Uma janela de oportunidades sem precedentes

ARTIGO. Se o Brasil quiser dar novo sentido às suas principais cidades, a hora é esta. Recursos existem

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Por André Urani
Atualização:

O Rio de Janeiro vai, enfim, revitalizar sua região portuária. A mobilização do empresariado e da sociedade civil em torno deste tema começou no fim dos anos 1970, muito antes que fossem revitalizados Puerto Madero, em Buenos Aires, os Docks de Londres, o Porto de Belém e grande parte dos waterfronts americanos. De lá pra cá, foram realizados inúmeros estudos e debates, que se revelaram totalmente estéreis - diante da falta de coordenação política entre as diferentes instâncias governamentais, que detinham, conjuntamente, 85% dos imóveis e terrenos dessa área gangrenada da cidade. Vários fatores contribuíram para que a situação se desbloqueasse:a) O clima inédito de entendimento hoje existente no Rio de Janeiro entre os vários níveis de governo permitiu que as propriedades dos governo federal e estadual fossem transferidas para a Prefeitura;b) A Prefeitura recuperou a capacidade de planejar e, não menos importante, de investir;c) O governo federal viabilizou financeiramente o projeto, disponibilizando R$ 3,5 bilhões do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço para a realização da segunda - e mais importante - fase do plano: a da operação urbana consorciada que, entre outras coisas, derrubará o famigerado viaduto da perimetral e devolverá o porto para os cariocas. Esse montante corresponde a mais de 50% do valor estimado do Fundo de Investimento Imobiliário que está sendo criado para financiar a operação. Os demais recursos deverão provir da venda de terrenos e imóveis (R$ 500 milhões) e da emissão de Cepacs (em torno de R$ 2,5 bilhões), possibilitada pela mudança de gabarito que a prefeitura pretende aprovar na região do Mangue, adjacente ao Porto.Tudo isso é muito bom e merece ser comemorado. Mas o que não falta, em nossas principais regiões metropolitanas, são áreas gangrenadas, que precisam ser reinventadas. Não apenas os centros urbanos - outras áreas centrais do próprio Rio, contíguas ao Porto -, como também os subúrbios, desindustrializados e abandonados à própria sorte, e as bacias e os mananciais, poluídos e urbanisticamente degradados.Recursos existem - e de sobra: públicos e privados, nacionais e internacionais.Falta é vontade política para formatar regras e instituições que permitam que operações como a do Porto Maravilha se repitam, em larga escala, em outros contextos. O que impede o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por exemplo, de criar um fundo concursável para a revitalização de nossas metrópoles? Será que projetos como os de saneamento da Baía de Guanabara, no Rio, ou da Represa do Guarapiranga, em São Paulo, não teriam retorno econômico no longo prazo? Será que não existem atores públicos e privados interessados em projetos desse tipo? Ou será que eles simplesmente não são considerados estratégicos para o País como um todo? Ninguém está considerando a hipótese de despejar dinheiro de graça em projetos faraônicos de retorno duvidoso. O BNDES é antes de tudo um banco e, enquanto tal, tem de zelar por seu patrimônio, emprestando apenas para quem puder formatar projetos consistentes e apresentar garantias sólidas. Se não quisermos ser meros exportadores de minérios e de proteínas animais e vegetais, como preconizou o celebre relatório do Goldman Sachs que nos colocou entre os BRICs, é bom que acordemos para a necessidade de darmos um novo sentido às nossas principais cidades, que se desvocacionaram a partir da implosão do modelo nacional-desenvolvimentista, no início da década de 1980. A hora é esta: a organização de grandes eventos internacionais, como a Rio+20, a Copa do Mundo de Futebol 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 nos abre uma janela de oportunidades sem precedentes - que promete não se repetir tão cedo.André Urani é economista, pesquisador do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), diretor do Instituto Natura e consultor de diversos organismos internacionais

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