O Ministério Público de São Paulo vai entrar com uma ação civil pública na Justiça questionando a transformação de um bairro em condomínio fechado, na zona sul de São Paulo. Segundo a Promotoria, uma associação do bairro Riviera Paulista, à beira da Represa do Guarapiranga, cobra uma taxa irregular para oferecer serviços privados, como segurança e limpeza.Com a ação, o Ministério Público se posiciona sobre uma questão que se arrasta há anos em várias regiões do Estado e até hoje está mergulhada em um impasse. "Na capital, é o principal caso. O tema tem amplitude nacional porque trata da apropriação ilegal do espaço público. Delegar a gestão de uma parte da cidade a uma associação é inconstitucional", defende José Carlos de Freitas, promotor de Habitação e Urbanismo. Na Grande São Paulo, há cerca de 1.200 loteamentos com características parecidas: um grupo de moradores decide adotar medidas que vão de segurança a organização do trânsito - e muitas vezes cancelas são instaladas. Para pagar os gastos, é estipulada a cobrança de uma taxa de condomínio. O problema é que nem todos concordam com as medidas e muito menos com a cobrança. Por lei, na capital, é possível fechar um residencial se houver 70% de aprovação dos moradores e se não atrapalhar a circulação no bairro. Quem defende a cobrança argumenta que todos são beneficiados com as melhorias. Em alguns casos, como no Riviera Paulista, a discussão acaba na Justiça. Já houve quem tivesse parte de seu imóvel penhorado e leiloado (leia texto abaixo).Riviera. A situação no Riviera se arrasta há cerca de dez anos. Uma associação chegou a colocar uma cancela em uma rua, retirada a pedido do MP. Cones e segurança ostensiva que, dizem os moradores, dificultam a circulação das pessoas de fora, ainda estão presentes. Segundo o promotor Freitas, moradores de cinco bairros vizinhos são atingidos pela ação no Riviera - algo em torno de mil famílias. Inicialmente, a cobrança foi enviada a cerca de 200 imóveis. Hoje, 130 pagam a taxa, de R$ 415 mensais. Segundo Marcello Nitz, da Sociedade Amigos de Riviera Paulista (Sarp), organização que criou as regras, ninguém é obrigado a pagar a mensalidade. Apesar disso, cobranças de inadimplentes continuam na Justiça. "Não concordamos com a posição do promotor, porque já havíamos caminhado para um acordo, desistindo da cobrança de quem não quer participar", diz ele. "Sabemos que ninguém é obrigado a se associar indevidamente a nada, mas se há benefícios acredito que seria indevido usufruir essas vantagens e não pagar por aquilo."O impasse fez surgir uma segunda organização, contrária às cobranças. A Associação Riviera Cidadã (ARC) tenta manter as ruas abertas à circulação e sem serviços particulares. "O maior crime que existe em São Paulo é esse tipo de condomínio, porque vai contra a vontade das pessoas e impõe o pagamento de algo em dobro, porque já pagamos nossos impostos ", afirma o presidente da ARC, José Fernandes da Costa Filho.Indenização. A ação será proposta até amanhã. Ela atende deliberação do Conselho Superior do MP, que exigiu intervenção em todos os processos de cobrança em condomínios. Segundo o Ministério Público, nada justifica o fato de a Sarp tratar a região como condomínio. Além de garantir acesso livre, a Promotoria ainda exige o pagamento de indenização aos moradores lesados com as cobranças.PARA LEMBRAR Morador teve casa penhorada na Grande SPUm caso simbólico de impasse em relação a loteamentos fechados é o do aposentado italiano Leopoldo Piacci, que teve um dos cinco lotes onde sua casa está construída penhorado e leiloado por R$ 75 mil. Ele mora no Brasil desde 1995, vendeu um imóvel na Itália e decidiu aproveitar a aposentadoria no San Diego Park, em Cotia. Quando comprou os lotes, a região não era cercada. Uma associação surgiu e decidiu, com apoio de grande parte dos moradores, fechar o loteamento e cobrar a taxa para benfeitorias. Piacci não pagou. A briga foi parar na Justiça e a associação ganhou a causa porque o juiz entendeu que se tratava de um condomínio fechado. Como a dívida de condomínio é um motivo para perda do imóvel, ele determinou a penhora. O lote leiloado tem uma fonte, parte da piscina e saunas.