São Paulo vai do Brasil até a Armênia na segunda noite

Enredos da elite paulistana falam ainda de Amazônia e do Peru; encerramento foi da Gaviões, que retomou um tema de 25 anos: o tabaco

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Foto do author Gilberto Amendola
Por Juliana Diógenes e Gilberto Amendola
Atualização:

A chuva que atingiu a capital paulista na tarde e noite deste sábado, 2, deu uma trégua e a Águia de Ouro, primeira escola do último dia de desfile paulistano no Sambódromo do Anhembi, na zona norte de São Paulo, entrou na avenida ainda úmida às 22h50. 

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Na madrugada deste sábado para domingo, outras sete escolas se apresentaram: Águia de Ouro, Dragões da Real, Mocidade Alegre, Vai-Vai, Rosas de Ouro, Unidos de Vila Maria e Gaviões da Fiel. Tal como na sexta-feira, 1º, nenhuma escola do segundo dia registrou atraso no cumprimento do tempo regulamentar de desfile (1h05).

Destacaram-se a Dragões da Real, abusando do dourado e do vermelho, sob um samba-enredo que teve o tempo como tema. A Vai-Vai desfilou em defesa da diversidade e das raízes africanas, e pediu o fim do racismo, do machismo e da homofobia. 

Dragões da Real é um dos destaques do último dia de carnaval em São Paulo Foto: Andre Penner/ SP

A última a entrar no sambódromo do Anhembi foi a Gaviões da Fiel, agremiação da torcida corintiana. O público recebeu a escola com os já tradicionais sinalizadores. A sedução do tabaco foi exaltada no samba que levantou a arquibancada já nos primeiros raios de sol do domingo, por volta das 6 horas, quando entrou na avenida.

Veja detalhes das sete escolas que entraram na avenida no último dia de desfiles, por ordem de aparição:

Águia de Ouro. Primeira  entrar no último dia de desfiles do Grupo Especial, a Águia de Ouro trouxe como samba-enredo "Brasil, eu quero falar de você! Que país é esse?" e fala sobre dois extremos: as riquezas e as mazelas do País. Em tom politizado, aborda o contraste entre "a farra das elites sociais" e "o povo na rua". A composição tratou ainda da ganância e da ambição dos poderosos.

Banhado de dourado, o carro abre-alas levou várias águias de asas abertas que se movimentavam no topo. A apresentação começou no descobrimento do Brasil, com os colonizadores e índios, e uma alegoria com um navio dos descobridores.

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Dragões da Real. Por volta de meia-noite, a Dragões da Real entrou na avenida do samba neste sábado, 2, segundo dia de desfiles no Anhembi. A escola traz o tempo como tema, tendo no samba-enredo o mote "A invenção do tempo. Uma odisseia em 65 minutos". 

Vários relógios tomam conta dos carros alegóricos que, banhados em vermelho e amarelo, se destacam pela imponência e pelo brilho na avenida. As cores preta e branca também marcam a agremiação.

No segundo carro, o titã Cronos, deus do Tempo e filho de Urano, da mitologia grega, segura uma ampulheta. Engrenagens de relógio permeiam toda a alegoria, que vem rica em detalhes que abusam do dourado.

O desfile da Dragões tenta desvendar o mistério do tempo ao abordar, por exemplo,  viagens ao passado. A composição também fala sobre o mundo veloz regido pela pressa e a escravidão em relação aos ponteiros do relógio.

Na ala "Relógio de Pêndulo", a escola apresenta as mães do samba, que nos terreiros ditam, com sabedoria, o tempo para os acontecimentos. 

Mocidade Alegre. A Mocidade Alegre foi a terceira escola a entrar na avenida, por volta de 1 hora, inundando de vermelho, verde e branco o sambódromo. Durante o desfile, a presidente Solange Cruz passou mal e precisou ser socorrida na ambulância do Anhembi.

Com 3,5 mil integrantes, 23 alas e cinco alegorias, a escola cantou uma lenda amazônica no seu samba enredo: "Ayakamaé - As águas sagradas do sol e da lua". Em tupi, Aya significa rio e kamaé é amor. 

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Na composição, o grupo mostrou na avenida a história do sol e da lua, que eram amantes, mas nunca conseguiram se encontrar. 

Com a impossibilidade de ficarem juntos, o Sol, dono do dia, e a Lua, rainha da noite, lamentam a situação e o choro deles leva até o mar, fazendo emergir vales e serras. Assim teria nascido o Rio Amazonas. 

As águas do Eterno Amor de Sol e Lua foram representadas por fantasias holográficas em verde e vermelho, com bichos aquáticos de asas.

A letra citou também Yara e Tupã, entidades lendárias da região amazônica. A homenagem é uma exaltação ao Amazonas. Um ponto forte da agremiação foi a explosão de cores puxadas para o neon, principalmente o verde e o amarelo.

Vai-Vai. Quarta escola a se apresentar na última noite de desfile, a Vai-Vai levou para a avenida o samba-enredo "O Quilombo do Futuro". Representada pelas cores preto e branco, a escola de samba do Bixiga entrou no sambódromo por volta de 2h30.

Um destaque foi a presença de Anielle Franco, irmã da vereadora Marielle Franco, assasinada há quase um ano. Ao G1, ela disse que sentiu uma "emoção enorme". "O samba da Vai-Vai falava muito sobre ela e o que ela significou para gente nesse tempo enquanto viva e agora com esse legado". 

A agremiação bradou contra o preconceito e em defesa das raízes africanas. Um dos carros alegóricos pediu "Poder para o povo preto". E uma ala pregou a diversidade, pedindo o fim da homofobia e do racismo.

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A composição exaltou as lutas do povo negro, destacando figuras religiosas, como Odoyá e Ogum, e políticas, como Nelson Mandela.  

"Porque eu sou da pele preta / Quilombo do povo / Sou maior / Um privilégio que não é para qualquer um / Protegido e abençoado por Ogum", cantou a escola. A escravidão e o navio negreiro também foram representados. "Ecoa o grito forte da senzala / Nos olhos brilha um novo amanhecer".

Rosas de Ouro. Com a Rosas de Ouro, quinta escola a desfilar no último dia de carnaval paulistano, a Armênia invadiu a avenida do samba com o samba enredo "Viva Hayastan" por volta das 3h30. O rosa, cor padrão do grupo, esteve em todos os detalhes das alegorias e alas, em diferentes tonalidades. Predominaram ainda o azul e o branco.

A agremiação homenageou o povo armênio que sofreu genocídio, fazendo um elo com a esperança por dias melhores, com os sentimentos de fé e superação. "Somos heranças da tua raiz / A arte que corre nas veias /Faz nossa gente feliz / A Rosas ergue a bandeira da superação / E canta Armênia nesse carnaval / Celebrando a União", cantou a escola.

Uma das alas teve cadeirantes entre os participantes. A Arte Sacra, o cristianismo e a fé deram a tônica do desfile. Na avenida, exalou aroma de romã, fruta típica da Armênia que remete à fertilidade e é um símbolo da abundância na cultura local. 

Unidos de Vila Maria. A Unidos de Vila Maria foi a penúltima a entrar na avenida no sambódromo. Já passava das 4 horas quando a escola da zona norte deu início ao desfile. 

A escola homenageou o Peru, com o enredo "Nas Asas do Grande Pássaro, o Voo da Vila ao Império do Sol". Embora a agremiação tenha como cores-símbolo o verde, o azul e o branco, chamou atenção o contraste com o uso do dourado, cor que remete à cultura inca, conhecida pelos rituais e festas de exaltação ao Sol.

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Uma ala foi dedicada especialmente aos festejos peruanos em Cuzco. Antigos rituais da civilização também foram exaltados.  Durante a passagem da Unidos de Vila Maria, um grupo de peruanos agitava bandeiras do País em celebração à homenagem.

Com o verso "Império do Sol, no alto dos Andes / Onde o pranto do céu formou a nascente / Fonte da vida, das águas, emana / Viva a nação peruana", a Vila Maria encantou ao lembrar da fé em suas divindades, orações e templos.

Gaviões da Fiel. Encerrando o Carnaval 2019 em São Paulo com Sabrina Sato como rainha, a Gaviões da Fiel - sétima escola do último dia de desfiles do Grupo Especial - entrou com o céu já claro pouco antes das 6 horas deste domingo, 3, levantando a arquibancada.

A homenagem do enredo da torcida corintiana é ao tabaco. Com o samba "A Saliva do Santo e o Veneno da Serpente", a Gaviões contou histórias e lendas envolvendo o tabaco, incluindo características e malefícios. 

Em 1994, outra versão do samba enredo cantado à época foi cantado pela escola. Desde então, a canção  do "cigarrinho" vem sendo entoada durante partidas do Corinthians. Em 2019, o "segundo cigarrinho" da Gaviões apresenta um samba enredo focado na erva que curou dores, mas também sobre o veneno que seduz.

Como representação do contraste da história do tabaco ao longo da história, anjos e demônios introduziam os trabalhos da Gaviões no abre-alas do grupo. Um diabo vermelho e um anjo branco com espada se alternavam no controle de um Jesus Cristo ensanguentado, representando o humano.

A escola brilhou nas cores vermelha e dourado, tendo um primeiro carro alegórico encabeçado por um demônio, uma serpente e um gavião.

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No desfecho do samba, a agremiação encerra entoando um pedido de moderação:  "Liberdade pra você/ É um raro prazer / Sabor de emoção/ Mas não abuse/ Que faz mal pro coração e pro pulmão".

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