12 de junho de 2011 | 00h00
A teoria ainda está na engorda, mas o Niltão já tem o que mostrar, e me fala de duas categorias bem delineadas. Uma é o "motel-para-casar". Aquele cujas suítes não têm cara de motel, ele explica. Nada de cama redonda nem de espelho no teto, e muito menos daquela caranguejola de tubos esmaltados onde pares mais animados se encaixam para peripécias sexuais quase circenses. Bonita, charmosa, aconchegante, numa suíte de motel-para-casar você se sente em casa - e é aí, alerta o Niltão, que reside o perigo: "Se você bobear e se deixar levar pelo clima, corre o risco de sair noivo".
Ele se deu conta disso faz uns meses, quando, excepcionalmente, esteve num motel desses, para os lados do Morumbi. Entre o primeiro e o segundo tempo, subiu, pelado, ao terraço da suíte dúplex, fabuloso mirante do qual, sem ser visto, pôde contemplar um belo naco da metrópole. Balangandãs ao vento e a cidade aos pés, o Niltão experimentou momentos de apoteose mental. "Eu cheguei lá!", pegou-se a pensar. Mais um pouco, conta, e estaria dizendo "sim" aos pés do altar.
Para não correr o risco, ainda mais depois que sua conta bancária também emagreceu, ele trata de escolher estabelecimentos menos exaltantes. Até mesmo aqueles que em sua teoria levam o nome provisório de "motéis de chuveiro elétrico". Mofo nas paredes, frigobar inoperante e sabonetinho já em andamento. O conjunto é anafrodisíaco, diz o Niltão, capaz às vezes de sacar palavras finas. Ainda bem que não vai ali com intuitos eróticos. Vai para dormir, acredite, e mais: dormir sozinho.
Explica-se: o Niltão tem pesadas madrugadas de trabalho, e, para aguentar o tranco, precisa às vezes dar uma parada, tirar uma soneca. Como mora longe, o jeito é recorrer aos motéis de chuveiro elétrico que pululam nas imediações. Ali encontra sossego - sossego que não teve naquela noite em que, em pandarecos, foi dar com os costados num motel chique das redondezas. O funcionário estranhou que tivesse chegado sozinho, e, talvez condoído, meia hora depois o acordou com um telefonema: amigo, a casa pode disponibilizar uma boneca inflável. Inflado ficou o Niltão, de ódio.
Quando o objetivo não é exatamente dormir, entre o motel-para-casar e o de chuveiro elétrico ele dá preferência a outro tipo de estabelecimento, que talvez venha a constituir uma subcategoria em seu estudo: o drive-in. Pena que a instituição esteja em decadência, lamenta o Niltão, saudoso dos tempos em que a Marginal do Tietê era "um colar de drive-ins". No auge da juventude e ainda esbelto, perdeu a conta dos filmes que não viu naqueles lúbricos estacionamentos, mais ocupado que estava com o que se passava ao vivo.
Chegou a frequentar um drive-in para pombinhos pedestres. Apeavam do ônibus, ele e alguma namorada, e entre carcaças de automóveis iam escolher a que mais lhes convinha para a urgência carnal. Em dia comum, a mesma sambada Brasília ou o idoso Chevette em que, felizes, já haviam sacolejado. Em dia especial, quando bolsos mais fornidos bancariam o romantismo cinematográfico de uma carruagem, seus corações momentaneamente perdulários balançavam entre dois luxos outrora movidos a numerosos cavalos: o Galaxie ou Dodge Dart? Cê que sabe, ronronava benhê, já aninhada no peito de mô.
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