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Haddad quer trocar bolsa-aluguel por locação e indicar os locais de moradia

Objetivo é acabar com pagamento em dinheiro, hoje em R$ 400 mensais, e evitar fraudes. Os quase 28 mil beneficiários poderão ir para prédios vazios

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Por Adriana Ferraz
Atualização:

A gestão Fernando Haddad (PT) quer acabar com o modelo atual do bolsa-aluguel, auxílio no valor de R$ 400 mensais concedido pela Prefeitura para famílias transferidas de áreas de risco ou em processo de reintegração de posse, por exemplo. O objetivo é que o pagamento direto, em dinheiro, para bancar a nova moradia deixe de existir gradativamente em seis anos. Em troca, a administração propõe novas formas de atendimento, que incluem aluguel de prédios vazios, invadidos ou em processo de desapropriação e até de unidades de uso compartilhado.

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As propostas constam da versão preliminar do novo Plano Municipal de Habitação, que será encaminhado à Câmara Municipal após as eleições. O documento cita o grande volume de beneficiários - quase 28 mil -, a falta de monitoramento adequado dos auxílios e a quantia elevada de recursos necessários para manter o programa: R$ 150 milhões por ano.

Na prática, a principal mudança diz respeito à autonomia do beneficiário. Se a mudança sugerida for aprovada na Câmara, os atendidos não terão mais escolha. Para assegurar a continuidade da ajuda, eles terão de aceitar viver nos prédios determinados pela Prefeitura, que quer ocupar a região central. A intenção, segundo o secretário municipal de Habitação, João Sette Whitaker, é assegurar que o benefício seja empregado de fato com fins de moradia e em locais que apresentem condições de habitabilidade, após análises prévias.

Centro. Prédio em desapropriação para locação social Foto: ALEX SILVA/ESTADAO

A nova política ainda tem dois potenciais “efeitos colaterais”, na análise da Prefeitura: a ocupação ordenada de prédios abandonados no centro e a pressão para baixo dos valores praticados pelo mercado imobiliário. Isso se os valores pagos pela administração forem aceitos pelos locatários.

“O Serviço de Moradia Social é um programa habitacional, com quatro diferentes modalidades. A bolsa-aluguel permanece, mas agora vamos até o fim. Vamos pagar diretamente ao locatário. Com isso, evitaremos que gente que more fora da cidade ou mesmo do Estado receba o auxílio. Identificamos pessoas vivendo no Piauí e que estão recebendo”, diz.

Segundo estipula o plano, essa modalidade abrangerá 20% dos atendidos, ao longo de 16 anos. As famílias serão encaminhadas a outros modelos. Entre eles está a concessão de um cômodo, e não de uma unidade completa, para parte dos cadastrados, a exemplo do que ocorre no programa De Braços Abertos, que atende usuários da Cracolândia. O mesmo poderia ser feito com moradores de rua.

O secretário ressalta que todas as modalidades previstas são provisórias e serão trabalhadas paralelamente à produção de moradia para atendimento final. Estima-se que só a demanda emergencial (resultado da necessidade de remoção total) seja de 90 mil unidades. “Não se atende uma população com um modelo só. É preciso ter alternativas. É preciso oferecer um cômodo por um ano, depois uma unidade transitória até que se alcance a moradia definitiva.”

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Fiador. Para o secretário executivo do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, Luiz Kohara, a Prefeitura deve liderar o processo de locação, a fim de garantir os direitos dos atendidos. “Simplesmente repassar dinheiro não resolve. Essas pessoas têm muitas necessidades e podem acabar usando a verba para outra finalidade. O correto é o poder público participar desse processo, assumindo, até mesmo, o papel de fiador.”

Kohara ressalta, porém, que a Prefeitura ainda precisa detalhar como será a seleção dos prédios e a divisão das famílias. “Não se pode retirar a pessoa da região onde ela vive, trabalha e onde seus filhos estudam.”

Para o promotor de Justiça Marcus Vinicius dos Santos, o modelo proposto pode levar a questionamentos quanto à escolha dos imóveis, o preço a ser pago por eles e os benefícios oferecidos aos proprietários. “Além disso, uma mudança que não seja acompanhada de um incremento no volume de recursos pouco adiantará.”

Prédio vazio pode ganhar reforma por meio de PPP

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Faz parte do plano a proposta de firmar parcerias público-privadas com o mercado para o retrofit de prédios municipais que hoje estão vazios. São cerca de 20 edifícios que poderão ser negociados em contratos de 30 anos de concessão. Após a reforma, o objetivo é usar os imóveis no programa de locação social.

Em elaboração pela SP Negócios, o primeiro edital deve ser lançado até o fim do ano, diz o diretor-presidente da empresa, Rodrigo Pirajá. “O projeto prevê que a empresa vencedora reforme e administre o imóvel. Já a locação das unidades seria assegurada pela Prefeitura, o que torna o modelo atrativo”, diz.

A maioria dos prédios que participarão da proposta de negócio é resultado de herança vacante - a Prefeitura assume quando o proprietário morre e não deixa herdeiros. Para o secretário municipal da Habitação, João Sette Whitaker, trata-se de um investimento necessário, até para rever a lógica do atendimento habitacional. “O sonho da casa própria foi uma coisa construída pelas empreiteiras na década de 1970. Precisa romper um pouco isso, seguir para o pensamento europeu, especialmente na região central da cidade”, diz.

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Durante a campanha eleitoral, o prefeito Fernando Haddad prometeu entregar 55 mil moradias em quatro anos. Até agora, afirma ter entregado 10,1 mil - dessas, cerca de 50% não foram produzidas pela Prefeitura, mas pela iniciativa privada. A contrapartida municipal foi apenas viabilizar o licenciamento.

Imobiliária. Além da PPP, a Prefeitura também prevê criar uma espécie de “imobiliária pública”, para detectar no mercado privado imóveis subutilizados. “Estamos propondo regular o mercado privado de aluguel. Se o proprietário topar alugar o prédio por um valor mais baixo, damos incentivos, isenção de IPTU, de ISS. Isso é muito comum na Europa e não tem aqui. Nossa ideia é incentivar isso, mas com um padrão mínimo de qualidade.”