03 de janeiro de 2011 | 00h00
A Prefeitura perdeu na Justiça a posse de uma área verde de 31 mil m² em que seria instalado o Parque Alto da Boa Vista, na zona sul de São Paulo. A propriedade é objeto de uma longa disputa que envolve vendas múltiplas da mesma área e suspeitas de fraudes. O projeto do parque permanece emperrado e a área, abandonada. O local ainda pode virar um condomínio residencial.
A 1.ª Vara de Fazenda Pública, em primeira instância, julgou procedente ação movida por uma empresa, a Unidas Administração de Imóveis (antiga Tecelagens Unidas), que garante ser dona do terreno na Rua Visconde de Porto Seguro, localizado em meio a casas de alto padrão. A Prefeitura, que pretende recorrer, defende que a área é da municipalidade desde 1891. Seriam terras devolutas - terrenos que nunca pertenceram a ninguém. De acordo com a Procuradoria Geral do Município, a decisão não é definitiva e só mantém a posse à empresa.
Um dos sócios da Unidas afirmou ao Estado que não há o que se contestar. "Temos a matrícula da propriedade. É um processo de 20 anos de disputa. Vamos colocar a Prefeitura para fora", diz Manoel Ferreira Alves, que pretende construir um condomínio de casas no local.
A propriedade fora comprada pela empresa em 1980. Quatro anos depois, acabou negociada mais uma vez e depois revendida outras três. A Unidas, entretanto, conseguiu na Justiça a anulação de todas essas negociações. "Nunca vendemos nada e tivemos de cancelar operações de pessoas que apresentaram documentações falsas", disse Alves.
Confusão. A própria Prefeitura tem sido vítima das indefinições que cercam o local. O Município chegou a executar dívidas de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de uma das empresas que comprou a propriedade em 1984. Em 2001, deu cabo a uma ação de reintegração de posse e retirou do terreno funcionários de outra empresa.
Moradores. A Associação dos Amigos do Bairro do Alto da Boa Vista luta pela criação do parque há cerca de dez anos. "A área é da Prefeitura. Fizemos uma investigação nos cartórios e vimos como foi feita a documentação para esses proprietários não oficiais", afirma uma das dirigentes da associação, Jacy Cardia Ghirotti. "Precisamos procurar documentos que a Prefeitura deveria ter, mas não tem."
Além da área verde, também está em jogo a nascente do Córrego Poly (ex-Córrego Lavapés). Para Jacy, somente a existência da nascente nessas terras já é motivo para a preservação do local.
Moradores do bairro ainda reclamam do fato de o terreno estar há tantos anos sem uso. "Falam que vai sair o parque, mas até agora nada. Aqui não tem um lugar para caminhar ou levar as crianças", afirma a publicitária Sabrina Kruck, de 39 anos. O parque mais próximo, do Cordeiro, fica a cerca de 2 quilômetros.
Demora. O decreto de criação do parque foi publicado no dia 4 de dezembro de 2003, mas o projeto ficou parado. As obras só começaram a sair do papel cinco anos depois.
A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente começou a instalação de grades e reforma das calçadas em 2008, em torno do que seria o parque. Em setembro daquele ano, uma decisão judicial - no mesmo processo que definiu a posse à Unidas - embargou a obra e tudo foi paralisado. A Prefeitura informou que mantém os planos do parque, mas aguarda o desenrolar da decisão judicial.
CRONOLOGIA
6 de março de 1925
Área aumentada
Retificação na descrição do imóvel multiplica em quase dez vezes a área.
7 de maio de 1980
A compra
A Unidas Administração compra o imóvel.
2001
Reintegração
Prefeitura realiza reintegração de posse, fruto de um processo que já durava quatro anos.
4 de dezembro de 2003
Parque
Decreto da Prefeitura cria o Parque Alto da Boa Vista.
13 de setembro de 2008
Embargo
Após iniciar obras, Justiça embarga intervenções no parque.
14 de setembro 2010
Decisão
A 1.ª Vara de Fazenda Pública mantém posse da área com a Unidas.
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