Presença de saguis chama a atenção de paulistanos na quarentena

Primatas viraram atração para moradores em bairros como Vila Madalena, Morumbi e Pacaembu; especialista indica não alimentar animais silvestres

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Foto do author Priscila Mengue
Por Priscila Mengue
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Uma sequência de mensagens empolgou os moradores de uma pequena rua da Vila Madalena, na zona oeste paulistana, há uma semana. “Olhem o que apareceu no quintal da casa da minha mãe. Vocês já tinham visto? Um macaquinho!”, dizia a integrante de um grupo de WhatsApp ao enviar vídeo e fotografia caseiros de um sagui.

A novidade se tornou rapidamente o assunto da semana na vizinhança de cerca de 12 casas, cujos habitantes estão em grande parte em distanciamento social por causa da pandemia do novo coronavírus. Vizinha da primeira moradora a receber o sagui, a jornalista aposentada e enfermeira voluntária Maria da Luz Lins, de 61 anos, logo suspeitou de quem seria o “visitante”.

Saguis costumam ser vistos em parques da cidade de São Paulo Foto: Felipe Rau/Estadão

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“Os meus pais são de Santa Catarina, moram na Lagoa da Conceição (em Florianópolis) e lá tem muitos desses ‘miquinhos’, achei que era o mesmo som que ouvia lá”, conta. A vocalização da espécie lembra o soar de um apito ou de alguma ave.

“Naquele dia, ele andou por todas as casas. Todo mundo tirava foto e mandava, foi incrível. Ele passeou por tudo”, relembra Maria da Luz. As aparições continuam a se repetir desde então, nem sempre no mesmo horário e da mesma forma. 

O que mais chama a atenção do animal são as árvores, especialmente uma jabuticabeira que começou a florir com dois meses de antecedência. Mas ele também sobe na fiação, em muros, telhados e parapeitos e outros espaços a certa distância de seus observadores humanos. 

Agora quase “paparazzi” do sagui urbano, os moradores enviaram imagens do animal para uma especialista, que recomendou distância e identificou a espécie (sagui-de-tufos-pretos), caracterizada pela cauda listrada e os tufos escuros nas orelhas. “Ele é muito ágil. Às vezes vejo aqui e, daqui a pouco, alguém já posta foto dele do outro lado. Fica zanzando pelas casas”, comenta.

Maria da Luz também conta que a região tem “muitos passarinhos”. Ela já identificou 14 espécies diferentes, inclusive um pica-pau-amarelo. “O sagui deu um diferencial na quarentena, virou um assunto engraçado.”

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A terapeuta Wania Forghieri, de 58 anos, ficou animada para receber a primeira visita do animalzinho. “O único lugar que eu tinha visto (em São Paulo) sagui era o Parque da Água Branca (no bairro homônimo, na zona oeste). Nunca reparei por aqui. Incrível ter numa cidade como esta.”

Sagui começou a aparecer em rua da Vila Madalena há cerca de uma semana Foto: Wania Forghieri/Arquivo pessoal

O primata encanta especialmente o neto de três anos de Wania, que foi com a mãe passar a quarentena junto da avó. “É uma folia para um criança dessa idade. A gente fica querendo ver, curtir o saguizinho.”

Por causa do novo visitante, a terapeuta até parou de deixar frutas para as aves da região. Ela diz ter percebido uma mudança no comportamento dos pássaros, que se distanciam na presença do sagui. “Você começa a reparar num mundo animal silvestre. Vejo a relação do passarinho com o sagui. A gente está se divertindo."

Relatos se repetem em bairros como Morumbi e Pacaembu

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Relatos da presença de saguis durante a pandemia têm surgido em outras partes da capital paulista. Um grupo de cerca de seis (entre adultos e filhotes) apareceu na vizinhança da empresária Joyce Cotrim, de 53 anos, há aproximadamente um mês, no Morumbi, zona sul. 

“Eles passeiam pelos fios até as árvores”, relata. Na janela do seu escritório, no mesmo bairro, ela também avistou recentemente um tucano-de-bico-preto, conhecido pelos tons de preto, vermelho, amarelo e laranja. Assim como ela, outros paulistanos também têm descoberto aves nas próprias vizinhanças. “Tiro fotos só. Sempre presto atenção em animais ao meu redor.”

Moradora do Morumbi também viu um tucano na janela do escritório Foto: Joyce Cotrim/Arquivo pessoal

Já a aposentada Eliana Assis, de 70 anos, deparou-se com uma dupla de saguis mais no início da quarentena, há mais de dois meses. “Nunca tinha visto em São Paulo, só em Paraty, perto da mata. Ali não tem mata, só árvores grandes. Fiquei pensando de onde poderiam ter vindo”, diz. 

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Moradora do Pacaembu, na zona oeste, ela lembra que o tráfego de veículos ficou bem menor do que na pré-pandemia, o que poderia ter ajudado a atrair os bichinhos. “Estava sentada na sala. Vi os dois saguizinhos em cima dos fios telefônicos, de TV a cabo, passaram super rápido. Chamei meu marido para ver, mas, quando ele levantou, já tinham ido embora."

Saguis são considerados animais invasores na cidade

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Os saguis são nativos de algumas regiões de São Paulo, mas são considerados “invasores” nas áreas urbanas paulistanas. Alvo de domesticação, esses animais acabam se multiplicando em cidades como São Paulo e Rio após serem abandonados ou fugirem do cativeiro. Eles são onívoros e se alimentam de frutas, insetos, seiva de árvores e até aves e pequenos répteis.

“Hoje temos um híbrido de duas espécies que colonizam progressivamente os bairros da cidade”, explica Juliana Summa, diretora da Divisão de Fauna Silvestre da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. “Por exemplo, no bairro do Morumbi, esses animais já circulam há bastante tempo e apresentam um aumento em sua população.”

Juliana explica que o comportamento de parte dos saguis mudou durante a pandemia. “Por causa da estiagem e por estar fora do período de reprodução, é possível encontrar um maior número de animais em circulação pela cidade. Com o fechamento do Parque Ibirapuera por conta da pandemia, é possível ver os animais nas margens dos lagos, fato que não ocorre com tanta frequência nos dias de funcionamento normal.”

A diretora ressalta que a população não deve alimentar os saguis. O ideal é manter distância e, caso o animal esteja ferido ou seja um filhote órfão, é recomendado entrar em contato com a Divisão de Fauna Silvestre (por e-mail faunasvma@prefeitura.sp.gov.br ou pelos telefones (11) 3885-6669 e (11) 3917-8873).

Moradores costumam fotografar e trocar informações sobre sagui que apareceu em rua da Vila Madalena Foto: Maria da Luz Lins/Arquivo pessoal
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