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A importância de ter visto tantos números

Por Maurício Broinizi Pereira
Atualização:

Entre muitas reflexões, os 457 anos de São Paulo evocam a necessidade de um encontro dos paulistanos com a cidade. Como tudo é superlativo na metrópole de 11 milhões de habitantes e 1.500 km², tal encontro - para não se tornar superficial e ligeiro, dado que a cidade é profunda, intensa e complexa - deve cumprir o ritual básico de primeiro conhecê-la bem. O percurso proposto até aqui foi o do conhecimento de São Paulo por meio de informações qualificadas que buscam retratá-la em suas múltiplas dimensões. Sejam quantitativos ou qualitativos, números, índices, medidas e percentuais servem para representar dimensões da realidade e traduzir simbolicamente informações devidamente registradas por organizações públicas ou privadas, de forma que se transformem em instrumentos fundamentais para subsidiar governos, empresas, universidades e entidades da sociedade civil para a tomada de decisões, definição de prioridades, produção de conhecimento e realização da transparência e comunicabilidade de tudo o que uma sociedade precisa saber para funcionar democraticamente.Nos últimos anos, São Paulo avançou muito na produção, organização e divulgação de seus indicadores, tanto os públicos quanto os divulgados pelo setor privado e pela sociedade civil. Mas ainda há muito o que avançar, pois a desproporção entre a disponibilidade dos indicadores e seu uso efetivo é enorme, principalmente nos repertórios da política, dos governantes e do embasamento de políticas públicas. Administrar São Paulo sem usar os indicadores disponíveis para determinar prioridades beira a irresponsabilidade. Mas o setor público, que é o que mais necessita dessas ferramentas para uma gestão competente, geralmente pouco as utiliza ou as oculta na retórica fácil da tergiversação político-administrativa. É só olhar o que dizem os indicadores sociais, econômicos, culturais e ambientais das 31 subprefeituras da cidade. Eles constituem o melhor instrumento para elaboração do orçamento e definição de prioridades nas políticas públicas, mas pouco do que a realidade pede como prioridade se espelha nos investimentos públicos. Em muitos casos, os indicadores técnicos da cidade, cujas fontes de elaboração e divulgação são oficiais, nem são citados na elaboração orçamentária ou no Plano de Metas em vigor, como se as políticas públicas propostas não tivessem relação direta com as metas para diminuir o déficit de vagas no ensino infantil, o tempo médio de atendimento no serviço de saúde pública, a falta de equipamentos culturais na periferia ou o tempo gasto nos deslocamentos.Por trás de cada indicador, geralmente há uma política pública, ou a revelação de sua ausência, o que torna muito mais exposta uma administração, seja na escolha das prioridades em políticas públicas ou na competência para executá-las. Daí talvez se explique a resistência dos partidos políticos e governantes em se tornarem os principais usuários e interlocutores dos indicadores.As organizações da sociedade civil que trabalham com fiscalização e controle social das políticas públicas são testemunhas de como é difícil obter uma interlocução qualificada, em termos de indicadores, com governantes e partidos políticos. E tal dificuldade não tem a ver apenas com incompetência - há inúmeros casos explícitos espalhados pelo Brasil da infeliz frase de um ex-ministro: "O que é bom a gente revela, o que é ruim a gente esconde." O público nem sempre é público, a informação é submetida à lógica da reprodutibilidade no poder. Em linhas gerais, apesar dos avanços nos registros de dados, informatização e elaboração de indicadores no Brasil, ainda vivemos a pré-história de sua correta utilização para fins públicos.No caso de São Paulo, a cidade conta uma enorme quantidade de indicadores e outros instrumentos, como a Lei das Metas, o Plano Diretor e as Subprefeituras, para aprimorar efetivamente a gestão pública, assim como há uma sociedade civil que tem assumido a ética da corresponsabilidade pela construção de uma cidade com indicadores bem melhores. Não custa insistir no óbvio, faz parte de nossa missão, e como diz a música de um compositor mineiro: "A lição sabemos de cor, só nos resta aprender."É COORDENADOR DA SECRETARIA EXECUTIVA DA REDE NOSSA SÃO PAULO E DA REDE SOCIAL BRASILEIRA POR CIDADES JUSTAS E SUSTENTÁVEIS E PROFESSOR DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DA PUC-SP

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