Concentração de dióxido de carbono no ar bate recorde de 800 mil anos

Segundo painel da ONU, os resultados da queima de combustíveis fósseis vão aumentar temperatura do planeta em, no mínimo, 1.5°C

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Por ANDREI NETTO e ESTOCOLMO
Atualização:

Provocada em especial pela queima de combustíveis fósseis, a concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera da Terra hoje é a maior em 800 mil anos e sua taxa média de crescimento é a mais alta em 22 mil anos. Os dados (piores do que todos os estimados até então) foram divulgados ontem pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), grupo de experts das Nações Unidas, e revelam a gravidade da intervenção do Homem, o fator mais importante do aquecimento global.

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Reunidos em Estocolmo, na Suécia, para discutir com delegados governamentais uma síntese de 31 páginas do diagnóstico sobre o estado do planeta, cientistas foram enfáticos em reiterar: "O aquecimento do sistema climático é inequívoco e, desde os anos 1950, muitas das mudanças observadas não têm precedentes ao longo de décadas a milênios". Uma constatação semelhante já havia sido feita em 2007, mas ainda é contestada por "negacionistas" - políticos e uma minoria entre cientistas que não acreditam no aquecimento da Terra.

Conforme o relatório, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou 40% desde a era pré-industrial em razão das emissões oriundas da queima de combustíveis fósseis. Deste total, 30% foram absorvidos no período pelos oceanos, que por essa razão se tornaram mais ácidos e menos capazes de regular o clima.

Alerta.

"As concentrações de dióxido de carbono, de metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) cresceram desde 1750 em razão da atividade humana", sentencia o relatório, sem deixar espaço para dúvidas - o grau de certeza sobre a ação do homem é de 95%. "Em 2011, as concentrações destes gases de efeito estufa excederam os níveis pré-industriais em cerca de 40%, 150% e 20%, respectivamente", completa o texto, lançando a advertência mais forte dos cientistas: "Concentrações de CO2, de CH4 e N2O agora excedem substancialmente as maiores concentrações registradas em núcleos de gelo durante os últimos 800 mil anos".

As constatações são coerentes com as feitas pelo IPCC em seu último relatório similar, divulgado em Paris em 2007, mas são mais graves. Baseado em dados coletados até 2005, imaginava-se que a concentração de CO2 era recorde em 650 mil anos, e os núcleos de gelo só permitiam afirmar com certeza que o crescimento da concentração era recorde "em muitos milhares de anos".

Impactos.

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A emissão de gases que causam aquecimento global na atmosfera, responsabilidade do homem, tem como efeito direto o aquecimento médio do planeta. Entre 1951 e 2010, "gases de efeito estufa certamente contribuíram para aquecer a temperatura global média da superfície entre 0,5°C e 1,3°C".

No Hemisfério Norte, os 30 anos entre 1982 e 2011 foram o período mais quente em 1,4 mil anos, segundo os pesquisadores. Mantida a tendência, no melhor dos cenários a temperatura vai se elevar 1,5°C até 2100. O mais provável é que, mesmo tomadas medidas para reduzir as emissões de dióxido de carbono, a média suba mais de 2°C, o que já teria efeitos devastadores para os ecossistemas e para a humanidade - o impacto será analisado pelo IPCC em abril, no Japão.

Com mais CO2 e temperaturas mais altas, o derretimento de geleiras se intensifica, assim como o nível dos oceanos aumenta e a ocorrência de eventos climático extremos se torna mais frequente.

"A influência do Homem no sistema climático é clara", afirmou Thomas Stocker, um dos coordenadores do relatório apresentado ontem pelo IPCC. Para o pesquisador suíço, se nada for feito a Terra viverá um cenário pior do que o pior estabelecido pelo painel de cientistas. "A questão mais importante não é onde estamos hoje, mas onde estaremos em 10, 15 ou 30 anos. E isso depende do que faremos hoje."

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