a casa de amigos ou parentes), além de 10 mil afetados.Em Registro, até a tarde de ontem, a cheia tinha atingido 1,2 mil moradores, segundo a Defesa Civil da cidade. Eldorado perdeu 80% da produção agrícola e decretou calamidade pública. A Defesa Civil do Estado colocou em alerta Juquiá e Iguape, as próximas cidades a serem atingidas pela cheia, que segue para o mar.Moradores. Às 5 horas, quando a água invadiu seu casebre abaixo do nível da rua, dona Cida foi acordada pelos gritos do filho: "Mãe, estamos no meio da água." Ela correu para acudir a própria mãe, Brígida, de 94 anos, que é cega. O pipoqueiro Joel da Rocha, de 35, perdeu tudo. "A água subiu muito rápido e não pude tirar nada." Não deu nem para salvar o carrinho de pipoca.Acostumado às enchentes em Registro - a cada dois ou três anos -, o pescador Lino de Souza Lima, de 48, mantém um barco na garagem. Às 4h, pegou a embarcação e foi resgatar moradores ilhados. "Vivo do rio, mas ultimamente não suporto nem ver água."Na zona rural, pelo menos 30 famílias já tinham pedido ajuda, mas as estradas estavam alagadas. Bombeiros em barcos também faziam salvamentos. No entanto, em muitos bairros atingidos, adultos e crianças se concentravam na borda da cheia. Muitas pessoas preferiam ficar vigiando a casa contra invasores a ir para os abrigos da prefeitura. A dona de casa Ângela Rosa Conceição, de 49 anos, preferiu levar a família para o Centro de Atenção Social da Vila Nova. "O problema é que não tem chuveiro."Às 16 horas, o nível do rio, que normalmente é de 1,67 metro, tinha se estabilizado em 5,91 metros. O comerciante Raimundo Pereira de Paiva, de 48 anos, colocou um marco para medir a profundidade da água. Mais alguns centímetros e seu mercadinho no bairro Vila Nova seria invadido. Encarregado de um porto de areia, Vilmar Kleszuzuk, de 50 anos, acompanha há quase 40 as cheias do Ribeira. Cada vez que o rio sobe, ele suspende o trabalho e recolhe as máquinas de extração. "Da década de 1970 para cá, tivemos pelo menos 25 enchentes." A pior foi em 1997, quando o rio subiu 14 metros. Outras grandes ocorreram em 1983 e 2004, mas nada como a atual. Ações. O governador em exercício, Guilherme Afif Domingos, sobrevoou ontem as áreas afetadas. Em Eldorado, recebeu prefeitos e prometeu apoiar a recuperação da região. "A gente sabe que em uma região chuvosa como essa a conservação de estradas é muito difícil e precisa ser feita permanentemente. Graças a Deus, não morreu ninguém. O resto dá para consertar."Para a prefeita de Registro, Sandra Kennedy (PT), a prioridade é a recomposição das estradas destruídas. Ela diz que os municípios tinham acabado de recuperar 80% da malha viária com recursos de R$ 8,5 milhões do governo federal. "Com a cheia, voltamos à estaca zero."O secretário estadual de Saneamento e Recursos Hídricos, Edson Giriboni, e o superintendente do Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee), Alceu Segamarchi Júnior, se reúnem hoje com prefeitos da região. O Daee mandou uma escavadeira para Iguape para tirar mais de 20 mil metros cúbicos de entulho arrastados pela água.

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