
29 de novembro de 2010 | 00h00
Há dois anos, os frequentadores da Catedral Anglicana de São Paulo, no Alto da Boa Vista, zona sul da capital paulista, não ouvem o som centenário do órgão da igreja. Com o uso suspenso por causa de seu estado de deterioração, o instrumento construído na França por volta de 1870 voltará a soar graças ao restauro minucioso de suas peças. O processo terá início em janeiro, quando ele será desmontado, e deve durar um ano.
Por fora, ele parece bem conservado, mas a ação do tempo, a substituição de peças originais e as reformas improvisadas foram pouco a pouco avariando a parte elétrica, os tubos e a madeira. "Sabe quando o pneu está careca e vão colocando remendos? O órgão está assim. Quando assumi a igreja, decidi que ele não tocaria mais assim porque, se continuasse, danificaria de vez", explica o reverendo Aldo Quintão, responsável pela catedral.
O restauro foi aprovado pela Lei Rouanet e custará R$ 696 mil, valor que será financiado por empresas privadas. "Por enquanto temos um patrocinador, mas estamos buscando outros parceiros para conseguir o valor total", explica a produtora do projeto, Priscila Paes. Ela e a organista Elisa Freixo, curadora do projeto, ministram hoje palestra na catedral para explicar a estrutura do órgão e o processo de restauração. Também haverá uma exposição de fotos. "Já toquei nele há 15 anos. Naquela ocasião, o instrumento já apresentava defeitos", conta Elisa."Há graves problemas elétricos, falta de manutenção, muita sujeira e tubos bastante machucados, que realmente precisam de restauro."
O órgão já havia passado por algumas reformas, principalmente nas mudanças de endereço. A primeira em 1905, quando os anglicanos o compraram da Casa Grande Francesa em Itu, e a segunda quando foi transferido da antiga para a nova catedral, em 1969, após oito anos encaixotado. Elisa explica que nessas mudanças alguns materiais foram substituídos por outros de pior qualidade. "É como uma casa muitas vezes reformada: num determinado momento, não se sabe mais como era a planta original. Ele precisa ser bem analisado na desmontagem, é nessa hora que sua história será recuperada e confirmada."
A equipe vai fotografar e inventariar cada peça na desmontagem. Os tubos maiores passarão pelo restauro na própria igreja e o restante segue para a Sonoridade Organi, em Blumenau, onde será restaurado pelo mestre organeiro alemão Georg Jann. "O órgão é o instrumento mais complexo que existe. Para restaurá-lo, é preciso ser mestre organeiro, e no Brasil isso é raro. Há muitos instrumentos precisando de bom tratamento", explica Elisa.
Será necessário restaurar as madeiras, o sistema de produção de ar, os tubos e o console - mesa de comando do organista. "A intenção é fazer com que fique o mais próximo possível de quando foi instalado nessa igreja, colocando materiais de qualidade melhor do que há hoje."
Planos. Após o restauro, a reinauguração do instrumento será marcada por um concerto com a organista uruguaia Cristina Banegas. A partir daí, o som centenário voltará a ser ouvido em casamentos, missas e concertos abertos à população. "O som de um órgão é uma coisa maravilhosa, algo que eleva. Queremos voltar a oferecer isso para a população", diz o reverendo. "Há poucas igrejas abertas ao público com um órgão como este. O principal é não deixar que essa história e tradição se percam."
MAIS INSTRUMENTOS
Convento do Carmo
Fabricado pela alemã Walcker, o órgão foi instalado em 1934 e tem três teclados manuais
Catedral da Sé
Construído pela empresa italiana Balbiani-Bossi e instalado em 1954, tem cinco teclados manuais e cerca de 10 mil tubos
Mosteiro de São Bento
Aos domingos, às 10h, há missa ao som do canto gregoriano e do órgão da alemã Walcker inaugurado em 1954 com quatro teclados manuais
Teatro Municipal
Construído pela fábrica italiana Tamburini entre 1968 e 1969, tem cinco teclados manuais
Serviço
CATEDRAL ANGLICANA. PALESTRA HOJE, 20h30. R. COM. ELIAS ZARZUR, 1239. (11) 5686-2180
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