PUBLICIDADE

Mortes de pedestres caem e de motoqueiros sobem na pandemia em São Paulo

Tráfego na capital paulista teve aumento de 2,2% no total de acidentes fatais, de acordo com dados da CET

Foto do author João Ker
Por João Ker
Atualização:

O total de acidentes envolvendo pedestres em São Paulo atingiu no ano passado o seu menor índice desde 2012, de acordo com dados divulgados nesta quarta-feira, 26, pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Ao mesmo tempo, motociclistas formam o grupo de maior envolvimento em todas as ocorrências, responsáveis por 38,7% dos casos. Especialistas ouvidos pelo Estadão apontam que essa tendência é um efeito colateral da pandemia e do isolamento social, que tirou as pessoas de circulação pelas ruas e aumentou o fluxo de motos no trânsito. 

“Isso reflete bem o comportamento da sociedade. O que aconteceu com a atividade urbana na metrópole foi que o deslocamento de pedestres diminuiu, principalmente nos horários mais centrais e, com os motociclistas, aconteceu o óbvio”, observa Sergio Ejzenberg, engenheiro e mestre em Transportes pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. 

Motociclistas protestam contra aumento de combustível na Marginal Pinheiros Foto: Valéria Gonçalvez

PUBLICIDADE

De acordo com os dados da CET, foram 809 mortes no trânsito da capital paulista ao longo de 2020, um aumento de 2,2% em relação ao ano anterior. Destas vítimas, 345 eram motociclistas, a maior parcela (38,7%) de todas as modalidades e a que mais cresceu comparativamente, com aumento de 16%.A categoria também foi a maior responsável pelos atropelamentos, envolvida em 21% das ocorrências fatais. 

O horário letal para os motociclistas foram as noites e madrugadas dos fins de semanas, quando ocorreram mais de metade das mortes. As vítimas eram na sua maioria homens, entre os 20 e 30 anos, cujas ocupações principais se alternavam entre entregadores ou estudantes. No boletim, a CET aponta como fatores de risco a pouca experiência sobre duas rodas, “imperícia ou imprudência” , “perda de controle” e “excesso de velocidade”. 

Consultor em segurança do trânsito, Horácio Augusto Ferreira acredita que motociclistas praticam uma espécie de “boliche humano” com quem anda a pé pela capital e defende que a diminuição de 12% nas mortes de pedestres no ano passado é fruto do isolamento social, suspensão de aulas e trabalho presenciais e implementação do home office. “Some a isso os desempregados e quem migrou para o transporte individual, com medo do vírus, então a circulação diminuiu drasticamente”, explica.

Ele afirma que a morte de motociclistas no trânsito é um problema que começou há 20 anos e que dificilmente vai melhorar se não houver uma mudança na fiscalização. “As motos são o grupo de condutores que mais comete infrações, percentualmente. Se não tiver equipamento e fiscalização randômica para motocicletas, não conseguimos mudar o cenário”, observa.

Ejzenberg reconhece que os motofretistas trabalham sob a pressão de muitas entregas em pouco tempo e, como os principais radares não são equipados para registrar as infrações entre as fileiras de carros, a velocidade acaba sendo muitas vezes letal. “Os laços detectores pegam os veículos tradicionais, mas entre as faixas não há laço detector. A moto passa em excesso de velocidade e nada acontece.” . 

Publicidade

A saída, apontam, seria um aumento randômico de fiscalizações presenciais pela capital, alinhado a um trabalho de conscientização dos motociclistas. Na legislação, o veto do presidente Jair Bolsonaro sobre o artigo 56-A do novo Código de Trânsito, que permitia a circulação de motocicletas entre veículos apenas "quando o fluxo estiver parado ou lento", é vista como uma “oportunidade perdida”.

Eles também criticam os programas anunciados pela administração municipal, como o Motorista Seguro, implementado em 2018 e que de acordo com a CET impactou 7.500 motociclistas desde sua criação, com ações educativas e orientações de segurança. “A Prefeitura está brincando de fiscalizar, fingindo que atua. Se não sentarem com a Polícia Militar e focarem 90% das ações em motos, os motociclistas infelizmente vão continuar se matando e, muitas vezes, ficando inválidos.” 

Os especialistas acreditam que a tendência é de piora para esse cenário, à medida que a pandemia passar e a vida voltar ao normal, ou a algo mais próximo do que conhecíamos como isso. “A gente vai ter mais morte de motociclistas com a melhora da vacinação e aumento de circulação das pessoas, porque eles vão continuar se colocando em risco.” 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.