O bloco dos 'forasteiros' ganha as ruas de São Paulo

Boom de grupos tornou capital ‘importadora’ – e não mais só exportadora – de foliões, sobretudo do interior paulista

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Por Edison Veiga
3 min de leitura

SÃO PAULO - A farmacêutica Lisandra Ravanelli Pessa, de 31 anos, é o tipo de amiga que merece confete, serpentina, gratidão e até, convenhamos, cervejinhas. Ela, que mora com o noivo em um sobrado na Vila Mariana, zona sul de São Paulo, “se mudou” na noite de sexta para o quartinho da empregada só para liberar o seu quarto e o de hóspedes para a trupe de foliões que vai hospedar. De “exportador” de foliões, São Paulo virou “importador”. Enquanto isso, Salvador, tradicional reduto de foliões paulistanos no carnaval, enfrenta desistências e crise nos abadás e “nas cordas”.

Amigos se reuniram só para a folia na casa da Lisandra Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Os amigos de adolescência de Lisandra são três casais de Ribeirão Preto. Eles vieram para a capital paulista com um intenso e purpurinado objetivo: curtir ao máximo a folia das ruas. “Tivemos a ideia em novembro”, conta um dos hóspedes, o consultor de vendas Lucas Romero, de 31 anos. “Quando virou o ano, começamos a planejar tudo direitinho. Criamos no WhatsApp o grupo ‘Carnaval SP’ e passamos a definir quem ia comprar o quê, das fantasias à bebida.”

Na semana passada, é verdade, o aplicativo não parava de pular – ou sambar. Todo mundo com um comentário, uma expectativa, uma fantasia de carnaval. “Estamos muito animados, principalmente depois que vimos, pela mídia, como foi o pré-carnaval da semana passada”, disse Lucas à reportagem na tarde de quinta. 

Lisandra montou toda a operação. Providenciou colchão inflável para um dos casais, deixou outras duas camas à disposição. Foi à Rua 25 de Março e comprou diversos adereços. “Chapéus, máscaras, gravatas coloridas...”, enumera. E, claro, se encarregou de dar aquela pesquisada nos principais blocos para sugerir o roteiro.

De Taubaté, também no interior do Estado, a auxiliar administrativa Patricia Ketalin Nogueira Barbeta, de 28 anos, veio para São Paulo já no fim de semana anterior ao carnaval, com quatro amigos. “Fomos ao bloco Casa Comigo, depois à Praça Roosevelt, no dia seguinte curtimos o Gambiarra e, por último o Acadêmicos do Baixo Augusta”, recorda-se. 

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“Não sei como aguentei a maratona. Tenho um joelho destruído, não tenho preparo físico para tudo isso, não”, comenta a auxiliar administrativa. “Mas consegui à base de muita água – e um pouco de álcool.” 

Ela pretende repetir a dose com uma saideira no próximo fim de semana, o penúltimo dos blocos de São Paulo. “Vai ser o pós-carnaval e com certeza estarei nas ruas da cidade”, planeja.

Saem gringos e o interior pede passagem

Muito procurados pelos jovens que só querem a folia, hostels paulistanos estão de casa cheia. De acordo com levantamento do Estado, entretanto, as acomodações registram uma diferença de perfil no período – saem os gringos, chegam os brasileiros de outras cidades. Se ao longo do ano 90% do público é formado por estrangeiros, na semana do carnaval a tendência se inverte e 90% são nacionais. A plataforma Airbnb, que intermedeia locações de imóveis, também registrou aumento para o feriado de carnaval em São Paulo. Dados divulgados pela empresa na semana passada mostravam um aumento de 187% no número de hóspedes na capital paulista no período – comparado ao ano passado. 

'É o que já foi o carnaval da Bahia'

Prova mesmo de que a folia paulistana tem conquistado cada vez mais forasteiros é que até gente de Salvador tem trocado os tradicionais trios elétricos soteropolitanos pela alegria desta terra. “O carnaval em São Paulo é o que já foi o carnaval da Bahia. O gostoso do carnaval em si, para mim, é essa coisa mais intimista, de ir para um bloco e encontrar amigos. Na Bahia, você vai a um bloco e é tão grande que você é um anônimo. E tem aquele apartheid – camarote, abadá pago”, conta o empresário Pedro Valente, de 38 anos, que já curtiu três blocos no pré-carnaval.

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