24 de janeiro de 2014 | 23h50
As paredes do apartamento estão rachadas,
ranhuras fundas na pele de amianto,
cicatrizes que não fecham,
hematomas azulados e marcas de agulhas
por todo o braço.
Cortinas em farrapos acenam para a brisa seca.
Restos de pizza, seringas descartáveis
e ratos em fuga
obstruem a passagem das horas.
Vagões de metrô se atiram em alta velocidade
rumo aos abismos da Penha.
O sol é uma grande cabeça vermelha,
arrastada pela enxurrada
que açoita as pilastras do Minhocão.
A Noite Drogada se contorce como uma loba
atingida por estilhaços de lâmpadas fosforescentes.
Mister Morfina consulta o relógio de pulso,
cujos ponteiros não se movimentam:
apenas um velho hábito
que ainda desperta sorrisos de escárnio.
Lili Maconha contempla a própria pupila negra
no espelho do cine pornô.
O jogo de cartas do Trapaceiro Divino
não sinaliza nenhuma abertura de portas.
Não há epifanias
na paisagem de escombros.
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