Entrevista com o escultor e fotógrafo Chico Bicalho

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Por Edison Veiga
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Chico Bicalho é escultor, fotógrafo e criador dos brinquedos de corda Critter, que são vendidos nas lojas do MoMA e Guggenheim em Nova York e do Centro Cultural Georges Pompidou, em Paris e outras lojas de design e de museus na Europa e Ásia. Trabalhou no estúdio da fotógrafa Annie Leibovitz e fotografou para as agências de Propaganda Giovanni FCB; Ogilvy & Mather; Contemporânea e 2PG. Em julho de 2008 recebeu menção honrosa na categoria Consumer Products no 54th Annual Design Review da revista ID Magazine para o produto Le Pinch da Kikkerland Design. Formado em escultura pela Rhode Island School of Design.   Já esteve em São Paulo (quando)? Como definiria nosso design urbano? Entre 1965 E 1975 visitava São Paulo com muita freqüência, com meus pais de carro, no Trem de Prata ou de Electra. Infelizmente, não tenho visitado São Paulo tanto quanto gostaria nos últimos 15 anos, portanto, minha memória ainda é de uma cidade mais tranqüila que o Rio, onde fazia muito frio no inverno e caía uma garoa. Essa memória ainda é em "preto e branco" dos anos 60, como num filme noir.   Mas, leio os jornais paulistas diariamente, e sei exatamente o que acontece na cidade. Sei que, como tantas outras cidades no mundo que cresceram demais, tem muitos desafios urbanísticos, mas, ao mesmo tempo, tenho consciência que é uma cidade efervescente, onde a cultura não pára de se sofisticar, e para onde a maioria das pessoas interessantes do Brasil está se mudando. Imagino que, quando São Paulo conseguir acertar a questão do transporte urbano, e com isso a poluição ambiental, será uma das melhores cidades do mundo para se viver.   Desde 2006, há uma lei em São Paulo que proíbe publicidade exterior. Em sua opinião, essa é uma boa solução para melhorar o aspecto visual da cidade? Acho que sim, porque, pelas fotos que vi do "antes e depois", a situação havia se transformado em poluição visual, e não em uma mídia eficiente.   Essa mesma lei trouxe um efeito colateral: fachadas mal conservadas de prédios velhos ficaram à mostra, escancarando uma feia realidade. Em sua opinião, como isso pode ser solucionado? Agora que tirou-se o tapete de cima, é necessário limpar-se a 'sujeira' arquitetônica. É uma pena que cidades importantes brasileiras, onde haviam prédios históricos interessantes, e uma arquitetura colonial, brasileira, mais simples, e mais elegante do que a herdada de Portugal, tenham se transformado em pesadelos arquitetônicos, com caixotes de concreto pichados, e esquadrias de alumínio, e prédios inexpressivos. O Rio é o exemplo maior dessa situação.   Entendo a frustração de proprietários de prédios que perderam o bom aluguel de uma empena cega para publicidade, e agora ainda se vêem na incumbência de melhorar a fachada que ficava outrora por trás de uma fonte de renda usurpada deles de uma hora para outra, mas, não se pode nivelar por baixo, e transformar a cidade num palanque com a proliferação incomensurável de cartazes.   O tanto quanto odeio pichação (rabiscos, todos iguais, no meu ver), admiro a maravilhoso trabalho dos grafiteiros paulistas. Talvez fosse uma boa solução, a prefeitura incentivar os artistas (e ao mesmo tempo desestimular a pichação), para que eles possam se expressar nessas paredes, se os proprietários se interessarem. Ou , quem sabe, se houvesse uma forma de fazer propaganda, com pintura, numa maneira mais artesanal, mais artística.   Em uma cidade que restringe tanto a publicidade exterior, como as empresas deveriam agir para reforçar suas marcas? Jornal, revistas, TV, internet, P.O.P.   Em termos de design, quais são (e onde funcionam) as melhores soluções para o mobiliário urbano? Na minha opinião, a combinação do MTR de Hong Kong, o Airport Express e o próprio aeroporto são um excelente exemplo de tecnologia moderna facilitando a vida das pessoas numa cidade grande. O MTR funciona com uma eficiência enorme e é extremamente simples de usar, mesmo para pessoas de fora da cidade.   Se você fosse convidado para desenhar os pontos de ônibus de São Paulo, como seria o projeto? Quais seriam suas principais preocupações? Se possível, como os de Curitiba.   Muito se fala em sustentabilidade hoje em dia. Como mesclar projetos eficientes em termos de urbanismo com tecnologias verdes? Por que tais projetos ainda são tão mais caros? Porque muita gente perde dinheiro com energia sustentável, e não há incentivos para desenvolvimento de novas energias. O uso da energia solar no Brasil já tinha que ter sido difundido desde os anos 80, porque não falta sol nesse País. Transporte urbano é outra questão que precisa ser resolvida com urgência, e em cidades como São Paulo e Rio o metrô tinha que ser expandido em toque de caixa. Quando se pensa que 90% do metrô de Nova York foi construído em 14 anos, a 100 anos atrás, eu me pergunto, porque não agilizam a expansão dos metrôs brasileiros? A construção dos metrôs de São Paulo e Rio se arrastam a 35 anos com linhas que talvez suprissem a demanda de cidades um décimo menor do que elas são hoje. O metrô é solução para o trânsito de qualquer cidade grande.   São Paulo tem dezenas de parques - nem todos tão funcionais, nem todos bem conservados, nem todos muito usados. O que um parque precisa ter para conseguir atingir plenamente suas funções? Quais são essas funções? Muitas árvores nativas da Mata Atlântica, árvores que dão flor, frutos e sombra, além de ajudar a melhorar o ar das cidades.. Qualquer cidade precisa de muitas árvores em todos os lugares. Dever-se-ia plantar árvores de 10 em 10 metros em todas as ruas de todas as cidades brasileiras, e os parques tinham que ser muito mais arborizados. Os departamentos de Parques e Jardins deveriam ter mais verba e mais poder para plantar e fazer manutenção de espécies arbóreas, assim como as escolas brasileiras deveriam incentivar a educação ambiental de todos os alunos nesse Brasil. A sombra de uma árvore é o lugar perfeito para o lazer em qualquer parque urbano do mundo.   Em sua opinião, qual é a maior beleza de São Paulo? E a coisa (ou lugar) mais feia? A maior beleza é a cultura, e a coisa mais feia, os engarrafamentos de 140 km.   Se pudesse escolher um projeto para fazer em São Paulo, qual seria? Arborizar a cidade inteira com árvores da Mata Atlântica, educar as pessoas para não jogar lixo no caule das árvores, para proteger a natureza, e aproveitar a natureza (repare como muitas pessoas acham que árvores e rios no Brasil são sinônimos de lixeira). Meu projeto seria tentar trazer o máximo de natureza para dentro de São Paulo. O outro projeto (mais caro, e mais inviável), seria construir o melhor, o mais moderno, e mais completo metrô do mundo em São Paulo. A vida na cidade mudaria dá água para o vinho.

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