25 de agosto de 2013 | 02h06
A história do universitário não é um caso isolado. As autoridades policiais sabem que parte dos pedidos de busca por desaparecidos não é crime. Em uma sociedade que convive de forma muito próxima com a violência, o primeiro temor da família de um jovem que some é sempre um sequestro ou até homicídio, como em muitas situações vistas recentemente. Mas as estatísticas revelam outras possibilidades mais comuns.
Boa parte dos sumiços se dá de forma voluntária, e outros estão ligados a transtornos psicológicos ou psiquiátricos. Famílias com graves problemas de relacionamento, ou, que pressionam o jovem a seguir um caminho com o qual ele não concorda, podem fazer com que ocorra uma fuga, como forma de chamar a atenção ou, ainda, como tentativa de exercer sua autonomia.
Algumas drogas, como se tem visto com o crack, mas que pode acontecer nos padrões mais pesados de uso de cocaína e de álcool, podem também tirar o jovem de casa e fazer com que ele busque a rua para viver. Próximo de outros usuários, muitas vezes cometendo delitos para obter dinheiro, movido à fissura da droga ou à pressão da abstinência, há uma quebra de contato importante com o núcleo familiar.
Transtornos psiquiátricos, como a esquizofrenia, que muitas vezes são acompanhados de alucinações auditivas e delírios, também podem impulsionar os jovens para saídas sem volta para casa. Na quebra do contato com a realidade (quadros psicóticos), viver caminhando pelas ruas, em busca de algo diferente ou fugindo de uma ameaça imaginária, é uma possibilidade concreta.
Boa parte dos moradores de rua nas grandes cidades hoje é formada por pessoas que tiveram problemas graves familiares, foram ou são dependentes de drogas ou, ainda, portadores de alguma forma de transtorno psiquiátrico crônico. Não é incomum que essas causas se somem.
Mas talvez a fuga de casa que mais chama a atenção, pelo inusitado, é aquela que acontece com um jovem que não tem problemas familiares, não usa drogas nem tem um quadro psicótico clássico. É o garoto ou garota que, quase do nada (às vezes, até com alguma questão emocional pouco exuberante), tem uma "quebra", uma dissociação abrupta da realidade, e passa a adotar uma conduta que não tem relação com seu comportamento anterior. É o que os especialistas chamam de fuga dissociativa ou psicogênica.
Ela dura, em geral, poucas horas ou um dia, mas pode se arrastar por semanas ou meses. Pode estar ligada a um estresse prévio, mas também ocorre sem motivo aparente. A pessoa se "esquece" de quem é e passa a adotar um comportamento absolutamente distinto. Afasta-se de casa, dos amigos, da faculdade e do trabalho, e pode viver sob outra identidade, tudo isso de forma não intencional. É como se fosse uma viagem, longe da consciência.
A "quebra" pode terminar de forma espontânea (da mesma forma que começou), mas não é incomum que essas pessoas sejam achadas na rua e internadas como desconhecidas, com problemas de amnésia e com dificuldades de precisar sua identidade. Podem ficar assim até que alguém da família as encontre, ou até que recobrem a memória de onde moram e qual o seu nome (muitas vezes, após uso de medicamentos). Na volta à normalidade, podem não se lembrar de nada do que ocorreu, ficando com uma "lacuna" dessa fase.
Quando acontece pela primeira vez, como tudo é inédito e imprevisto, para a família, além da preocupação, fica a sensação de surpresa. É quase inacreditável! Mas acontece, sim, e é importante um acompanhamento médico e psicológico para tentar evitar que o fenômeno volte a acontecer.
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