Estado de SP banirá canudo plástico; capital já proíbe

Veto vale em restaurante e bar, mas não para venda em mercado; multa municipal é a partir de R$ 1 mil

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Foto do author Gilberto Amendola
Por , Gilberto Amendola e Paula Felix
Atualização:

SÃO PAULO - O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou que vai sancionar o projeto de lei aprovado na semana passada pela Assembleia Legislativa que proíbe a distribuição de canudos plásticos pelo comércio de todo o Estado. Ele deve assinar a lei nos próximos 15 dias. Nesta terça-feira, 25, o prefeito da capital paulista, Bruno Covas (PSDB), sancionou texto com as mesmas regras, mas de vigência apenas no Município

Cartaz incentiva não uso do canudo no restaurante, na zona oeste paulistana; muitos locais já eliminaram item mesmo antes da lei Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADAO

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Segundo a assessoria de imprensa do Palácio dos Bandeirantes, Doria disse ser favorável à medida e vai sancioná-la, mas há um detalhe a ser estudado: a garantia de acesso aos canudos para pessoas com deficiência que têm dificuldade de ingerir alimentos sem eles. A preocupação surgiu após conversa do governador com a senadora Mara Gabrilli (PSDB), que atua em defesa desse público.

O texto, de autoria do deputado Rogério Nogueira (DEM), prevê multa que varia de R$ 530,60 a R$ 5.306 para os estabelecimentos que desrespeitarem a regra, com o dobro do valor em caso de reincidência. O valor arrecadado com as multas será “carimbado”, isto é, destinado exclusivamente a programas ambientais. O governo estadual terá um ano para regulamentar essa norma. 

Em sua justificativa, Nogueira afirma que a proibição tem como objetivo estimular “a produção de produtos mais sustentáveis e, consequentemente, a redução de resíduos prejudiciais ao meio ambiente”. No País, a primeira cidade a aprovar restrição do tipo foi o Rio. Além de Salvador, o Rio Grande do Norte e o Distrito Federal são alguns dos locais que já proíbem canudinhos. 

Em São Paulo, o texto aprovado por Covas tem prazo de 180 dias para ser regulamentado. A punição prevista para bares, restaurantes, hotéis, casas noturnas e outros estabelecimentos são mais pesadas: multa de R$ 1 mil na primeira infração e o dobro do valor nas autuações seguintes até o sexto flagrante, quando há o fechamento administrativo do local. Na lei municipal e na estadual, há liberação da venda de canudos em supermercados, o que garante o acesso do produto para as pessoas com necessidades especiais. 

Na capital, a alta gastronomia já liderava movimento para banir o uso dos canudinhos antes mesmo de a lei ser aprovada. No Grupo Maní (que inclui quatro restaurantes no Jardim Paulistano, zona sul) os canudos de plástico foram trocados por uma versão biodegradável em março do ano passado. Em outubro, esses modelos também foram abolidos e, agora, apenas aos clientes que pedem é dado um modelo de inox. 

“Quando a gente iniciou esse processo, muitos clientes questionaram, porque não concordavam em não ter o canudo no suco. Mas, com a conscientização, já tem o movimento de pessoas que trazem o próprio canudo”, diz Gláucia Ferrari, diretora de RH e atendimento da rede.

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No restaurante coreano Komah, da Barra Funda, zona oeste, o chef Paulo Shin afirma que, desde que a casa abriu, em 2016, a opção foi por não usar canudos plásticos para evitar a produção desnecessária de lixo. Depois, até o hashi (as hastes de madeira usadas como talheres) foram substituídas por material reutilizável. “A quantidade de lixo que era produzida era impressionante.” 

Impactos

Não há dados precisos sobre o consumo de canudinhos em São Paulo. A Associação Brasileira da Indústria de Plástico (Abiplast) afirma que apenas 0,03% dos cerca de 6 milhões de toneladas de plástico produzidos no País por ano sejam de canudos- o que daria algo ao redor de 1,8 mil toneladas.

O diretor presidente da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), Carlos Silva Filho, estima que a produção total de resíduos no País deve crescer 25% até 2050 e o tema “precisa ser enfrentado com ações estruturantes e permanentes de educação e conscientização ambiental junto à população”. Mas, segundo ele, só o banimento de canudinhos “concentra em um único item praticamente toda a responsabilidade pela poluição e pelos danos ambientais decorrentes da gestão ineficiente e destinação inadequada de resíduos sólidos”.

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Análise: Só ação midiática não adianta

Alexander Turra, professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (Iousp), responsável pela cátedra unesco para a sustentabilidade dos oceanos

O banimento dos canudos parece ser uma ação assertiva, mas possui peculiaridades que não podem ser desconsideradas. O banimento, diferentemente de campanhas de conscientização, não cria o nexo entre o não uso do canudo e seu eventual benefício ambiental. A população precisa ter a oportunidade de compreender a questão para poder se posicionar de forma madura e responsável. O banimento também é baseado no pressuposto de que o canudo utilizado não encontra um sistema de coleta e destinação de resíduos sólidos adequado, o que deveria ser garantido pelos municípios.

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Embora o canudo seja um item icônico para o diálogo sobre a temática, a importância de seu banimento como estratégia de combate ao lixo no mar é questionável. Eles não correspondem aos itens mais abundantes no lixo encontrado no mar. Dentre as principais fontes de lixo estão as áreas de ocupação irregular em morros, várzeas e manguezais, um problema socioambiental decorrente da pobreza e da falta de ordenamento territorial e de saneamento básico. 

Não tem lógica investir esforços e capital político no banimento como ação pirotécnica e midiática sem desenvolver estratégicas estruturantes para o combate ao lixo no mar, considerando educação ambiental, gestão de resíduos e territorial, eliminando a ocupação irregular e dando dignidade à população.

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