O sucesso das gêmeas negras albinas

Enquanto começam a traçar carreira na moda, Lara e Mara lidam com rotina e preconceito

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Por Juliana Diógenes
Atualização:
Nascidas em São Paulo e filhas de pais imigrantes, vindos de Guiné-Bissau, Lara, Mara e Sheila foram oficialmente apresentadas ao mundo há um ano, quando participaram de um vídeo comercial a convite de um “olheiro”. Foto: Gabriela Biló/Estadão

SÃO PAULO - As gêmeas Lara e Mara, de quase 12 anos, chamam a atenção por onde passam. Negras e albinas, elas começam a transitar pelo mundo da moda enquanto tentam lidar com problemas do cotidiano comuns a muitas criança, como o preconceito e o bullying. 

O caso delas é ainda mais delicado. Nas ruas, são observadas com “incômodo” por alguns, segundo relata a mãe Felisberta Gomes, de 33 anos. Na escola, ouvem comentários por usarem óculos e terem longos cabelos claros trançados. “Às vezes, elas chegam bem chateadas em casa”, diz Felisberta. A irmã mais velha, Sheila, de 13 anos, é negra e também tem posado para fotos com as irmãs. As três sonham em ser modelos e atrizes. 

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Filhas de pais imigrantes – vindos de Guiné-Bissau, na África –, Lara, Mara e Sheila nasceram em São Paulo e foram oficialmente apresentadas ao mundo da moda há um ano, quando participaram de um vídeo comercial a convite de um olheiro. A mãe, que é especialista em fazer tranças em um salão de beleza, conta que foi abordada durante o trabalho por um homem. “Ele disse que sempre me via passando com as meninas, que elas eram muito bonitas e as convidou para fazer um vídeo. Pensei: como assim?”

Desde então, as meninas já foram clicadas para campanhas de várias marcas famosas, como Nike, Bazaar Kids e Insanis. E a fama já chegou a outros continentes. As crianças foram procuradas por diversas agências de publicidade internacionais e fecharam um contrato na Alemanha. Até sobrenome artístico adotaram: Bawar. Em manjaco, uma das línguas faladas em Guiné-Bissau, a palavra significa “moça bonita”. 

A atenção da mídia para as gêmeas tem sido tanta que as meninas estão com a agenda apertada. E o controle em torno delas é rígido. Para a entrevista com o Estado, foram dez dias de conversação. É entre uma viagem e a ida para a escola que elas atendem a imprensa e fotografam para revistas e programas televisivos. 

Tímida e discreta, Felisberta é o contraste entre as filhas e até se assusta com a simpatia do trio. No metrô, conta, as meninas abordam passageiros, puxam papo, perguntam se está tudo bem e, em seguida, apresentam os novos “amigos” para a mãe. Em casa, cantam Emicida, dançam Beyoncé e criam peças teatrais. “É delas. Nasceram assim”, relata a mãe.

Lara, Mara e Sheila sonham em cinco anos estarem na carreira de modelo. Mara quer ter conhecido vários países e Lara deseja estar “no auge da fama”, atuando em novelas. 

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Albinismo e bullying. De três em três meses, Felisberta gasta dois dias inteiros para fazer tranças nas filhas gêmeas. Por causa do cabelo, afirma a mãe, as meninas ouvem ofensas, principalmente na escola. A tradição das tranças é de família: a avó ensinou para a mãe, que passou para Felisberta. Também veio da família o albinismo de Lara e Mara: o tio de Felisberta também nasceu com o mesmo distúrbio. Segundo a Sociedade Brasileira de Dermatologia, estima-se que haja 10 mil albinos no País: 1 a cada 18 mil nascimentos. Na África, continente de origem das gêmeas, a probabilidade é maior: 1 a cada 8,5 mil bebês. 

Para superar o preconceito e também passar uma mensagem positiva de empoderamento a outras crianças, Sheila tem estudado sobre bullying para dar palestras a outras meninas e meninos ao redor do mundo. Uma conversa com uma escola americana já está marcada. “Muitas pessoas que sofrem bullying acabam fazendo o mesmo com outras. Isso precisa mudar.”

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