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Paulista vira camelódromo com artesãos

Após Lei de Artistas de Rua, de Haddad, cartão-postal foi tomado por ambulantes; n° de vendedores é 4 vezes maior do que permitido

Por Juliana Diógenes
Atualização:

SÃO PAULO - A aglomeração de ambulantes na Avenida Paulista transformou um dos principais cartões-postais da capital em centro de comércio popular. Tomadas por músicos e bandas nos fins de semana, as calçadas agora são disputadas em dias úteis por artesãos. Contagem feita pelo Estado mostra que a via tem quatro vezes mais vendedores do que permite a Prefeitura - são até 235 artesãos da Praça Osvaldo Cruz à do Ciclista, enquanto o limite é de 50.

A reportagem percorreu a via às 14 horas de sexta-feira. Desde o ano passado, com a Lei dos Artistas de Rua, de autoria da gestão Fernando Haddad (PT), os artesãos formam uma categoria regulamentada pela Superintendência do Trabalho Artesanal nas Comunidades (Sucato). O comércio é autorizado para ambulantes que produzem seus próprios artigos. Para quem não vende artesanato, a via não tem nenhum termo de permissão de uso (TPU) expedido - documento obrigatório para o comércio informal.

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A proliferação recente de artesãos na região, com barraquinhas e mostruários espalhados pelo chão, é sentida por quem já atua na Paulista há mais tempo. “São uns 300 hoje, não? A Paulista é onde a cidade acontece”, diz a artesã Tereza de Jesus Neves, de 65 anos, que vende pulseiras, colares e anéis feitos à mão na via faz um ano.

A percepção de Tereza é confirmada pela história de Roseli Oliveira, de 46 anos. Vendedora de bonecos de biscuit, ela pediu demissão da empresa onde ficou por 15 anos para trabalhar por conta própria. Roseli começou a vender na via há duas semanas. Todo dia, ela sai de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo. “Aqui o público é diferente. Conseguimos vender mais”, afirma.

Na Avenida Paulista há seis meses, a psicóloga Camila Almeida, de 40 anos, vende cartazes temáticos na esquina com a Rua Professor Otávio Mendes, ao lado do Museu de Arte de São Paulo (Masp). Seu principal público são os turistas. “A Paulista é o lugar onde as pessoas vêm passear. Todo lugar que você vai no mundo encontra uma grande avenida que vende artesanato local. Esse pessoal (artesãos ambulantes) não tem dinheiro para pagar aluguel”, diz.

Degradação. Para Lúcio Gomes Machado, arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade de São Paulo (USP), a Paulista está “degradada”. Ele diz que a concentração de artistas e vendedores exige mais “cuidado” com a via.

“O lazer da população tem de ser distribuído entre os parques. Não se pode concentrar tudo só na Avenida Paulista. Com tanta coisa acontecendo ali, estamos engarrafando e acabando com a avenida, assim como aconteceu com a Praça da República e a Praça da Sé”, afirma Machado.

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Em nota, a Prefeitura informa que agentes da Subprefeitura da Sé fiscalizam a via diariamente. Para evitar a degradação denunciada pelo urbanista, a gestão Haddad afirma também que vai pintar números de 1 a 50 nas guias, nos canteiros e nas calçadas para sinalizar os locais, em ambos os sentidos, onde o artesanato é permitido.

Na frente do Shopping Center 3, por exemplo, serão cinco profissionais. A intenção é evitar “engarrafamento” de pedestres. O lugar com a maior concentração de vendedores será diante do Casarão da Família Franco de Mello e do Parque Mário Covas: no máximo, oito. Com a numeração, a Prefeitura torna obrigatório o uso de tripés desmontáveis de 1,50 metro de largura por 0,70 m de comprimento. O limite de artesãos foi estabelecido pela Subprefeitura da Sé em janeiro, mas entra em vigor somente agora.

A proliferação recente de vendedores na região, com barraquinhas e mostruários espalhados pelo chão, é sentida por quem já atua na Paulista há mais tempo Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO

Calçada lotada. O analista de marketing Daniel Tazinaffo, de 28 anos, trabalha na região da Avenida Paulista e diz que às 18 horas a calçada “vira um inferno”. Para ele, falta um espaço regulamentado para a exposição dos produtos dos artesãos. “Eles geralmente ficam perto de metrô, onde tem a maior concentração de gente”, afirma.

Para Caio Lopes, de 35 anos, advogado em um escritório no cruzamento da Paulista com a Avenida Brigadeiro Luís Antônio, na maior parte do tempo os vendedores não interferem no seu trajeto. Lopes reconhece, no entanto, que “de vez em quando” é possível perceber o incômodo dos pedestres. “Tem horas que fica um pouco tumultuado, dependendo da localização do ambulante.”

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A auxiliar de biblioteca Dayane Teixeira, de 28 anos, também trabalha na área e concorda que, dependendo do trecho, os artesãos podem obstruir a passagem. Ela cobra organização da gestão municipal. “Tem de existir um planejamento. Não pode só pensar no saneamento, em fazer uma limpa.”

O professor universitário William Freitas, de 29 anos, mora atrás do Masp e caminha até o trabalho. Ele percorre o trajeto há menos de um ano e disse que, nos últimos meses, percebeu um “aumento exponencial” do número de vendedores nos dias semana.

“No cruzamento perto do Masp havia apenas um senhora vendendo quadros de vinil no início do ano. Hoje, você se depara com uns seis ambulantes vendendo diferentes produtos só naquele cruzamento”, disse Freitas.

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