
15 de outubro de 2010 | 00h00
Na quinta-feira, a vendedora Jandira de Jesus Oliveira, de 40 anos, recebeu um telefonema do colégio de sua filha, de 7. "Disseram que se ela não voltasse à escola, iria perder o ano", conta a mãe. Era o 44.º dia seguido de falta da menina e mais um capítulo do drama que elas vivem há dois meses. A casa da família Oliveira foi cercada com muros de 3 metros de altura pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) durante uma obra para impedir o acesso de pedestres aos trilhos. Desde então, a família está presa em casa.
No terreno, 18 pessoas vivem em cinco casas de alvenaria. O local fica ao lado da Estação Quitaúna, da Linha 8-Diamante, em Osasco. A família está lá há 36 anos. "Minha mãe foi a primeira a vir", diz Jandira. As casas têm luz regularizada, telefone e internet. O Ministério Público Estadual move ação para garantir o direito dessas pessoas de sair de casa. Seis dos moradores são crianças.
O endereço oficial é Praça Antonio Raposo Tavares, 30. Mas a casa fica, na verdade, entre a linha do trem e o Rio Tietê - e a saída para a cidade sempre foi cruzando os trilhos. Lá, quem quer sair de casa tem duas opções. Ou escala o muro e foge dos guardas da companhia, que têm ordens de impedir o acesso de qualquer um aos trilhos, ou percorre 1 km entre mato e esgoto até um túnel que dá acesso à Avenida dos Autonomistas, invadindo o terreno do vizinho. "Tem rato, esgoto, é um horror", diz Jandira.
O programa para impedir o acesso aos trilhos da CPTM começou no ano passado. Em alguns locais, como ao lado da Estação Itapevi, a empresa construiu passarelas. Na casa dos Oliveira, só fez o muro. Outra moradora, Edileusa Freire de Freitas, de 31 anos, tem dois filhos, de 11 e 9 anos. Os garotos se arriscam no muro, apesar do medo da mãe. Por isso, perderam menos aulas.
A CPTM disse, em nota, que "trabalha em conjunto com a família para encontrar uma solução para o caso" e que "está ajudando a viabilizar a abertura de uma passagem pelo quartel do Exército existente no local, sem colocar em risco a segurança ferroviária". O quartel é vizinho do terreno e também fica atrás da estação. Lá há uma passagem de nível para pedestres.
A nota da CPTM, que não dá prazos para encontrar uma solução nem explica por que não foi feita passarela para a família, diz ainda que "a obrigação da companhia é sempre garantir a vedação completa de sua faixa ferroviária, evitando o acesso indevido aos trilhos e possíveis acidentes".
O Ministério Público Estadual obteve em agosto uma decisão liminar que obrigava a construção de uma saída para os moradores. Mas um recurso da CPTM derrubou a liminar e, agora, uma audiência deve decidir o impasse - apesar de o MP ter pedido que a decisão fosse reconsiderada pelo Tribunal de Justiça.
"É menos perigoso eles continuarem cruzando os trilhos do que manter essa situação", afirmou o promotor Fábio Garcêz. "A família usava essa passagem há muito tempo e até hoje não houve acidentes. O caminho alternativo ficou inviável."
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