Hospedagem de sites no exterior dificulta combate

Procuradoria já instaurou procedimentos para averiguar como lidar com a situação e a PF informou que vai acionar a Interpol

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Por Eduardo Reina e Rodrigo Burgarelli
Atualização:

Servidores hospedados no exterior, espectadores anônimos, transmissão em tempo real e adolescentes exibicionistas. Esses fatores constituem um grande problema para o Ministério Público Federal e para a Polícia Federal (PF), que prometem estudar a melhor maneira de coibir a pornografia infantil no Twitcam. A Procuradoria já instaurou procedimento para averiguar como lidar com a situação e a PF afirmou que analisará a denúncia e acionará a Interpol para contatar as autoridades no país onde o site está hospedado.Coordenador do Grupo de Combate a Crimes Cibernéticos do Ministério Público Federal (MPF), o procurador Adílson Paulo Prudente do Amaral Filho afirma que a novidade do fenômeno do autoexibicionismo nas webcams vai inaugurar uma linha de ação no órgão. "Pelo menos para mim é uma situação nova. A partir da notícia de que isso existe, temos de começar a trabalhar e pensar como agir nesse caso. É uma coisa bem séria." Um dos maiores problemas apontados por ele é a hospedagem do site no exterior, que complicaria qualquer tipo de compromisso com as autoridades brasileiras. Outra dificuldade que o MPF enfrentará é em relação aos espectadores. O órgão entende que, de acordo com o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), só comete crime quem publica os links nas comunidades do Orkut ou grava os vídeos e os armazena em servidores ou no próprio computador. Na avaliação da Procuradoria, será difícil enquadrar criminalmente os voyeurs que apenas assistem às transmissões. Indefinição. Essa posição, no entanto, não é consensual. O delegado Marcelo Bórsio, da Polícia Federal, acredita que os visitantes podem ser responsabilizados criminalmente, pois contribuem para atingir a audiência combinada nas promessas de tirar uma peça de roupa ou fazer algum ato obsceno. "Se alguém entra com a intenção de coagir o adolescente a se despir ou incita outros a acessarem o vídeo por esse motivo, pode ser enquadrado como aliciador", explica.Outro fator conflitante para os especialistas é a própria definição de pornografia infantil. Bórsio acredita que vídeos que mostram adolescentes exibindo seios ou nádegas não podem ser considerados objetos de crime, uma vez que o ECA tipifica apenas cenas de sexo explícito ou a exibição de órgãos genitais de crianças ou adolescentes "para fins primordialmente sexuais". Já Ariel de Castro Alves, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), diz que a situação pode ser resolvida com a aplicação do Código Penal. "Ele prevê o ato obsceno e o jovem pode responder ao tirar a roupa e expor ao público pela internet." As penas para o adulto que infringir o ECA variam de 3 a 6 anos de reclusão. Já o jovem poderá cumprir medidas socioeducativas e passar por análise psicológica. "Até o Conselho Tutelar pode tomar as medidas necessárias, se considerar que o adolescente está em situação de risco", diz Alves.Comportamento. Se a questão legal divide opiniões, especialistas em comportamento são unânimes em atribuir o autoexibicionismo a características típicas dos adolescentes. De acordo com a psicóloga Ana Cássia Maturano, uma das principais particularidades de jovens nessa faixa de idade é a sensação de onipotência. "Eles pensam que podem controlar tudo. Mas caiu na rede, já era. Há uma falsa impressão de que estão protegidos. Fica a ideia de que é tudo virtual, mas é real", explica.Pesquisa da SaferNet Brasil - organização não-governamental que defende e promove os direitos humanos na web -, feita com crianças e adolescentes entre 5 e 18 anos em todo Brasil, mostra que 12,11% já publicaram fotos suas íntimas na internet, ou as enviaram por e-mail, MSN ou site de relacionamento. "Creio que tirar a roupa na frente da câmera tem muito a ver com o culto à celebridade, com a vontade de ser conhecido rapidamente. Mas o jovem não pensa no que isso vai provocar no seu futuro", diz o diretor da SaferNet, Rodrigo Nejm.O Google, proprietário do site de relacionamentos Orkut, informou não fazer nenhum tipo de controle prévio de conteúdo e casos que desrespeitem normas de uso são passíveis de denúncia, podendo ser removidos automaticamente ou a pedido da Justiça. Procurada desde quinta-feira, a Livestream - empresa responsável pelo Twitcam - não retornou os contatos da reportagem. PRESTE ATENÇÃO...1. Acompanhamento. Os pais precisam saber o que seus filhos fazem na internet. É preciso ensinar noções de privacidade e a importância disso, alertar sobre comportamento de risco e como se proteger. Conhecer as amizades virtuais dos filhos é tão importante quanto saber quem são os amigos de verdade. Visitar o perfil de seus filhos nas mídias sociais também é recomendável, assim como deixar o computador em áreas coletivas da casa, como a sala. 2. Sem limites. Todos os vídeos, mensagens e fotos postados na internet podem ser repassados adiante - e o usuário perder o controle sobre isso. Oriente a nunca publicar nada com conteúdo sexual.3. Confiança. Os pais devem deixar espaço aberto para que os filhos tirem suas dúvidas sobre comportamento sexual em vez de se expor na internet. Também é aconselhável procurar apoio na escola e entre os professores.4. Futuro. Tudo o que se faz online tem consequências fora da internet e é para sempre. Futuros chefes, amigos, marido, mulher e filhos poderão acessar as imagens.5. Resistência. Pais devem sempre alertar os filhos para que não cedam à pressão de amigos e namorado (a) para produzir imagens sensuais, por mais apaixonados que estejam. As fotos e vídeos podem virar instrumento de vingança no futuro numa possível interrupção do namoro.6. Amizade virtual. Quantas pessoas que constam na lista de amigos nas páginas de seus filhos realmente são amigos? Repare que a maioria é gente estranha que apenas foi adicionada à lista.7 Para sempre. É impossível apagar uma imagem ou um vídeo quando eles começam a circular na internet. Tornam-se eternos.

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