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Brasil não deve cumprir meta contra o analfabetismo

País tem 13,9 milhões de adultos que não leem, diz Unesco; até 2015, nenhuma proposta mundial será alcançada

Por Barbara Ferreira Santos e Marina Azaredo
Atualização:

O Brasil tem 13,9 milhões de analfabetos adultos, segundo levantamento feito entre 2005 e 2011 pela Unesco, no Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos, que foi divulgado nesta quarta-feira, 29. O número é maior do que a população de São Paulo, 11,8 milhões, e de todo o Estado do Rio Grande do Sul, 11,1 milhões. O País é o 8º entre os dez que concentram a maior parte (72%, no total) do número de analfabetos adultos do mundo, que é de 774 milhões, junto com Índia, China, Paquistão, Bangladesh, Nigéria, Etiópia, Egito, Indonésia e República Democrática do Congo.

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"Esse indicador mostra a parte, mas não o todo. Além de ter uma herança de analfabetos, o sistema educacional brasileiro tem produzido ainda mais analfabetos", afirma a pesquisadora em Educação da USP e doutora em Educação por Harvard, Paula Louzano. "Oito por cento das pessoas que têm ensino médio completo podem ser consideradas analfabetos funcionais, segundo o último relatório do Inaf (indicador de analfabetismo funcional)."

Para Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, o alto número de analfabetos no País influencia as gerações seguintes. "Em uma família em que um membro é analfabeto, há um contexto menos favorável à educação dos filhos", afirma. No entanto, para Priscila Cruz, do Todos pela Educação, resolver o problema do analfabetismo entre adultos não é tarefa fácil. "É preciso admitir que é uma área muito difícil de se conseguir resultados, pois não existe uma lei que obrigue o adulto a frequentar a escola."

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2012 mostram que, no segundo ano do governo Dilma Rousseff, a taxa de analfabetismo da população com 15 anos ou mais parou de cair e teve leve alta. Em 2011, era de 8,6%. Chegou a 8,7% em 2012, mais longe de cumprir a meta firmada na ONU de 6,7% até 2015.

Segundo a Declaração de Dacar "Educação para Todos", elaborada pela Cúpula Mundial da Educação em 2000 e que compõe os objetivos do Relatório da Unesco, os países deveriam reduzir o analfabetismo em pelo menos 50% até 2015. "O Brasil também não vai atingir essa meta", afirma a coordenadora de Educação da Unesco no Brasil, Maria Rebeca Otero Gomes.

Ela afirma que o País precisa observar se os recursos para a educação estão de fato sendo bem empregados. "O Brasil precisa alcançar uma melhor qualidade de ensino e corrigir as distorções idade/série."

Mundo. O cenário da educação em todo o mundo até o ano que vem, quando expira o prazo estabelecido pela Convenção, não é positivo. Nenhuma das metas globais do documento será atingida até 2015, segundo o relatório. De acordo com os dados, 57 milhões de crianças estão deixando de aprender por não estarem na escola. E a falta de qualidade é o que mais compromete a aprendizagem.

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Hoje, 10% do gasto mundial no ensino primário se perde na educação de má qualidade. Um terço das crianças que estão na idade correspondente a essa faixa de ensino não estão aprendendo o necessário, estejam ou não na escola.

O déficit mundial em educação básica é de 26 bilhões de dólares na educação. De acordo com a Unesco, 37 países perdem a metade do que gastam em escolas públicas porque os alunos não aprendem.

Para alcançar a educação primária universal até 2015, os governos precisariam contratam mais 1,6 milhão de professores, segundo a Unesco. "O relatório mostra que a qualidade está intrinsecamente ligada à questão dos professores, que são um ponto-chave para a educação. O Brasil é um dos países que precisa captar os melhores candidatos para os cargos de professores e preencher vagas", afirma Maria.

A desvalorização dos professores é citada no relatório como um dos principais problemas para o entrave da educação no mundo. O documento alerta que, na América Latina, embora os docentes recebam um valor maior do que o limiar da pobreza, a comparação dos salários não é favorável ao de outras profissões que exijam o mesmo nível de qualificação. Em 2007, profissionais técnicos com características similares ganhavam 43% a mais do que professores pré-primários e primários no Brasil e 50% a mais no Peru.

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Exemplos. No entanto, o relatório cita exemplos de esforços dos governos brasileiros no investimento para a educação básica e que têm surtido efeito. Entre eles, o aumento das receitas fiscais para a educação. Segundo a Unesco, essas receitas ajudam a explicar como o País investe dez vezes mais do que a Índia, por criança, na educação primária. "E no Brasil, por exemplo, garante-se um determinado nível mínimo de gasto por aluno, conferindo-se prioridade a escolas da área rural, e com maior ênfase dada a grupos indígenas altamente marginalizados. As reformas melhoraram as taxas de matrícula e aprendizagem no norte, região desfavorecida do País", afirma o relatório.

Para Daniel Cara, contudo, o País ainda precisa melhorar muito o chamado "custo aluno-ano", que é o quanto se gasta por aluno anualmente. "Quando você compara custo aluno-ano do Brasil e do Japão, você vê como cada Estado investe e prioriza a educação. Esse desnível de investimento entre os dois países, porque no Japão o investimento é muito maior, explica a diferença na qualidade de educação entre esses países".

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