Prefeitura de SP planeja isenção e desconto de IPTU para imóveis tombados

Imposto zero será focado no centro; dono precisará comprovar anualmente conservação, ou seja, não valerá para os que precisam passar por obras de recuperação

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Por Priscila Mengue
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Há tres anos, Rosa Artigas chegou a lançar um abaixo assinado pedindo isenção para a casa projetada pelo pai, o arquiteto Vilanova Artigas Foto: André Lucas

SÃO PAULO - Discutidos nos governos de Gilberto Kassab (PSD) e Fernando Haddad (PT), a isenção de cobrança e o desconto de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de proprietários de bens tombados voltaram à pauta da Prefeitura de São Paulo na gestão Bruno Covas (PSDB) para este ano. Um projeto de lei a respeito está sendo elaborado.

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“É uma medida que entendemos justa. E uma forma de iniciar uma política pública que olhe não apenas para o tombamento, mas para a preservação e para o restauro, que em geral são relegados a segundo plano”, diz o secretário de Cultura, André Sturm. A isenção deve ficar restrita à área central, em um perímetro ainda em estudo, e deve abarcar cerca de 60% dos mais de 3 mil imóveis tombados na cidade de São Paulo, o que representaria 0,73% da arrecadação. 

Nas demais regiões, haverá um desconto. Para tanto, o dono precisará comprovar anualmente que o bem está em boas condições. Ou seja, não valerá para os que ainda precisam passar por obras de recuperação.

A medida deve valer apenas para os imóveis efetivamente tombados, e não contemplará os que estão sujeito a restrições, como os localizados em bairros preservados, como Jardins e Pacaembu. Em paralelo, o secretário diz que serão revistas as atuais dimensões de áreas envoltórias (que estão ao redor). “Não faz sentido que todas sejam iguais, com o raio de 300 metros.”

Segundo Sturm, a proposta será mais simples do que a chamada lei das fachadas (12.350/97), que isenta de IPTU proprietários que restauram a área externa de imóveis da área central. Ela permitiu, por exemplo, a recuperação do Edifício Alexandre Mackenzie, atual Shopping Light. “A lei foi pouco utilizada: alguns proprietários passaram a entender que o esforço de papelada não valia a pena.”

Em São Paulo, ficam isentos de IPTU centros culturais, agremiações esportivas e imóveis de aposentados com renda de até 5 salários mínimos, dentre outros. No caso de bens tombados, não há cobrança em outras capitais, como Rio, Belo Horizonte e Porto Alegre.

A medida é apoiada pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que mantém um termo de cooperação sobre o tema com a Secretaria de Cultura desde dezembro. “Em termos monetários é muito pequeno o que a Prefeitura perde de IPTU. Estando ativos, esses imóveis serão colocados comercialmente e vão atrair recolhimento de impostos”, garante Antonio Carlos Pela, coordenador do Conselho de Política Urbana da ACSP. 

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Influência do custo. A medida era cogitada quando Nadia Somekh foi presidente do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) e diretora do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), entre 2013 e 2016, mas não foi adiante – pois haveria um custo estimado de R$ 80 milhões. “É um reconhecimento mínimo do poder público. A conservação e a manutenção requerem muitos recursos de restauro e conservação”, diz Nadia.

Além de imóveis, a secretaria municipal pretende agora inventariar o patrimônio imaterial da cidade, o que hoje ocorre principalmente por sugestão de cidadãos e vereadores – como Mário de Andrade fez há exatamente 80 anos por todo o Brasil. “Está mais do que no momento de retomarmos esse olhar, valorizando a cultura imaterial paulistana”, comenta Sturm.

As mudanças abrangem, ainda, as novas diretrizes de trabalho do DPH, anunciadas neste mês, que incluem a determinação do prazo de quatro meses para a análise técnica de obras de restauro. Além disso, impõem mais exigências para o pedido de tombamento, que incluem, dentre outros dados, uma pesquisa bibliográfica assinada por especialista e relatório fotográfico histórico e do estado atual. 

"Tomba e, dali pra frente, seja o que Deus quiser"

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Em 2015, a historiadora Rosa Artigas aproveitou as celebrações do centenário de nascimento do pai, João Batista Vilanova Artigas, para lançar um abaixo-assinado que reivindicava a isenção do IPTU a todos os imóveis tombados da cidade, reunindo 1.673 assinaturas.

Rosa é proprietária da Casinha e da Casa Vilanova Artigas, dois dos projetos mais conhecidos do pai, localizados em um lote de esquina no Campo Belo, zona sul da capital paulista. Pelo espaço, diz pagar quase de R$ 39 mil de IPTU anualmente, valor que divide com a locatária de uma das residências, ambas tombadas pelo Estado desde 2014.

“O cálculo é que o imóvel tenha um valor de mercado, como se tivesse reservando terra para pôr um prédio de 40 anos, só que não posso construir ali, porque a casa é integralmente tombada”, aponta. “Tenho uma obrigação de manter a casa, e eu não tenho nenhum tipo de incentivo para fazer essa manutenção.”

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Embora tenha sido favorável ao tombamento, Rosa critica a demora na aprovação de intervenções e a falta de incentivos. “O processo se encerra no tombamento e, dali para frente, seja o que Deus quiser”, diz. “É uma total irresponsabilidade em relação ao bem, é um incentivo a uma indústria de ruínas.”

A isenção também é reivindicada em um abaixo-assinado de 2017, que reuniu 1.185 assinaturas e foi criado pela Associação dos Proprietários, Protetores e Usuários de Imóveis Tombados (APPIT). 

No casarão do Cama & Café, no centro, por sua vez, foram necessários 14 meses de obras para reverter as consequências de um incêndio, um desabamento e a falta de manutenção. O imóvel é do século 19 e foi tombado junto com o Pátio do Colégio, em 2015.

Hoje, cinco anos depois, o espaço funciona como um espaço cultural e gastronômico, pois o proprietário considera que a região não tem segurança para ser uma pousada, como foi inicialmente idealizado. Para o proprietário, Luiz Antônio Pereira Santos, a isenção de IPTU pode ajudar a mudar esse cenário, pelo qual diz pagar cerca de R$ 7 mil anualmente.

“Pode ajudar a resgatar parte da história de São Paulo desconhecida da maioria da população”, afirma. “Imagino que, a medida que as coisas venham a acontecer, a perspectiva de retorno é positiva.”

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