Três homens de olho nos perigos do mar

Conheça o guarda-vidas mais bonito, o mais antigo e o líder de resgates do litoral de SP; saiba como evitar acidentes na praia

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Por Paula Felix
Atualização:

GUARUJÁ - Olhar o mar e buscar entendê-lo. Saber que ele pode não estar igual no dia seguinte e todos os dias tentar ser mais rápido que as correntezas que levam os desatentos. Perceber de longe os movimentos errantes de quem pode se afogar. Assim é a rotina dos guarda-vidas, profissionais que têm a missão de cuidar dos banhistas que lotam as praias paulistas, principalmente durante o verão.

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Estado solicitou ao Grupamento de Bombeiros Marítimo (GBMar), do Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo, a indicação de três profissionais entre os 510 que atuam na corporação para contar como funciona o dia a dia dos salva-vidas que atuam no litoral: o campeão de salvamentos, o mais antigo em atividade e aquele que é considerado o mais bonito.

“Os dados que nos interessam das ocorrências são os dados referentes ao afogado e não ao socorrista”, informa, em nota, o GBMar. Mesmo assim, os 23 anos de atuação do cabo Luís Roberto Alves de Souza, de 43 anos, não passaram em branco. Em atuação no Guarujá, que concentra um terço de todos os salvamentos registrados por ano em todo o litoral paulista, ele se destaca como o líder em resgates.

Capitão Fiorentini (à esq.), cabo Souza e cabo Marcelo no Guarujá: cidade concentra 1/3 dos salvamentos do litoral de SP Foto: Rafael Arbex/Estadão

“Em um dia, em 1996 ou 1997, cheguei a fazer 32 salvamentos. Foi no carnaval. Tive o apoio dos outros guarda-vidas, mas foram muitos salvamentos”, relembra. Mesmo com todo o preparo, cabo Luís já esteve muito perto da morte. “Foi no dia 3 de novembro de 2002, não me esqueci da data. O mar estava grande com dois metros de onda. A vítima caiu das pedras e fui resgatá-la de bote com um parceiro, mas o bote virou. Ficamos à deriva, levando onda na cabeça, quase perdi a vida. A vítima foi tirada pelo meu parceiro e, se não fosse o preparo de mergulho, eu teria perecido.”

Apesar da imagem de profissional que atua para salvar quem está em perigo, ele diz que a função do guarda-vidas é impedir que os acidentes aconteçam. “A primeira coisa que fazemos ao chegar à praia é olhar as mudanças de correnteza, colocamos a sinalização e o isolamento das áreas. Também orientamos as pessoas verbalmente, porque tem gente que nunca foi à praia. O problema não é a pessoa que não sabe nadar, porque ela tem medo, mas quem sabe. Quem sabe nadar, já é do mar.”

Ele conta que já viu várias pessoas perderem a vida em dias de lazer e que trabalha para que as cenas não se repitam. “O mais gratificante do nosso trabalho é saber quem ninguém afundou naquele dia, que ninguém vai chorar. É muito injusto quando uma família vem para se divertir e leva uma pessoa querida dentro de um caixão. É muito doloroso.”

Com 16 anos de carreira, dos quais nove são como salva-vidas, o capitão Rodrigo Fiorentini, de 36 anos, sai pela tangente quando o assunto é o título de guarda-vidas mais bonito atribuído pela própria corporação. “Fiquei sabendo disso nesta semana”, diz, referindo-se ao contato feito pela reportagem no início do mês.

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Mas não nega que ocorram casos de assédio na praia. “Acontece. Acho que desperta algo por causa da farda, mas a gente representa o Corpo de Bombeiros e tem uma postura. Nossa preocupação é salvar as pessoas e não podemos nos distrair com nada. A gente está trabalhando enquanto os outros estão se divertindo e, em um segundo, uma pessoa pode cair na correnteza. Na verdade, é bem difícil e desgastante.”

Prefere falar sobre sua atuação como salva-vidas, feita em alto-mar. Ele trabalha em embarcações fazendo buscas por desaparecidos em casos de naufrágio, em navios de combate a incêndios e em operações de mergulho. "Quando temos buscas em alto-mar, a situação é mais crítica. Passamos um longo período realizando pesquisas e nossa maior preocupação é entregar as pessoas desaparecidas de volta para a família."

Ele é um representante frequente da corporação em competições nacionais e internacionais. “A gente tem a cultura de treinamento. Participo de provas de natação, travessias, triatlo. Em 2011, participei de um campeonato mundial na Austrália com provas de piscina e salvamento na praia. Gosto de esportes.” Também já participou do Iron Man, prova que engloba 3,8 km de natação, 180 km de ciclismo e 42 km de corrida.

No braço. Entre os salva-vidas que atuam no Estado, o cabo Benedito Marcelo, de 50 anos, foi apresentado como o profissional com mais tempo de atuação e que permanece em atividade. Sua história começou em 1987 e ele foi levado à profissão por ser praticante de esportes.

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“Sempre gostei também da área de salvamentos. A gente tem de ter preparo físico e estar sempre em dia com o treinamento é um desafio.” Casado, ele é pai de um rapaz de 24 anos e uma garota de 13. O exemplo ao longo dos anos inspirou o filho mais velho, que pensa em seguir a carreira. “É o primeiro ano dele como guarda-vidas municipal em Caraguatatuba. Ele vai prestar concurso porque quer trabalhar como guarda-vidas.”

Cabo Marcelo tem o perfil clássico do que se imagina de um salva-vidas: é musculoso, troca poucas palavras e está sempre observando o mar. Embora atue há quase 30 anos na praia, não exibe rugas profundas nem tem a pele queimada pelo sol. “O pessoal começou a usar mesmo protetor solar em 1995. Não era uma preocupação antes. Mas, depois, começamos a nos cuidar usando sempre protetor e óculos com proteção solar.”

Ele diz que o trabalho costuma ficar mais pesado nos finais de semana de alta temporada, quando as areias ficam lotadas com pessoas que vão afoitas para o mar, crianças que se perdem dos pais e o álcool faz com que os banhistas percam o medo do perigo. Quando a correnteza aparece, os salvamentos são trabalhosos.

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“Várias vezes achei que não conseguiria salvar as pessoas. Já salvei três, quatro, cinco vítimas de uma vez só. Uma pessoa tenta ajudar a outra e todas se tornam vítimas.”

O guarda-vidas relembra que, quando iniciou a carreira, o salvamento dependia mais do profissional do que dos instrumentos disponíveis na época. “Quando cheguei, era tudo na força física, no treinamento. Não tinha flutuador. As técnicas evoluíram. Antigamente, a gente tirava as pessoas da água só no braço.”

EVITE ACIDENTES:

1. Informação

Ao chegar à praia, busque o posto de guarda-vidas e se informe sobre a situação do mar naquele dia. Respeite as orientações que receber

2. Sinalização

Fique atento à sinalização colocada ao longo da praia e não entre no mar nas áreas perigosas

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3. Infláveis

Evite usar colchões infláveis no mar, pois eles são facilmente levados pelas correntezas

4. Nível da água

Ao entrar no mar, mantenha-se com a água, no máximo, na linha do umbigo

5. Álcool

Evite bebidas alcoólicas se pretende nadar ou se divertir na água

6. Afogamento

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Se notar que uma pessoa está se afogando, chame rapidamente um guarda-vidas. Não tente salvá-la se não tiver treinamento para não causar um afogamento coletivo. Caso você seja a vítima, mantenha a calma e tente acenar para ser salvo. Não nade em direção à areia para não ficar cansado, mas tente boiar ou nadar paralelamente ao horizonte para tentar sair da correnteza

Fontes: capitão Rodrigo Fiorentini e capitão Pelliccioni, chefe de operações do Grupamento de Bombeiros Marítimo (GBMar)

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