Mostra ressalta ‘vitória social’ da Revolução de 32, do voto à indústria

Galeria mantida por associação de funcionários públicos, protagonista do conflito, traz histórias marcantes da guerra civil

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Por Túlio Kruse
Atualização:

SÃO PAULO – O título de eleitora de Maria Bernini Pedrozo, de 1934, está guardado até hoje em uma vitrine, como uma das conquistas da Revolução Constitucionalista. Dois anos após a guerra civil, aquela foi a primeira vez em que mulheres foram às urnas no Brasil. A poucos metros de distância, fica o retrato da primeira deputada federal eleita no País, Carlota de Queiroz, médica que liderou o atendimento a feridos dos batalhões paulistas em 1932.

Os dois itens estão entre os mais de 200 em exposição na Galeria Jorge Mancini, o maior acervo conhecido de relíquias do conflito, que opôs insurgentes liderados por São Paulo contra o governo provisório de Getúlio Vargas. A guerra é considerada o principal fator que levou ao período democrático que durou de 1934 a 1937. “O movimento perdeu no campo de batalha, mas ganhou na democracia”, resume a idealizadora do espaço, Thais Helena Costa, que doou o título de eleitora da mãe, a costureira Maria Pedrozo. “Foi uma reviravolta na posição da mulher na sociedade.”

Mais de 200 itens estão expostos na Galeria Jorge Mancini, o maior acervo conhecido da Revolução de32 Foto: Felipe Rau/Estadão

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Mantida pela Associação dos Funcionários Públicos do Estado de São Paulo (Afpesp), na Sé, no centro da capital, a galeria serve de referência quando o assunto é preservação da memória da revolução. Dali são feitos empréstimos a muitas exposições especiais sobre o tema, com uniformes originais da tropa, balas, capacetes e cartazes da campanha de mobilização dos voluntários. 

As mulheres tiveram protagonismo no front e na retaguarda. Na galeria, um caderno com orientações de enfermagem, escritas à mão, mostra como as cuidadoras experientes treinavam as mais novas. Elas organizavam o envio de comida, a arrecadação de fundos, trabalhavam na indústria bélica e também pegavam em armas. 

A cozinheira Maria José Barroso ficou conhecida por se incorporar a um destacamento militar e ganhou o apelido de Maria Soldado. Ela dá nome a um museu no Obelisco do Ibirapuera, onde há um mausoléu dedicado aos heróis da revolução. 

Caderno reunia orientações de enfermagem a voluntárias; avanço de direitos, como a garantia do voto a mulheres, foi um dos legados de 32 Foto: Felipe Rau/Estadão

Na comemoração dos 87 anos da revolução, a Afpesp também exibe a mostra visual Identidade, um vídeo que reúne relatos de ex-combatentes e narra o conflito do início ao fim. E registra algumas das histórias mais marcantes da guerra – como a do Batalhão Paes Leme, que barrou o avanço das tropas governistas por semanas em Pouso Alegre, próximo da divisa de Minas Gerais e São Paulo. “Estamos admirados da coragem da nossa gente”, diz a carta do ex-combatente Bento Queiroz Telles, entrevistado no vídeo.

O nome da galeria homenageia seu maior doador, Jorge Mancini, que com outros cinco irmãos se alistou no Exército Constitucionalista Paulista. A própria história da Afpesp está ligada à oposição de paulistas e getulistas. A entidade surgiu em 1931, entre o golpe que instituiu o governo provisório de Vargas e o início da revolução, para defender os direitos de funcionários públicos que se sentiam perseguidos pelo governo federal. Mancini foi um dos muitos que, ao voltar da guerra, deixaram na associação o que trouxera do campo de batalha. 

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Indústria

A consolidação do maior parque industrial do País, em São Paulo, é atribuída por muitos historiadores a um dos resultados da revolução em 1932. Isolados pelas forças federais de Vargas, os paulistas tiveram de se voltar aos próprios recursos para levar em frente o conflito. Nos três meses de duração da guerra, as fábricas do Estado conseguiram colocar cinco trens blindados nas ferrovias, essenciais para a o transporte de soldados e equipamentos. As composições eram protegidas por chapas metálicas, uma inovação para a época.

Acervo da Afpesp tem um dos fuzis usados pelos paulistas na Revolução de 32; associação já recebeu mais de mil documentos da época Foto: Felipe Rau/Estadão

No mesmo período, as tropas também trocaram quepes de pano por capacetes de ferro produzidos localmente. Até lança-chamas – inventados na 1.ª Guerra Mundial – foram usados no combate, como mostra uma das fotos do acervo. Ao fim do conflito, as indústrias que se mobilizaram no lado mais fraco da guerra seguiram entre as mais competitivas do País. “São Paulo ganhou um corpo de desenvolvimento muito maior a partir da Revolução de 32”, diz o gerente da Coordenadoria de Educação e Cultura da Afpesp, Hosaná dos Santos Dantas. 

Associação premia ‘Estado’

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A Associação Comercial de São Paulo (ACSP), uma das entidades que deu apoio ao movimento constitucionalista de 1932, premiou o Estado com o colar Carlos de Souza Nazareth. A honraria foi recebida pelo diretor presidente do Grupo Estado, Francisco Mesquita Neto, na quinta-feira. O colar leva o nome do presidente da ACSP durante o conflito e foi criado para preservar a memória da Revolução de 32 e reverenciar pessoas e instituições dignas de reconhecimento público. 

“A Revolução Constitucionalista é a origem da força da nossa federação”, disse o presidente da ACSP, Alfredo Cotait Neto. “A liderança que São Paulo exerce no Brasil é graças ao início esse movimento. São Paulo mostrou, na defesa dos nossos ideiais, o que era importante para a sociedade brasileira.”

Receberam a outorga do colar, também, a Fundação Bradesco e o coronel Luiz Eduardo Pesce de Arruda, da Polícia Militar, que é estudioso da Revolução de 1932.

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