Exército diz que tráfico usou morador

Comandante vê ''ação orquestrada'' e destaca que suposta jovem morta não foi encontrada; população quer trocar soldados por UPP

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Por Tiago Rogero e RIO
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A ocupação no Alemão completa dez meses com reclamações de todas as partes. O Exército alega que alguns moradores estão sendo usados pelos traficantes. E a população quer trocar os soldados pela Polícia Pacificadora.O comandante militar do Leste, general Adriano Pereira Junior, vê uma "orquestração" criminosa nas ações verificadas desde domingo. "Estávamos envolvidos na investigação do que aconteceu, quando ocorreu a invasão", afirmou, referindo-se à ação de quatro militares que tentavam deter dois jovens vendendo drogas em um bar. "Ali começou o erro, (que foi) não perceber que se tratava de uma armadilha", disse, ao atribuir o episódio a uma estratégia do tráfico. Ele refutou a versão de que o que motivou a reação dos militares foi a recusa dos frequentadores de baixar o som da TV. "Mesmo assim, os soldados foram afastados e um inquérito foi aberto para apurar o que houve."O comandante também classificou como "uma trama" o relato feito por uma mulher à imprensa dizendo que sua sobrinha havia sido morta durante o tiroteio. "Procuramos em todos os hospitais a noite toda. Isso foi plantado para piorar o clima."No entanto, o militar considera improvável que a ação se repita. "Foi um tiro no pé do tráfico. Ficou claro para a população que houve uma orquestração. O crime não quer a nossa presença lá", disse. "Existe tráfico lá dentro. Não há paz completa."UPP. Morador do Alemão, o estudante Rene Silva Santos, de 17 anos, que ganhou notoriedade durante a ocupação de novembro, narrada pelo Twitter, e relatou a ação do tráfico anteontem pelo microblog, contou que os moradores voltaram a sentir um medo que já lhes parecia superado. "Hoje (ontem), já está tudo normal, mas à noite deu para ouvir bem os tiros."Na comunidade, os moradores se dividem entre os que culpam a truculência por parte dos soldados e os que acreditam que uns poucos estão agindo sob influência dos traficantes. Só há um consenso: todos querem que a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) substitua o Exército. "Em vez de chegarem com arma, por que não dão um tapinha no ombro?", indagou o auxiliar administrativo Leandro Silva, de 22 anos. "Para quem, como eu, nasceu e cresceu na favela, e via vagabundo o dia inteiro com arma na mão, é difícil essa mudança de realidade", rebateu outro morador. O clima de tensão ficou evidente quando militares tentaram desfazer ontem a barreira do tráfico na Rua Joaquim de Queiroz. Um grupo de nove soldados procurou, por 40 minutos, devolver as pesadas tampas à galeria de esgoto. A cada tentativa malsucedida, havia risadas de jovens. /COLABOROU ROBERTA PENNAFOTDUAS PERGUNTAS PARA...Gunther Rudzit, cientista político (USP), é mestre em Segurança Nacional e doutor em Segurança Internacional1. Demorou para ter uma reação forte do tráfico?Foi uma disputa local. Na retomada do Alemão, os traficantes fugiram, porque o confronto era contra as Forças Armadas. Mas nunca achei que ia ser um processo de entrar, pacificar e acabar de vez, em nove meses. Sempre achei que fossem voltar, mas "low profile", para evitar enfrentamento e perda de dinheiro. Nunca acreditei que o narcotráfico tivesse desaparecido.2.O Exército é a força adequada para manter a ocupação por tanto tempo no Alemão?O exército é capaz e foi necessário. Mas é arriscado. O soldado tem treinamento para matar e destruir o inimigo o mais rápido possível. O policial investiga e prende o bandido para ser julgado. Quando você coloca o soldado em área urbana tem de se preparar para danos colaterais. O atrito era de se esperar.

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