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Nayara relata os momentos em que foi mantida refém com Eloá

'Ele (Lindemberg) pode ficar 30 anos na cadeia, o dia que eu souber que ele vai sair, vou morrer de medo'

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Por Redação
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Nayara Rodrigues da Silva, de 15 anos, falou neste domingo, 2, sobre os momentos em que foi mantida refém por Lindemberg Alves, de 22 anos, junto com a amiga, Eloá Cristina Pimentel, também de 15 anos. Nayara sobreviveu após levar um tiro no rosto. Eloá teve morte cerebral após ser atingida por um tiro na cabeça e outro na virilha. Em entrevista ao Fantástico, da Rede Globo, a adolescente contou detalhes do seqüestro. Durante a entrevista, a menina afirmou que Lindemberg afirmou que mataria Eloá e depois iria se matar. Veja também: Perguntas e respostas sobre o caso Eloá  Especial: 100 horas de tragédia no ABC   Mãe de Eloá diz que perdoa Lindemberg  Imagens da negociação com Lindemberg I  Imagens da negociação com Lindemberg II  Especialistas falam sobre o seqüestro no ABC Galeria de fotos com imagens do seqüestro  Todas as notícias sobre o caso Eloá    Leia a íntegra da entrevista: Nayara - A gente tinha acabado de chegar da escola. A Eloá estava na cozinha, arrumando comida. Eu estava arrumando o beliche e os meninos, no computador. A gente ia fazer um trabalho. A porta estava aberta, destrancada. Primeiro, ele (Lindemberg) deu um tapa no Iago. Deu um tapa no Vitor também e mandou todo mundo sentar na cama. A Eloá começou a gritar: "vai embora, vai embora". Ele começou a bater nela, dar tapa no rosto. Ele começou a falar que não era para a gente estar lá. Que ele estava ali para pegar só a Eloá, iria se resolver com ela, mas que a gente estava no lugar errado, na hora errada. Ele ficava falando que estava esperando uma ligação e aí sim o terror ia começar. Globo - Neste momento, ele já dizia que mataria a Eloá? Nayara - Ele falava que tinha entrado ali para matar a Eloá e se matar. Eloá chegou a propor reatar o namoro com Lindemberg. Nayara - "Agora você quer voltar comigo por medo e eu não quero isso". Ele falava: "Não quero mais ficar com você. Vim aqui para te matar e vou te matar". Ele falou que iria matar um na frente dela, para ela sofrer, depois iria matá-la e depois se matar. Globo - Como vocês reagiram? Nayara - Eu sabia que era eu (que ele mataria também) o tempo todo. Globo - Ele tinha ciúmes da amizade de vocês? Nayara - Mais ou menos. Ele falava que eu tinha feito ela se afastar dele, feito a cabeça dela. Sobre a libertação de Iago e Vitor Nayara - Eles tremiam, estavam brancos, chorando muito. Daí ele (Lindemberg) falou para mim: "mas daí você sabe que, se eu soltar eles, você e a Eloá não vão sair daqui". Sobre o primeiro dia de seqüestro Primeiro, eu estava no quarto do casal. Deitei na cama, ele amarrou os meus braços e acho que a minha perna também. Fiquei sozinha no quarto e ele na sala com Eloá e amarrou ela também. No meio da noite, ele fez a gente trocar: eu ir para a sala para eles dois irem para o quarto. Foi quando ele bateu nela, na madrugada de segunda para terça. Eu estava no colchão amarrada e não conseguia ver. Eu ouvia ela gritando, pedindo para ele parar e ele batendo mais. Globo - Ela ficou machucada? Nayara - Ficou, toda roxa. Globo - Ele tentava alguma coisa com ela? Nayara - Ele pedia beijo para ela. Fazia ela beijar ele. Às vezes, ela não queria, ele começava a ficar nervoso, mas eu falava: "vai Eloá, faz um esforço". Globo - Mas ele batia nela para ganhar um beijo? Nayara - Ele apontava a arma. Quando não apontava para ela, apontava para mim. Alterações de humor Nayara - Uma hora a gente estava conversando numa boa. Às vezes, até rolava um papo mais descontraído. Outra hora ele já estava estressado. Globo - Ele usou alguma droga? Nayara - Não. Globo - Ele dormia? Nayara - Não dormiu. Ele falava que cochilava e acordava assustado. Ele fazia de tudo para não dormir. Globo - Na terça-feira, a luz do apartamento foi cortada, ele ficou mais nervoso? Nayara - Ficou. "Eles estão achando que com isso vão me vencer, pelo cansaço por falta de água, de luz", ele falou. "Desse jeito eles não vão me vencer". Globo - Mas você acabou sendo libertada quando a luz foi religada. Nayara - Ele deixou bem claro para mim que não era por causa da luz. Segundo ele, é porque ele tinha prometido para o meu pai e para minha avó que iria me soltar. (A menina havia contado a Lindemberg que não encontrava o pai havia um ano.) Nayara - Ele ligou e conversou com o meu pai e falou que ia dar uma segunda chance para ele. Que ele (Lindemberg) ia me libertar e ele ia ter a chance de ser um pai de verdade. Globo - Por que você acha que ele fez isso? Nayara - Porque ele também não tem o pai presente desde pequeno. Sobre a volta ao apartamento, quando foi feita refém de novo. Nayara - Minha avó me acordou na quinta-feira falando que tinha um policial lá para me buscar. Ele queria que eu fosse ajudar na negociação. Eu falei: "tudo bem, eu vou". Globo - A polícia disse "você vai se quiser" ou "tem que ir"? Nayara - "Você tem que ir". Globo - Você queria ir? Nayara - Não falei não em momento nenhum. Não sei se eu queria ir, mas não discuti. Globo - Sua mãe acompanhou você até o posto de comando onde estava acontecendo a negociação? Nayara - É. Eu entrei numa sala onde estavam os policiais e minha mãe ficou do lado de fora. Globo - Por que sua mãe ficou do lado de fora? Nayara - Não sei. Ele (Lindemberg) falou para eu o Douglas (irmão de Eloá) irmos. O Douglas ia ficar no andar de baixo e eu ia subir e ficar no corredor. Quando ele me visse no corredor, ele iria me dar a mão e puxaria a Eloá e sairiam os três. Globo - O negociador pediu autorização da sua mãe para você participar disso? Nayara - Não. Globo - Em algum momento o policial disse para você tomar cuidado para não voltar ao cativeiro, isso poder ser arriscado? Nayara - Não. Globo - Você gostaria que ele tivesse perguntado? Nayara - Pelo menos aconselhado, dado algumas dicas. Globo - Em algum momento, a polícia levou em conta que talvez ele não cumprisse o prometido? Nayara - Acho que eles deveriam ter cogitado essa hipótese, porque ele falou muita coisa e não cumpriu. Globo - Em que momento você percebeu que o Lindemberg não ia cumprir o acordo? Nayara - Quando eu cheguei ao corredor e ele começou a falar: "não estou te vendo, vem mais perto". E eu cada vez mais me aproximando e ele sempre falando: "vem mais perto". Globo - Na hora que ele abriu a porta você viu a Eloá? Nayara - Vi. Ele estava com a arma apontada para ela. Globo - E disse o quê? Nayara - "Dá a mão para ela e entra". Globo - E os policiais viram esse momento? Nayara - Provavelmente, porque tinha um policial no apartamento ao lado, que quando eu cheguei perto ele abriu uma fresta da porta. Sobre a crise nervosa de Eloá. Nayara - Ela começou a gritar e pedir para ele matar ela. Ele apontou a arma para mim e, como ela não parava de gritar, deu dois tapas no meu rosto. Mas foi tapa leve, mais para assustar ela do que para me machucar. Foi quando ela começou a se acalmar. Sobre a ameaça de morte à Barbie, apelido de Nayara Nayara - Ele falava: "a Barbie é uma boneca, não tem vida, não tem sentimentos, eu vou matar ela". Sobre o último dia de seqüestro Nayara - Acho que o dia mais calmo foi a sexta-feira, porque ele estava garantindo que iria sair todo mundo. Sobre a libertação Nayara - Eu não vou sair, vão sair só vocês duas, dizia Lindemberg. Ele já começou: "vai Eloá, quem tirou você de mim? Foi a Barbie, foi a professora (mãe de Nayara)?" Globo - Por que sua mãe? Nayara - Porque minha mãe dava conselho para ela (Eloá) e ele queria arrumar uma pessoa para jogar a culpa (pelo fim do relacionamento). Sobre a ligação do negociador Nayara - "(Negociador) Pô, você está demorando. Você falou que ia descer e a gente está aqui esperando". Comecei a ficar nervosa, me deu calor, tirei a blusa de novo e deitei no colchão. E a Eloá continuou no sofá. Assim que ele desligou (negociador), ele (Lindemberg) começou a mexer na mesa. Tirou as cadeiras e encostou a mesa na porta. Nem deu tempo de ele arrumar as cadeiras, foi onde a bomba estourou. Globo - Você viu a explosão da porta? Nayara - Vi. Eu vi a porta cair e uma fumaça. Os policias começaram a chutar a porta. A Eloá gritou, eu me cobri e virei de lado. Aí eu ouvi o tiro. Ele (tiro) perfurou a minha mão e depois entrou no meu rosto. Senti meu rosto estranho, um buraco. Tirei o edredom e sai sozinha. No corredor tinha alguém preparado para me atender. Globo - Você achou que iria morrer? Nayara - Falava o tempo todo: "eu vou morrer". Globo - Você viu a Eloá? Nayara - Antes de sair, eu a vi desacordada no sofá. Mas não vi sangue. Globo - Ele (Lindemberg) deu algum tiro antes da porta ser estourada? Nayara - Não. Globo - Antes da explosão, ele atirou? Nayara - Não, não atirou. Globo - Os policiais disseram que talvez você pudesse estar transtornada e não percebeu que ele deu esse tiro. Existe alguma chance de isso ter acontecido? Nayara - Não, porque eu estava de olho aberto e vi o momento em que a porta estourou. Globo - E ele não tinha dado nenhum tiro? Nayara - Não. Globo - Você tem certeza disso? Nayara - Certeza. Globo - Que sentimento você tem hoje pelo Lindemberg? Nayara - Medo. Não tenho raiva. Só não o perdôo pelo que ele fez com a Eloá, não por ele ter atirado em mim. Mas por ele ter tirado a vida de uma pessoa maravilhosa. Eu tenho muito medo. Ele pode ficar 30 anos na cadeia, o dia que eu souber que ele vai sair, pode ter certeza que vou estar morrendo de medo. Globo - O que você pretende fazer daqui para frente? Nayara - Quero tentar retomar a minha rotina o mais próximo do que era antes. Globo - E a escola? Nayara - Nem pensar. Amo todo os meus amigos de lá, mas é que sem ela (Eloá) na escola não vai dar. Globo - Você não vai perder o ano? Nayara - Não, falaram que eu já estava aprovada pelo histórico. Globo - Quando você lembra da Eloá o que passa pela sua cabeça? Nayara - Às vezes, eu me sinto conformada com o que aconteceu com ela, mas, às vezes, parece que não entra na minha cabeça. Não tem um motivo. Globo - Você não consegue aceitar? Nayara - Não. Globo - Você tem sonhado com ela? Nayara - Sonhei duas vezes já. Da última vez eu lembro da roupa dela. Ela parou na minha frente e falou: "Barbie, não se preocupa. Eu estou bem, num lugar ótimo, com pessoas maravilhosas. Eu te amo muito". Aí, ela sumiu.

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