São Paulo não foi planejada para ter seus cidadãos ocupando as ruas. Além disso, a empolgação carnavalesca da cidade estava adormecida havia muito tempo e só despertou recentemente, assustando muita gente.
Por causa disso, vivemos um período de choque cultural, tentando lidar ao mesmo tempo com mudanças revolucionárias, a de ter pessoas ocupando as ruas e a de haver blocos fervendo no carnaval. Em 2017, foram usadas bombas para dispersar os foliões da Praça Roosevelt, no centro. No ano anterior, o mesmo aconteceu na Vila Madalena, onde moradores se revoltaram com a quantidade de pessoas que tomaram as ruas estreitas do bairro.
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Como a folia não parece ser passageira, pois cresce a cada ano, teremos de aprender a conviver com ela e a tirar o melhor proveito desta fase em que São Paulo se torna um destino tão atrativo quanto Rio, Salvador ou Recife.
A utilização da 23 de Maio mostrou-se um esforço de encontrar um consenso entre a folia e a cidade que nunca para. Foi um teste válido e, das alternativas tentadas até aqui, aparentemente foi a mais acertada. É interessante notar que a Prefeitura tenha escolhido uma área por onde só passa gente motorizada. O senso comum talvez orientasse a ocupar locais onde pedestres já são bem recebidos.
Acontece que o carnaval de multidões demanda um tipo de uso do espaço público bastante específico. É preciso haver áreas de aglomeração e de dispersão, sombras e atalhos para os carros, além de, na medida do possível, proteger moradores do barulho e da sujeira. O centro e a Vila Madalena não preenchem esses requisitos.
Nem tudo foi perfeito na 23, mas o saldo deixa esperança quanto ao futuro. Apesar dos problemas, a multidão espalhada pela avenida demonstrou ter sido acertada a decisão da Prefeitura. Agora é aperfeiçoar a fórmula, rumo a um carnaval mais democrático e civilizado.
*É cofundadora do Esquina, plataforma de conteúdo multimídia sobre cidades