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Após fogo, favela começa a se reerguer

Crianças ajudam os pais na reconstrução, vendendo metal retirado dos escombros

Por Artur Rodrigues
Atualização:

A Favela Sônia Ribeiro, na zona sul da capital, ainda estava fumegante na manhã de ontem. Os 1.140 desabrigados, entre eles muitas crianças, reviravam o que havia sobrado dos barracos na tentativa de reconstruir o que perderam no incêndio de anteontem. É como se uma favela invisível se erguesse sobre os escombros, com seus moradores tentando delimitar onde ficavam quartos, cozinhas, banheiros e vielas. "Aqui é minha casa", dizia uma moça, quando foi subitamente interrompida pela vizinha. "Você esqueceu do beco, aí é o beco", corrigiu a outra, cavucando no chão da casa com uma enxada. Com uma vassoura e um pano de chão, como se ainda tivesse as paredes ao seu redor, a doméstica Carla Ripardo da Silva, de 27 anos, limpava o chão com esmero. A mãe de cinco filhas voltou correndo na tarde de anteontem para ver se estava tudo bem com as duas meninas que haviam chegado da escola. As crianças se salvaram das labaredas. Mas, da casa, só sobrou mesmo o piso. Não é a primeira vez que o fogo consome tudo que Carla havia acumulado. Há cerca de três anos, ela se viu na mesma situação. "Pensei que só teria de passar por isso uma vez." Na tentativa de ajudar os pais a reconstruir suas casas, as crianças da favela começaram a garimpar moedas e pedaços de cobre para vender. Com um caderno na mão, Erivânia Soares, de 39 anos, anotava o peso dos objetos trazidos. Como os outros, ela também é moradora e diz que não conseguiu salvar quase nada. Mas, até o meio-dia de ontem, havia enchido uma caçamba de restos da casa dos outros, que ia comprando sem pensar muito. Eletrodomésticos velhos, fios, vergalhões - ela aceitava de tudo. "O quilo do alumínio custa R$ 2. No cobre queimado, estou pagando R$ 9. Bom, só tem queimado para comprar."Muitos passaram a noite em claro, vendo os bombeiros trabalharem no rescaldo do incêndio. Alguns montaram barracas no meio da rua, foram para a casa de parentes e outros buscaram abrigo na sede de uma entidade assistencial ali perto, a Expresso Ação. "Elas não têm prazo para sair daqui. Estamos esperando o governo fazer alguma coisa", afirmou o assistente social Antonio Firmino, de 41 anos. Na sede da ONG há muitas cestas básicas entregues pela administração municipal. Mas, sem fogão, arroz, feijão e os demais alimentos acabam ficando empacotados em algum canto. Assistência. A Prefeitura informou que as 285 famílias que perderam seus barracos já estavam cadastradas pela Secretaria Municipal de Habitação desde 2010. Agora, elas receberão auxílio-aluguel durante seis meses e depois serão incluídas no programa Parceria Social. Além disso, a pasta afirma ter distribuído 240 cestas básicas, 249 kits de higiene, 652 colchões, 651 cobertores e 500 lanches. O drama das famílias, mostrado ao vivo na TV, despertou solidariedade de muita gente. A garagem da advogada Bruna Costa Silva, de 26 anos, virou depósito de roupas de uma família. "Quando as pessoas conseguirem um local para ficar, eles voltarão aqui para pegar", explicou. Moradores de prédios nos arredores começaram a descer com sacolas cheias de roupas. Carros paravam com comida quente e as filas se formavam rapidamente.

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