São Paulo estuda até vetar obras para preservar urbanismo

Lei, polêmica, barraria construções que obstruam vista de patrimônios e protegeria traços históricos da capital

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Por Rodrigo Brancatelli
Atualização:

 

Dá para imaginar uma São Paulo sem obras faraônicas como o minhocão? Foto: Werther Santana/AE

 

Uma São Paulo sem o Elevado Costa e Silva. Sem prédios em volta do Parque do Ibirapuera, sem a Ponte Octavio Frias de Oliveira (a ponte estaiada), sem a polêmica cobertura branca desenhada por Paulo Mendes da Rocha na Praça do Patriarca. Em suma, sem empreendimentos imobiliários, obras faraônicas ou intervenções artísticas que atrapalhem a paisagem da cidade e obstruam a vista de marcos urbanísticos paulistanos. A intenção - que, no mínimo, tem todos os ingredientes para causar polêmica - está contemplada agora no Plano Diretor da Paisagem Urbana, novo projeto de lei formulado pela Empresa Municipal de Urbanização (Emurb) da Prefeitura para proteger os traços históricos da capital.Trata-se de uma espécie de segunda fase da Lei 4.223/06 , a Cidade Limpa, principal vitrine da primeira gestão do prefeito Gilberto Kassab (DEM). Depois de retirar os outdoors e os anúncios das fachadas, planeja-se agora evitar que novos prédios ou viadutos tampem a visão do patrimônio. "O Plano Diretor da Paisagem Urbana será um conjunto de regras para manter o urbanismo que queremos na cidade", diz a arquiteta Regina Monteiro, diretora de Projetos, Meio Ambiente e Paisagem da Emurb, que prepara o texto. "Veja, por exemplo, o Minhocão: se tivéssemos essa lei antes, nunca teriam construído aquele monstro. Ou não teriam construído tantos prédios em volta do Ibirapuera, que hoje sufocam o parque e atrapalham a visão das áreas verdes. O que queremos com este novo projeto de lei é que seja possível enxergar espaços que estão fechados atualmente e proteger aquilo que ainda é caro para os paulistanos."A cidade tem hoje três conjuntos de leis que ordenam o urbanismo dos bairros - a de tombamento (que não permite obras em imóveis históricos), o código de obras (que fala sobre a relação de um empreendimento com o seu lote) e o zoneamento (que define o tipo de empreendimento e tamanho máximo permitido nas diferentes áreas de São Paulo). No entendimento da Emurb, falta ainda um mecanismo para disciplinar urbanisticamente a relação das novas obras com os vizinhos. Em países da Europa e até em cidades brasileiras, como São Luís (MA) e Santos, esse tipo de legislação já existe e chega a definir até se o estilo e o desenho de um prédio em construção não vai contrastar com os imóveis ao redor.Por aqui, o projeto de lei - que ainda será finalizado e enviado para a Câmara - não pretende coibir ou mudar o estilo arquitetônico dos novos prédios, mas sim impedi-los de atrapalhar a visão do que já existe de importante em seu quarteirão ou em seu bairro. "Em volta do Instituto Biológico, por exemplo, seria proibido construir prédios que tampem a visão de quem está na Vila Mariana e hoje enxerga aquele prédio belíssimo", diz Regina Monteiro. "Também seria proibido construir um outro Minhocão no centro, ou erguer um prédio que tampe a fachada do Tribunal de Justiça ou de outro imóvel histórico."Antes mesmo de qualquer discussão sobre o assunto, a ideia já causa polêmica entre urbanistas e arquitetos. "A cidade já dispõe de um Plano Diretor e de uma Lei de Zoneamento bastante complexos e, dentre outros assuntos, considera e restringe as questões de uso e ocupação do solo", diz Luiz Paulo Pompéia, diretor da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio. "Simultaneamente, existem órgãos nas três esferas de governo que foram criados justamente para proteger o patrimônio das cidades e, de um modo ou de outro, atender até mesmo questões como esta."Para Regina Monteiro, no entanto, o debate servirá ao menos para aumentar nos paulistanos a preocupação com a cidade. "Será que é importante para São Paulo ter uma ponte estaiada daquele tamanho descomunal, ou colocar uma cobertura metálica em uma praça histórica como a do Patriarca? Essa discussão toda que estamos propondo agora só vai ajudar a entender melhor que São Paulo queremos manter para o futuro."

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