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Sobre o projeto de Oscar Niemeyer para o Ibirapuera

Por Henrique de Carvalho
Atualização:

Ilustração do autor (Henrique de Carvalho)  

Há alguns anos, uma exposição na Oca expôs maquetes do Ibirapuera desde as versões preliminares do projeto de Oscar Niemeyer até sua conformação final.

Resgatei aqui algumas observações feitas à época e outras anotações a respeito do parque inaugurado em 1954.

Versão Inicial

Maquete do primeiro estudo para o Parque do Ibirapuera. (foto: autor desconhecido) _ Projeto de Oscar Niemeyer, 1951.  

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A primeira proposta, de 1951, apresentava blocos mais soltos pelo parque, enquanto a segunda cria uma área mais bem demarcada pelos blocos ortogonais, delimitando melhor o refúgio construído do parque que é a marquise, elemento articulador do conjunto em ambas as propostas. Nesta versão da marquise também parece perder-se demais pra lá e pra cá, intercalando trechos retos com curvas que fazem mudar o sentido da cobertura, num ziguezague demasiadamente ornamental, e não estava ainda à altura das curvas mais elegantes que bem caracterizam a obra do autor. Obviamente, as alterações no tamanho atenderam pedidos de redução da área construída por questões de economia e prazo -- o parque seria inaugurado em comemoração aos 400 anos da cidade de São Paulo --, mas as alterações estéticas foram iniciativa do próprio autor.

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Anos depois, esta Oca com rampa lateral foi adotada em um de seus últimos projetos para Brasília, o Museu Nacional da República, a completar o conjunto cívico da capital do país.

Os volumes dos edifícios alongados, na primeira versão, lembram o projeto para a indústria Duchen, em São Paulo, feita por Niemeyer em 1950. Depois ganharam linhas mais puras, como as que conhecemos hoje.

Croquis indicando as semelhanças do sistema estrutural entre o desenho para a Indústria Duchen e a primeira proposta para os edifícios do Parque.  

Versão Final

Maquete da versão final, que deu origem ao Parque que conhecemos hoje. (foto: autor desconhecido) _ Projeto de Oscar Niemeyer, 1951.  

A segunda versão é bem mais elegante, com curvas mais extensas e contínuas que diluem a transição dos trechos retos nos poucos e generosos arcos de compasso. Nesta versão definitiva, podemos observar como os arcos internos empurram as linhas dos contornos externos da marquise para dentro e para fora do parque.

Ainda sobre a marquise, que é a edificação mais emblemática de todo o parque, há dois arcos de grande dimensão criando o afastamento necessário para que Oca e Auditório sejam vistos integralmente, com a cidade acontecendo ao fundo -- ainda que no plano original as avenidas fossem enterradas. Um terceiro arco delimitando este tipo de ponto focal não inclui nenhum objeto central, mas dois objetos laterais retangulares que adentram o campo visual pelas laterais, tendo o vazio como centro. Isto reforça um recurso que se repetirá no Pavilhão da Bienal: o prédio longo, visto de longe, entra e sai do meio das árvores, dificultando a apreensão de toda seu percurso. Assim, dependendo do ângulo, vemos só um pedaço da edificação linear, como se ela viesse desde o infinito até aquele ponto.

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Croquis destacando a composição visual a partir dos pontos de afastamento para visualizar a Oca, o Auditório e os dois outros volumes retangulares que entram pelas laterais do campo visual.  

Nas duas revisões, dois edifícios se mantiveram praticamente intactos. 

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Um foi a Oca, prevista inicialmente com uma rampa a contornar o volume curvo, em espiral. O projeto foi revisado pelo autor, suprimindo a rampa, mas manteve-se praticamente intocado no restante.

Outro foi o Auditório, que persistiu como volume triangular invertido (lado maior para cima). Acabou sendo construído uns 40 anos depois e, nesse período, teve 6 outras versões, todas revisões do Niemeyer. Na última virou o prédio que conhecemos: um triângulo apoiado pelo lado maior no solo. Valeu a pena esperar a desistência da ousadia estrutural em favor da pureza. Inicialmente a composição remetia a Brasília, esquema recorrente adotado por Niemeyer para a composição de volumes: um pesado se assenta no solo (Oca, no caso) e outro parece flutuar (Auditório apoiado pela aresta do triângulo). 

Ao final, com quase cem anos, decidiu aceitar a lei da gravidade e facilitar ao Auditório do Ibirapuera sair do papel, fazendo-o também um volume pesado, apoiado em seu lado maior bem assentado no chão. Diferente da relação peso-leveza presente em Brasília, não deixa de haver um belíssimo contraponto que só o Oscar seria capaz de criar: a oca-parábola e o triângulo-com-língua-de-fogo-e-garganta.

Niemeyer sempre lembrou dos amigos. Ali, pré-centenário, cita aqueles que lhe fizeram companhia nos anos de exílio, na França, ao projetar de mãos dadas com Picasso, Miró e Calder.

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Algumas imagens da Oca (fonte: Acervo Estadão)

 

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