30 de novembro de 2010 | 00h00
RIO - A elogiada ação das forças de segurança na retomada do Complexo do Alemão também deixou um rastro de destruição e revolta entre moradores atingidos pela operação. Não faltaram reclamações em relação às tropas. Sem mandados de busca para o conjunto de favelas, a polícia garantiu que só procuraria armas, drogas e criminosos em locais onde sua entrada fosse autorizada, mas parte da população denunciou invasão indiscriminada.
Outros moradores que deixaram as favelas, por causa dos tiroteios, contam que voltaram para casa e perceberam que haviam tido pertences roubados. Testemunhas ainda relatam que ladrões aproveitaram o arrombamento das portas feito pela polícia para invadir as casas.
Um comerciante conhecido como Edilson, de 46 anos, acusou os policiais de terem arrancado a porta de sua mercearia, no bairro da Fazendinha, e furtado mercadorias. "Beberam cerveja, refrigerante e levaram sacolas com biscoitos", disse. Segundo ele, os vizinhos impediram que o saque, ocorrido às 10h40, continuasse. "Meus amigos disseram que eu era trabalhador, mas (os policiais) falaram para irem embora, senão sobraria para eles."
Veja também:
Bandidos fugiram pelo esgoto e com uniformes do PAC
Traficante procurado é morto em confronto no Rio
ABIH: Queda na ocupação de hotéis é pequena
UPP no Alemão deve ser instalada em seis meses, diz Cabral
Empresas de ônibus estudam pedir indenização
Morador: 'Ainda não sabemos como isso vai ficar'
Veja fotos da onda de ataques no Rio
Vídeo - Bope troca tiros no Complexo da Penha
Presenciou algum ataque? Conte-nos como foi
CRONOLOGIA - A crise de violência carioca
Na Rua Joaquim de Queirós, um mercadinho foi atingido durante a manobra de um blindado. A porta entortou e abriu. De manhã, o comerciante contabilizava o estoque. "Passou a noite aberto, não sei se algo sumiu." Já a moradora Sonia, de 24 anos, saiu para trabalhar e deixou a chave com um vizinho. Os policiais entraram e teriam levado os pares de tênis dos filhos da dona de casa. "Viram que sou uma pessoa de bem. Para que saquear?", reclamava. A residência da balconista Cláudia, de 24 anos, na Rua Antonio Austregésilo, também foi arrombada. "Não mexeram em nada, mas vou ter de trocar a porta."
"Quando cheguei, a porta estava arrombada, e o computador e um ventilador haviam sumido", relatou ainda um pedreiro, morador da Favela da Grota, que não quis ser identificado. "A polícia deveria esperar o morador chegar antes de entrar."
Na Favela da Fazendinha, em Inhaúma, outro vendedor encontrou a porta de sua residência destruída. Na Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha, os saques acontecem desde a ocupação, no dia 25, afirmam testemunhas. E o morador Ronai Braga acusa a polícia de roubar R$ 31 mil que ele guardava em casa, fruto de uma rescisão trabalhista.
Um professor de 45 anos, que está fora do conjunto de favelas desde o dia 25, quando começaram os confrontos, não sabe o que vai encontrar quando voltar para casa. "A polícia entra e verifica a casa, mas a porta fica aberta e alguns moradores mal-intencionados saqueiam. Os vizinhos estão apavorados. Acho inconstitucional abrir a casa das pessoas sem mandado e absurdo que a polícia deixe a residência aberta", disse o homem, que mora no Complexo do Alemão.
OAB. A Ordem dos Advogados do Brasil no Rio (OAB-RJ) informou que acompanha as operações no Complexo do Alemão com o objetivo de evitar excessos. "De fato, essa é uma situação de crise, em que criminosos podem estar escondidos em residências, mas a lei tem de ser respeitada", afirmou o presidente da OAB-RJ, Wadih Damous.
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.