Dobra nº de motoristas que se livram de multas

Entre as explicações estão os recursos mais elaborados e uma falha no sistema de radar

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Por Renato Machado
Atualização:

Mais do que o dobro de motoristas paulistanos se livrou de multas de trânsito neste ano. As Juntas Administrativas de Recursos de Infrações (Jari) deferiram 42.596 recursos de janeiro a maio - ante 19.152 do mesmo período de 2009 (alta de 122,4%). A principal causa é uma falha no processamento de autuações registradas por radares, mas também há quem esteja aprendendo a legislação e conseguindo reverter as multas. Também houve na comparação entre os dois períodos um grande aumento na quantidade de recursos impetrados (13,3%) e de julgados pelos órgãos responsáveis (49,7%). Mas só o fato de haver mais recursos sendo analisados não explica o crescimento na quantidade de motoristas que conseguem reverter suas infrações. Isso porque o índice de deferimentos também aumentou em relação ao total de recursos. Nos cinco primeiros meses do ano passado, 31% do total de recursos foi deferido e agora o índice passou para 46%.A principal causa para o aumento nos deferimentos é uma falha na fiscalização do rodízio feita por radares. "Foram aplicadas mais multas indevidas", diz um integrante da Jari municipal. Ele conta que praticamente dobrou no ano passado a quantidade de radares que conseguem fiscalizar o rodízio, mas uma falha no cadastro de isenções estaria provocando erros.Falha. "A Prefeitura não possui um mecanismo eficiente para delimitar quem é isento do rodízio. Um agente da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) sabia que um determinado furgão carregava produtos perecíveis, por exemplo, e não multava. Mas o radar não consegue diferenciar." A Secretaria dos Transportes reconhece o problema e afirma que está avaliando uma maneira de corrigir a distorção. "Atribuímos parte desse crescimento a ajustes de comunicação entre os sistemas de fiscalização e o banco de dados de veículos isentos." A pasta explica que há uma defasagem de tempo entre a confirmação do cadastro de isenção e o processamento das autuações. Consistência. Além disso, os especialistas afirmam que os recursos estão mais elaborados. "As pessoas descobriram que é possível reverter as multas com argumentos consistentes que mostram que a própria dinâmica do trânsito as força a cometer infrações", diz o proprietário de uma empresa especializada em recursos Éverson Luiz Hadad. Ele cita as infrações de rodízio, em que é possível conseguir deferimento comprovando tratamento médico, por exemplo. Hadad diz ser mais fácil conseguir deferimento de multas de rodízio, cinto de segurança, uso de celular e farol vermelho. Excesso de velocidade é quase impossível reverter. Outra causa apontada é a decisão do Supremo Tribunal Federal que proibiu a obrigatoriedade do depósito antecipado para a interposição de recursos administrativos. Agora não é necessário o pagamento da multa antes dos recursos em segunda instância, avaliados pelo Conselho Estadual de Trânsito (Cetran). "Isso aumentou os recursos no Cetran e a pressão sobre as Jari. Antes, a palavra deles era a final. Agora, se as decisões forem revertidas pelo Cetran, eles serão cobrados e por isso a análise dos recursos melhorou", diz o presidente da Comissão de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cyro Vidal.DESCULPAS FURADASCinto de segurançaSão comuns, apesar de sempre negados, os recursos em que o motorista afirma que estava usando o acessório, mas o agente de trânsito não viu pois os ocupantes do carro estavam com roupa preta ou com a camisa do Vasco da Gama - o cinto estava sobre a faixa preta da camisa do time.Excesso de velocidadeOs integrantes das Jari afirmam que sempre indeferem os argumentos de que houve excesso de velocidade porque os motoristas se sentiram perseguidos e estavam com medo de serem assaltados.Furar sinal vermelhoEmbora possa acontecer, caiu em descrédito a alegação de que desrespeitou o sinal vermelho para permitir a passagem de uma ambulância, viatura policial ou de bombeiros.PASSO A PASSOComo recorrer de uma multa de trânsito1.Ao receber a notificação, o proprietário do veículo deve indicar em até 15 dias o condutor que cometeu a infração. Se forem constatadas incorreções, é possível fazer requerimento de defesa, que deve ser entregue na Rua Boa Vista, 209, 1.º andar; na Av. do Estado, 900 ou encaminhado para a Caixa Postal 11.382-4, CEP 05422-970.2.O motorista deve explicar de maneira clara e sucinta seus argumentos. O requerimento deve ter possíveis provas - como fotos do local mal sinalizado - ou comprovantes de que o veículo não estava no local da infração (tíquete de estacionamento, por exemplo).3. Em caso de indeferimento, o motorista pode pedir novo recurso, que será julgado pelo Conselho Estadual de Trânsito (Cetran).TRÊS PERGUNTAS PARA...Julyver Araújo, EX-CONSELHEIRO DO CETRAN E PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DO TRÂNSITO1. Quais outros motivos podem explicar o aumento na quantidade e nos deferimentos dos recursos?É preciso analisar os casos. Mas as pessoas têm hoje um conhecimento maior da legislação, por isso buscam reverter as autuações. 2. Apesar do crescimento nos deferimentos, a maior parte dos casos ainda é negada. Por que isso acontece?Muitos não apresentam defesa concreta e só justificam os atos. São comuns recursos alegando que excederam a velocidade pois estavam atrasados. 3. Existe mesmo uma lista de argumentos que não "colam"?Infelizmente, alguns caíram em descrédito e são negados, prejudicando quem realmente passa pela situação.

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