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Análise: Polícia tem papel a cumprir na Cidade Universitária, mas com outros atores

Segundo especialista, bom plano de segurança não pode responder com imediatismo a situações graves

Por Ana Lúcia Pastore
Atualização:

Um primeiro ponto a se destacar é que qualquer bom plano de segurança não pode responder, com imediatismo, a situações graves como a que aconteceu na terça-feira, 1, embora elas mereçam toda a atenção. Não se pode, por exemplo, pensar a redução da maioridade penal depois de um assassinato midiático cometido por um menor de 18 anos. Um segundo ponto se refere ao fato de a polícia ter, sim, um papel a cumprir na Cidade Universitária e em outros câmpus, mas ela deve ser um dos muitos atores de um plano de segurança.

Averiguou-se, por exemplo, que os rapazes suspeitos de terem atirado no estudante moram na comunidade San Remo. É fundamental para um bom plano de segurança que a USP, com base nas expertises de seus docentes, pesquisadores, discentes e funcionários, seja protagonista de propostas e ações - educativas, de lazer, urbanísticas, psicossociais e políticas - para essa comunidade, até mesmo colaborando para a formulação de políticas públicas mais amplas.

O estudante Alexandre Simão Cardoso foi baleado nessa terça-feira, 1º, durante tentativa de assalto perto da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH). O crime acontece após a USP anunciar mudanças em sua política de segurança. Foto: ALEX SILVA/ESTADÃO

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Outras ações que a superintendência de segurança da USP tem anunciado são importantes, mas pontuais e reativas. No caso das mais de 600 câmeras, cuja instalação já está prometida, cabe, por exemplo, perguntar quem vai monitorá-las. Sabe-se que uma pessoa consegue acompanhar, bem e simultaneamente, no máximo até oito imagens em uma tela. Quantos funcionários serão necessários para o devido acompanhamento preventivo e não meramente reativo desse conjunto de câmeras? E qual política de segurança embasará o olhar humano por detrás das lentes mecânicas?

Em relação à Polícia Comunitária Koban, quais adaptações foram pensadas para adequar o modelo usado no contexto japonês a um modelo que a comunidade USP considere como adequado a seus desafios? A comunidade está sendo previamente ouvida e consultada? No Japão, por exemplo, o policial reside onde trabalha. Na Cidade Universitária, como os policiais se comporão com os moradores do Conjunto Residencial da USP (Crusp)? Construirão juntos uma pauta de prioridades e de ações?

Se não houver uma verdadeira política de escuta dos mais diversos setores da comunidade acadêmica, antes e durante a implementação da polícia comunitária Koban, as resistências serão enormes e possíveis ganhos estarão de antemão comprometidos. A comunidade acadêmica, os funcionários da Guarda Universitária e os vigias dos prédios precisam ser coautores e corresponsáveis em um plano de segurança para que ele tenha chances de sucesso.

Ana Lúcia Pastore é professora do Departamento de Antropologia da USP e ex-superintendente de segurança da Cidade Universitária

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