Euro Oscar, homem holístico, 'pesquisador com algo a mais'

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Por Redação
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Sob a chuva fina da noite de domingo, um homem se debruçava mesa a mesa nos botecos da Vila Madalena, reduto boêmio na zona oeste de São Paulo. Apresentava sua novíssima empreitada. "Com licença. Sou Euro Oscar. O senhor gostaria de ver este livro? É um almanaque de frases, algumas de minha autoria", anunciava, interrompendo rodas de chope com sua "seleção de humor inteligente": 160 frases, das quais oito saíram de sua cabeça; uma é de Charles de Gaulle; e outra, de Dercy Gonçalves. As 150 restantes seguem anônimas, como forma de "preservar" sua atual ocupação. Mais que um compilador, Euro Oscar se diz um "pesquisador com algo a mais".

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Euro Oscar Nogueira, 57 anos, passou os últimos 25 percorrendo a Vila Madalena para vender seu "Livro Holístico", as "apostilas de alto nível intelectual", ou, mais recentemente, os almanaques. "Digo que tenho um 'algo mais' porque pesquiso como um charadista. Trabalhei anos procurando palavras, números e textos para chegar a combinações difíceis de adivinhar. Não é qualquer 'google', não. São informações de altíssimo nível", defende Euro, autor das frases "sempre digo não ao uísque, mas o barulho do bar impede que ele me ouça" e "a maior tragédia do teatro nacional é sua costumeira bilheteria", presentes no almanaque.

Criador de charadas e de palavras cruzadas, o paulistano Euro um dia acreditou que tiraria dos passatempos ganha-pão para a vida inteira. "Comecei aos 14, criando palavras cruzadas para a revista 'Bondinho'. Aos 18, ganhei o primeiro Campeonato Brasileiro do gênero, contra os campeões de cada Estado. Diziam que eu era um gênio, achei que o futuro estava garantido."

Mas, após produzir palavras cruzadas por 10 anos para empresas como Coquetel e Recreativa, se desiludiu. "Enviava centenas de passatempos por mês e ganhava o mesmo que o office boy da empresa. Gastava com papel, canetas, correio, tudo. Não conseguia viver disso", contou. "E isso que estamos falando de um trabalho que gasta tanta energia intelectual quanto o de um mestre do xadrez numa partida campeã."

Após romper com a indústria do cruzadismo, Euro largou também a faculdade de Economia na USP, que estava pela metade. Ele chegava aos 30 anos, era hora de se dedicar integralmente ao que mais gostava: "temas metafísicos e misteriosos", os quais compreendeu "profundamente". "Os maiores enigmas são da vida real. A cura do câncer, a vida após a morte, passei a entender o universo como um todo, e comecei a colocar isso no papel."

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Acessando a internet - "instrumento que ajuda a organizar o mundo de maneira abrangente" - em centros acadêmicos da PUC, Euro começou seu maior projeto, o "Livro Holístico sobre Nutrição e Saúde", que continua a desenvolver. Com 190 páginas no fim dos anos 1990, hoje mais que dobrou de tamanho. São 472 páginas, num livro vendido por CD. "Saem uns três exemplares por mês, já vendi até para Portugal", conta. "Há no livro coisas incríveis, inimagináveis."

A abordagem holística que propõe, com temas que vão do Projeto Genoma ao preparo da argila, é reflexo idêntico da forma como vê o mundo. "O planeta merece esse  tipo de visão. Para entender um problema, basta verificar como ele se relaciona com o que há ao redor, como se harmoniza com o universo", explicou, sentado num restaurante natureba da Vila, onde gosta de jantar, quando o dinheiro dá.

Desde que começou a ver o mundo assim, de forma "universal" - que o levou, entre outros projetos, a criar 280 charadas diferentes em inglês e a ser "recomendado" pelo editor de puzzles do The New York Times, Will Shortz -, Euro passou a acreditar que seu trabalho merece estudo. "É um método algébrico novo, criado por mim. É coisa antológica, com inegável valor pedagógico. Deveria ser adotado em escolas, nas aulas de inglês."

Enquanto nada disso acontece, Euro não faz planos. Diz que continuará lá, na Vila, sempre a partir das 8 da noite, vendendo almanaques - cada um custa R$ 5 e podem ser comprados também em seu site, o Portal Educativo e Ético de Variedades. Desde 2003, ele reúne vídeos (200, com danças gregas e russas), fotos (1.300, no total) e um sem-número de textos, de parábolas budistas a Machado de Assis. "Abrangente como deve ser visto o mundo em que vivemos."

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