Quanto mais pobre, menos o brasileiro confia na polícia

No geral, três em cada cinco pessoas ouvidas em pesquisa não acreditam na corporação; para especialista, falta diálogo

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Por William Cardoso
Atualização:

Quanto mais pobre, menos o cidadão confia na polícia. Esse é o resultado de uma pesquisa nacional feita pela Fundação Getúlio Vargas no primeiro trimestre. O levantamento aponta que 77% das pessoas que ganham até dois salários mínimos (R$ 1.244) não acreditam nas forças policiais. Vivem nessa faixa de renda 46,3% dos brasileiros. No geral, três em cada cinco pessoas não confiam. A pesquisa foi feita com 1.550 pessoas, em seis Estados e no Distrito Federal. O índice de confiança aumenta conforme a renda do entrevistado. Entre os mais ricos - aqueles que ganham mais de 12 salários mínimos -, 59% não acreditam na polícia.Responsável por coordenar a pesquisa, a professora Luciana Gross Cunha, da Escola de Direito de São Paulo, diz que há razões para que as pessoas de baixa renda desconfiem mais. "É porque residem e frequentam locais de mais risco, convivem com o aparato policial voltado para o combate à criminalidade. Nem sempre a polícia é vista nesses lugares como um sinal de segurança, mas de ameaça."Segundo Luciana, os meios de seleção, treinamento e formação podem mudar essa relação entre a polícia e os mais pobres. Isso passa também pela discussão do papel da polícia e pela valorização - até salarial - do agente público. "Uma vez que você valoriza o policial na comunidade, passa a ser normal e natural a presença dele ali. Agora, quando é desvalorizado, ele se torna perigoso para si e para a sociedade."A desconfiança também é maior entre os mais jovens. Na faixa dos 18 aos 34 anos, 64% das pessoas não acreditam na polícia. Entre os que têm mais de 60, a confiança é maior. Mesmo assim, mais da metade não confia na instituição.Violência. Especialista em segurança pública, o coronel da reserva José Vicente da Silva vê uma série de fatores que contribuem para essa má avaliação da polícia. "O Brasil é um país muito violento, a qualidade dos serviços policiais é deficiente, o índice de esclarecimento de homicídios é baixíssimo, de 8%, as prisões são currais de criminosos e os crimes são extremamente explorados pela televisão."De acordo com o coronel, iniciativas como a adoção do policiamento comunitário, como tem sido feito em São Paulo, podem colaborar para a mudança no relacionamento com a população. "A polícia dialoga mais, faz suas reuniões mensalmente com conselhos de bairro. Essa aproximação é importantíssima, para mostrar o que está sendo feito", afirma. O Estado tem atualmente mais de 500 bases comunitárias.São Paulo. Os números no Estado são praticamente os mesmos do restante do País. Entre os ouvidos pela pesquisa de forma geral, 38,2% acreditam na polícia. Em São Paulo, são 39,9%.A Secretaria de Segurança Pública diz que, além do policiamento comunitário, tem feito grande esforço para aproximar a polícia das pessoas. Na formação dos policiais, há aulas de direitos humanos. Na PM, existem aulas de questões étnico-raciais. A SSP ressalta ainda que adota serviço de atendimento ao consumidor e Central de Flagrantes para diminuir o tempo de espera nos distritos, como forma de atender melhor à população.

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