A rotina de uma cidade quase sem água

Estiagens em Bagé (RS) fazem com que 117 mil moradores se adaptem ao abastecimento parcial

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Por Elder Ogliari e PORTO ALEGRE
Atualização:

De tanto conviver com estiagens, os 117 mil moradores de Bagé, no sul do Rio Grande do Sul, tiveram de adaptar sua rotina ao racionamento de água. O problema vem de décadas, todos reconhecem, mas os cortes, que eram esporádicos, tornaram-se repetitivos de 2006 para cá. Desde então, o único ano que teve abastecimento pleno, de janeiro a dezembro, foi 2010. Desde o início de 2012, metade da cidade recebe água das 3h às 15h e a outra metade, das 15h às 3h.

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Os consumidores conseguem conviver com o racionamento, mas sofrem com transtornos. A dona de casa Norma Bastos Cruz, de 78 anos, mora com o irmão Carlos, de 74, em uma casa do bairro Kennedy, e costuma encher um reservatório de 500 litros quando a água chega. "Há dias em que não dá para lavar roupa ou louça e a solução é esperar pelo dia seguinte. Em outros, é arriscado deixar para tomar banho depois das 15 horas porque posso ficar sem."

Se dependesse exclusivamente da água distribuída pelo Departamento de Água e Esgotos de Bagé (Daeb), outra dona de casa, Maria Genoveva Mareque, de 59 anos, passaria pelos mesmos inconvenientes da maioria da população. Ela, o marido e um filho de 38 anos suprem os desabastecimentos tirando água de um poço no terreno onde vivem há 22 anos. E permitem que os outros moradores da Vila dos Anjos se abasteçam no local. "Não cobramos nada, não há como negar água para alguém."

Represas. Entre as explicações para a situação de Bagé estão a falta de um grande manancial, a sequência de estiagens no Rio Grande do Sul e a má distribuição das chuvas no sul do Estado. "A precipitação de 1,2 mil milímetros por ano é normal, mas os intervalos entre as chuvas têm se espaçado", diz o diretor de captação do Daeb, Sérgio Rodrigues. Nos últimos tempos, no entanto, nem esse índice foi atingido. O déficit pluviométrico é de 1,5 mil milímetros desde 2010.

Os 45 milímetros de chuva desta semana não foram suficientes para encher as três barragens da região e os cortes vão continuar, segundo o Daeb. Na noite de sexta-feira, a água estava 3 metros abaixo do nível normal na Barragem do Piraí, com capacidade para 2 milhões de metros cúbicos, e 8 metros abaixo na Barragem de Sanga Rasa, que pode armazenar 1,7 milhão de metros cúbicos. Só a barragem emergencial, com capacidade para 300 mil metros cúbicos, estava cheia.

As barragens não são abastecidas por rios. A de Piraí, construída no início do século passado, recebe água das vertentes do subsolo e da chuva. A de Sanga Rasa, dos anos 1970, capta exclusivamente da chuva. A emergencial, de 1989, é a única que represa um arroio, o Piraizinho. E também é a que vai ser transformada na Barragem de Arvorezinha, uma obra de R$ 40 milhões que dará ao município a capacidade de armazenar 18 milhões de m³ de água.

"O projeto tem uma margem de 30 anos", comenta Rodrigues, referindo-se à perspectiva de Bagé passar as próximas décadas sem falar mais em racionamento. Antes, no entanto, os moradores ainda terão um período duro pela frente. Até que a barragem fique pronta e esteja cheia, no fim de 2013, eles seguem torcendo para que volte a chover bastante em Bagé.

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