Câmara estuda plano de demissão voluntária para cortar 12% do pessoal

Garagista de R$ 11 mil está na lista de cortes; plano ainda atinge assessor que marcava presenças em painel

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Por Adriana Ferraz e Diego Zanchetta - O Estado de S. Paulo
Atualização:

SÃO PAULO - A Câmara Municipal de São Paulo vai lançar um Programa de Desligamento Voluntário (PDV) para cortar 12% dos funcionários. Inédita no Legislativo brasileiro, a solução atinge 236 servidores, todos contratados sem concurso público e sem estabilidade. O foco é forçar a demissão de quem ingressou na Casa para realizar funções hoje consideradas incomuns, como lavador de carros, engraxate, garagista, encanador, eletricista e barbeiro. A economia anual pode chegar a R$ 30 milhões.

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Atualmente, os chamados celetistas (pagos no sistema CLT) possuem um salário médio superior a R$ 8 mil. Mas os rendimentos variam de acordo com o tempo de serviço. Como o Estado revelou em junho, garagistas ganham até R$ 11,4 mil mensais, rendimento superior ao dos vereadores, que recebem R$ 9,2 mil. Nesta quarta, após a divulgação do plano na rede interna da Câmara, pelo menos um deles chorava pelos corredores do Legislativo com a possibilidade de ser "convidado" a deixar o emprego.

A lista de funcionários afetados também atinge pessoas que ocupam cargos de chefia e de confiança dos vereadores. É o caso do diretor da área de Recursos Humanos, que recebe R$ 18 mil por mês, e do assessor parlamentar José Luiz dos Santos, o Zé Careca, flagrado pela reportagem marcando presença no painel eletrônico para vereadores ausentes no plenário.

Encomendado por Ítalo Cardoso (PT), primeiro secretário da Mesa Diretora, o estudo que determinou as regras do PDV foi finalizado há 15 dias e, apesar de ainda não ter data de lançamento, já virou tema de discussões acaloradas na Casa. De um lado, parlamentares levantam a bandeira da redução de gastos. Do outro, funcionários alegam que não podem ser punidos pelo inchaço da Casa. Hoje, são 1.937 servidores, o equivalente a 35 para cada um dos 55 vereadores. Na Câmara Federal, esse número é de 30.

"O corte atinge aposentados que já poderiam ter deixado a Casa. Hoje temos muitos funcionários com mais de 70 anos, ganhando salários de R$ 9 mil", diz Cardoso. Segundo o petista, o montante calculado para pagar as indenizações já está assegurado no orçamento. A previsão é de que as despesas com as indenizações previstas no PDV custem até R$ 107 milhões aos cofres do Legislativo em 35 meses, caso a adesão seja maciça.

Justiça. A execução do programa, no entanto, não vai depender apenas de verba orçamentária. Os funcionários atingidos prometem barrar a proposta na Justiça. "Esse PDV desrespeita e discrimina funcionários que há anos trabalham na Casa, desempenhando importante serviço, incluindo garantias aos próprios parlamentares sobre o desempenho de suas funções. No mínimo, ele viola os princípios da administração pública e, por essa razão, pode e deve ser questionado juridicamente", diz um dos servidores afetados.

Parte dos funcionários já procura assessoria jurídica para evitar a demissão, apesar de o programa ser voluntário. Segundo especialistas em Direito Trabalhista, porém, a proposta é legal.

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"Com algumas peculiaridades, os funcionários celetistas da Câmara estão sujeitos às mesmas regras praticadas pela iniciativa privada, onde os PDVs são comuns. Do ponto de vista da administração pública, se o plano causar economia de recursos, é uma medida indicada. Mas não pode vir acompanhado de um futuro concurso, para criar novos empregos. Aí, não tem cabimento", diz o advogado Estevão Mallet, professor da Universidade de São Paulo (USP). Oficialmente, o programa prevê a extinção definitiva dos cargos atingidos.

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