3 imóveis são demolidos por dia em SP

Em 4,5 anos, 4.713 casas e galpões foram substituídos por prédios; especialistas e moradores alertam para descaracterização de bairros

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Por Rodrigo Brancatelli
Atualização:

Uma cidade inteira de casas sumiu entre os prédios de São Paulo nos últimos quatro anos e meio, período do boom imobiliário paulistano. Enquanto o mercado lançava dez novos edifícios por semana, foram demolidos na capital exatos 4.713 imóveis, entre residências e galpões industriais - mais do que o total de domicílios de 148 municípios paulistas. Isso significa que três endereços foram destruídos por dia para dar lugar a prédios residenciais e empresariais.No mesmo período, São Paulo ganhou 2.439 edifícios, com um total de 155.610 apartamentos. Ou seja, enquanto a capital inflou uma São Caetano do Sul de apartamentos, perdeu uma Aparecida d"Oeste de casas. "Tenho certeza de que estamos perdendo muito da identidade dos bairros de São Paulo", diz Regina Monteiro, presidente da Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU) da Prefeitura e integrante do Conselho Estadual de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat). "Teríamos de ter planejamento, mas hoje não temos instrumentos para evitar esse problema. Não é uma coisa saudosista, tem a ver com a ambiência que traz qualidade de vida ao paulistano."O Estado fez o levantamento exclusivo dos imóveis demolidos com base em todos os deferimentos de alvarás de execução de demolição publicados no Diário Oficial de 1.º de janeiro de 2007 até a semana passada. Neste ano, já foram demolidos 204 imóveis. No ano passado, o número chegou a 1.590, enquanto em 2009 foram 933; em 2008, 1.095; em 2007, 891. Com o cruzamento dos dados, é possível ver que os bairros que mais perderam casas foram justamente aqueles cuja identidade sempre esteve ligada a sobrados, palacetes e residências da primeira metade do século passado - como Vila Mariana, Pinheiros, Saúde, Itaim-Bibi, Bela Vista, Consolação e Mooca. "São inúmeros os casos. Posso citar o casarão da Rua Pará e o da Alameda Santos como exemplos marcantes", diz o fotógrafo Douglas Nascimento, que edita o site São Paulo Antiga (www.saopauloantiga.com.br). "Um dos postos de gasolina mais antigos de São Paulo, no Glicério, ter ido abaixo em julho também impressionou pelo descaso à São Paulo de outros tempos." Criado em 2009, o site é uma espécie de canal virtual de fiscalização e coleciona fotos de casas, fábricas e galpões abandonados que correm o risco de desabar ou ser demolidos. Nascimento já visitou e fotografou 800 endereços."A cidade perdeu muito de sua identidade e de sua arquitetura. Alguns bairros, como Vila Madalena, Pinheiros e Tatuapé, foram completamente modificados. Não dá para preservar a cidade inteira, não há como segurar o progresso. Mas não é possível deixar a cidade perder sua alma indiscriminadamente."Lucro. Para as demolidoras, o mercado cresce de 20% a 30% ao ano, segundo a Desmontec, empresa responsável pelas demolições da Praça Roosevelt e do Estádio Palestra Itália. "O mercado explodiu nos últimos cinco anos", resume o diretor comercial, Hewerton Bartoli. / COLABOROU MÁRCIO PINHO

 

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