Máfia do ICMS faz Alckmin montar nova corregedoria na Secretaria da Fazenda

Projeto enviado à Assembleia extingue órgão criado por governador em 2002, que é criticado por promotores que investigam suspeitos

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Por Fabio Leite
Atualização:

SÃO PAULO - Após uma série de casos de corrupção envolvendo agentes fiscais de São Paulo, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) decidiu montar uma nova Corregedoria da Fiscalização Tributária (Corfisp) subordinada diretamente ao secretário da Fazenda. Segundo o titular da pasta, Renato Villela, o objetivo da medida é “evitar interferências indevidas” nas investigações internas sobre fiscais suspeitos de prática ilícita.

No projeto de lei encaminhado em regime de urgência à Assembleia Legislativa, Alckmin extingue a atual corregedoria (Corcat), que foi criada por ele em 2002 e responde ao coordenador da Administração Tributária, chefe da Receita Estadual. O órgão já foi criticado pelos promotores que investigam a máfia do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) por arquivar apurações internas contra fiscais mesmo com evidências de corrupção.

Sede da Secretaria Estadual da Fazenda, no centro de São Paulo Foto: Daniel Teixeira/Estadão

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Um dos casos aconteceu em setembro de 2014, quando uma operação do Ministério Público apreendeu R$ 450 mil em dinheiro em escritórios de dois delegados e um inspetor tributários da Grande São Paulo suspeitos de integrar um esquema de fraudes que teria desviado R$ 2,7 bilhões dos cofres públicos para favorecer empresas do setor de soja em Bauru, no interior. Os três fiscais foram exonerados em setembro deste ano.

À época, o promotor Marcelo Mendroni, do Grupo de Atuação Especial de Combate a Delitos Econômicos (Gedec), afirmou que a Corcat havia feito um relatório completo sobre o esquema de fraudes, mas o processo havia sido arquivado. Depois disso, foi a Corregedoria-Geral da Administração (CGA), vinculada à Secretaria de Governo, que auxiliou os promotores nas investigações.

Pelo projeto de Alckmin, além de ficar subordinado ao secretário, o novo órgão de fiscalização terá um corregedor adjunto e deverá renovar 25% de seu quadro de corregedores todo ano, promovendo um rodízio entre os fiscais dos fiscais. Cabe à corregedoria, por exemplo, rever trabalhos feitos pelos agentes, como conferir o recolhimento de tributos pelas empresas e autuar sonegadores.

O antigo diretor da Corcat, José Carlos Moreira Pacheco, chegou a ser reconduzido ao cargo para mais quatro anos de mandato em janeiro deste ano, mas se aposentou dois meses depois. O posto é ocupado hoje por Carlos Roque Gomes. Questionada sobre a mudança na quinta e na sexta-feira da semana passada, a Secretaria da Fazenda não se manifestou.

Motivações. Nas justificativas do projeto, Villela afirma que “estudos em controle interno na administração pública” feitos por instituições internacionais “apontam, como fator crítico de sucesso, que o órgão responsável pelo controle interno deve estar subordinado diretamente ao grau máximo da hierarquia da entidade em questão, como forma de evitar interferências indevidas em sua atuação”.

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A mudança na corregedoria da Fazenda foi proposta pelo secretário ao governador no dia 30 de julho, seis dias após a prisão dos primeiros cinco fiscais suspeitos de integrar a máfia do ICMS, acusada de cobrar ao menos R$ 35 milhões em propina de duas empresas do setor de cobre para reduzir o imposto devido. Ao todo, dez fiscais chegaram a ser presos e são réus na Justiça. Dois deles já tiveram os bens bloqueados.

Somente a Prysmian Cabos e a Sistemas do Brasil admitiu aos promotores ter pago R$ 17 milhões em propina aos agentes, entre 2006 e 2013, nas suas filiais em Jacareí, Santo André e Sorocaba. Chamada de Operação Zinabre, a investigação contra a máfia ganhou força após o doleiro Alberto Youssef, delator da Lava Jato, ter detalhado aos promotores, em junho, os pagamentos feitos a fiscais paulista do esquema de corrupção.

Após o depoimento, ao menos dez servidores da cúpula da Receita Estadual perderam cargos, entre os quais o ex-chefe da Coordenadoria da Administração Tributária (CAT) José Clóvis Cabrera, ao qual a atual corregedoria é vinculada. De acordo com Alckmin, a exoneração dos fiscais foi “técnica”. Para Villela, envolvimentos de fiscais em esquemas de corrupção “são casos excepcionais” e não se trata de “uma questão sistêmica”.

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