Especialistas consideram 'bizarro' plano de 'resgatar' ônibus preso no trânsito

Secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, quer que a CET funcionem como 'ambulância' e abra caminho para o transporte público em engarrafamentos

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Por Rafael Italiani
Atualização:

Atualizada às 11h42

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SÃO PAULO - Resgatar ônibus presos em congestionamentos em São Paulo. Essa é a nova ideia do secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto. Ele quer que as motos da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) funcionem como uma espécie de “ambulância”, a fim de abrir caminho entre os carros para os coletivos passarem. Especialistas em mobilidade chamaram o plano de “bizarro” e “loucura” e disseram que a proposta não existe em nenhum lugar do mundo.

Ainda não há data para que a medida entre em vigor, mas Tatto já deu nome ao programa: “Resgate ao Ônibus”. O projeto foi apresentado ontem na reunião do Conselho Municipal de Transporte e Trânsito (CMTT) da Prefeitura desta quinta-feira, 30. Há três meses, outra ideia de Tatto havia causado polêmica, mobilizando o gabinete do prefeito Fernando Haddad (PT), que fez o secretário voltar atrás: ele pretendia fechar as pistas expressas das Marginais durante a madrugada para evitar acidentes.

Ônibus presos no congestionamento na região central da cidade em rua da Santa Cecília sem faixa exclusiva para coletivos Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

Desta vez, ninguém o desmentiu. Tatto usou uma comparação para justificar a nova ideia. “Temos de fazer uma mobilidade igual à saúde, com o mesmo conceito. Se a ambulância vai socorrer alguém, ela tem prioridade. A mesma lógica tem de ser para o transporte público. Tem local que não tem necessidade de fazer faixas exclusivas. Então, a CET vai ter uma operação de resgate e pedir licença (para o carro)”, contou.

Tatto quer que o serviço seja feito por marronzinhos em motos com sirenes ligadas, da mesma forma que os batedores da Polícia Militar fazem para abrir caminho às autoridades. O serviço de resgate dos ônibus atuaria nas ruas e avenidas que não têm vias segregadas para coletivos, como a Avenida Juscelino Kubitschek, na zona sul, que tem cinco faixas de rolamento em cada sentido – atualmente, há 480,3 quilômetros de vias para ônibus.

Giroflex.Para o advogado Mauricio Januzzi, da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo, a ideia de Tatto é um “absurdo”. “E é bem possível que ele mande colocar um Giroflex em cima dos ônibus. É bizarro, para não dizer outra coisa”, afirmou. “Parece que não existe outro problema em São Paulo que não seja o trânsito.”

Para o consultor de Transportes Flamínio Fichmann, Tatto quer “produzir notícia”. “Essa ideia é uma loucura. É como se os motoristas estivessem no congestionamento para prejudicar os ônibus”, afirmou. “Se eu trabalhasse na CET, me negaria a fazer uma palhaçada dessa. O trabalho da companhia é de gestão de trânsito e é isso que reduz os congestionamentos”, disse o especialista.

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Já o engenheiro e mestre em Transportes pela Universidade de São Paulo (USP) Sérgio Ejzenberg disse que “tomou um susto” ao saber da nova ideia de Tatto. “É mais um factoide e espero que ninguém morra nessa brincadeira. Isso não existe em nenhum lugar do mundo e não se pode usar o sinal de emergência para o que não é emergência”, explicou.

Ele explicou que a ação não será feita nos 480,3 quilômetros de faixas exclusivas de ônibus da capital, mas nas ruas e avenidas que não tem vias segregadas ao transporte público. Tatto deu como exemplo a Avenida Juscelino Kubitschek, importante viário que liga o Itaim-Bibi e o Parque do Ibirapuera, na zona sul de São Paulo, tem cinco faixas de rolamento em cada sentido e nenhuma faixa priorizando o transporte público. 

Pedestres. Também está no escopo da CET o resgate de pedestres que insistem em caminhar nas Marginais do Pinheiros e do Tietê. Caso alguma pessoa seja flagrada tentando atravessar, viaturas da companhia vão até o local para retirá-la. “Se estamos falando que o pedestre é o setor mais frágil, do ponto de vista de operação tem que ir lá proteger”, afirmou Tatto. Outras medidas de proteção ao pedestre que já existem na cidade serão ampliadas até o final da gestão.

Na reunião do CMTT, o Tadeu Leite Duarte, diretor de Planejamento da companhia, disse que a partir do final deste ano o programa Área 40 que começou no centro da cidade será expandido para os bairros. As regiões de Pinheiros, na zona oeste, Santo Amaro, na zona sul e Bela Vista, na parte central de São Paulo, terão as velocidades máximas reduzidas para 40 km/h. 

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Hoje a cidade tem 217,7 quilômetros de vias com a medida em 14,9 km² de área. A CET afirma que o programa Área 40 reduziu em 19% o total de acidentes com vítimas em atropelamentos, em 14% o número de feridos e em 71% as mortes por causadas também por atropelamentos. As faixas de pedestre diagonais pintadas na cor azul serão implementadas em 19 cruzamentos do Brás, do Itaim-Bibi, de Higienópolis, dos Jardins, da Lapa, do Belém, de Itaquera e do Paraíso. 

Redução de velocidade. Ainda no conselho desta quinta-feira, a Prefeitura apresentou novos números na redução de acidentes, mortos e feridos em seis vias que passaram dos 60 km/h para 50 km/h antes da política ganhar força e ser pulverizada pela capital. Na comparação entre os seis meses anteriores e posteriores à alteração, o grupo de viários formado pelas avenidas Luís Dumont Villares, Zaki Narchi e Ibirapuera, e ruas Clélia Guaicurus e Doutor Zuquim, os acidentes e atropelamentos foram reduzidos em 22,1%.

A quantidade de feridos passou 131 para 98, queda de 25,2% e duas mortes foram registradas, uma a menos. Esses dados servem para a Prefeitura fazer projeções para o futuro. Nas contas da gestão Haddad, os futuros resultados da política e já imaginando um trânsito menos violento, serão liberados 60 leitos hospitalares por dia com uma menor quantidade de feridos e mortos. No cálculo da Prefeitura usando dados do Sistema Único de Saúde (SUS), a economia seria de R$ 6,2 milhões em despesas hospitalares. 

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