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Paulistices, cultura geral e outras curiosidades

Léo, a você um abraço. Sempre!

<B>CRÔNICA</B>

Por Edison Veiga
Atualização:

 Foto: Divulgação

Por Iuri Rodrigues*

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Eles vivem um ao lado do outro e o mais incrível é que eu me batia sempre com eles na Peixoto Gomide durante minhas caminhadas rotineiras. Eu, com minha mochila azul, cansado na volta pra casa; eles, irradiando alegria e distribuindo simpatia. Nesses encontros improváveis que São Paulo oferece, nasceu uma amizade entre a gente.

Para falar de Caio e Léo, lembrei-me de Todd Parr, o escritor canadense que é considerado pela crítica internacional um grande artista/autor. Com seus traços e palavras simples, conquista o mundo das crianças. "Somos um do outro porque você precisava de alguém para beijá-lo quando estivesse triste e nós tínhamos beijos para dar", diz Todd em seu livro 'Somos um do outro'. Caio, assim como todos que adotam, ao dar amor a Léo, consegue iluminar o mundo, e ao abrir sua casa e sua história para que eu pudesse adentrar, iluminou o meu mundo também.

Caio Britto é um baiano barril, como dizem. Sua alegria é tanta que chega a escapar pelos dedos, pelos pés e pelo cabelo que, a todo instante, ousa escorregar pela testa. Advogado e nascido em Salvador, no bairro de Itaigara, veio pra São Paulo aprimorar seus estudos na área jurídica. Inflamado com a rotina nebulosa e fria da capital paulista, adotou Léo e juntos vivem um para o outro na cidade grande cheia de paradoxos, dor e amor, porque São Paulo é muito difícil de ser definida só com palavras.

Já Léo, não. Diferente de Caio, nasceu em Mato Grosso do Sul no dia 14 de março de 2015. Naquele dia aconteceu um dos eventos mais importantes na vida de Caio. Aconteceu um encontro. Léo nasceu e foi direto para os braços do baiano. Na expectativa de salvar Léo, Caio também foi salvo pelo cachorro da raça staffordshire bull terrier, fruto de cruzamentos entre os old buldogues e alguns terriers.

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Caio trabalha durante a semana e Léo fica na escolinha. Obediente e amoroso, já ganhou o carinho de tia Selma, a professora de Léo. Nos passeios pelas ruas labirínticas do centro de São Paulo, Léo e Caio contagiam a galera. Léo é abordado de forma contumaz por onde passa. Caio é paciente. Para, espera Léo fuçar o coleguinha que encontrou na rua e ainda troca conversa com o dono do cachorro.

Quando estive na casa de Léo, seu olhar transmitia tanta energia que parecia um olhar de paz, o que falta em muitas pessoas que chamamos de gente. Léo é um bom anfitrião, cedeu o sofá para que eu pudesse sentar. No embalo do ritmo de Salomão, um cantor de reggae carioca, Léo deitou em meu colo e dormiu. Salomão é um dos seus cantores preferidos.

Bastou Léo dormir em meu colo, com minha mão debaixo do seu rosto macio para eu perceber como fui medroso a vida toda com cachorros. Que bobo que fui, Deus!

Meu medo de cachorro me acompanha desde criança. Acho que deve ter sido o trauma que Duque me causou na infância, um cachorro de uma vizinha de Lagarto que, ao latir toda vez que me avistava, fazia com que meus passos desequilibrassem e eu me espatifasse na calçada de dona Tina.

Quando eu apontava no portão, dona Tina, sempre sorridente, deixava os afazeres domésticos para me receber. E lá vinha ela enxugando as mãos com o pano de prato e ajeitando o avental azul desbotado, tomando a frente para que Duque não me abordasse. Ela insistia em dizer que Duque era da minha idade (ele já morreu), tinha nascido em dezembro de 1988 e que nós não poderíamos ser intrigados um com o outro. Uma vez que vizinhos, na cidade pequena, são irmãos, e as calçadas sempre são extensão da própria casa, o que faz com que a rua se torne um grande casarão com tudo junto e misturado.

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Alcancei a vida de Caio e Léo para que eles pudessem libertar a minha culpa com Duque. Leo é carinhoso. Abraça, funga e baba na busca de receber de volta o amor que ele dá. Quando Caio fala de Léo, seu olhar embaça e sua voz treme.

Finalizo emocionado por ter resgatado a história de Léo para, então, resgatar a minha. Obrigado, Léo e Caio, por sua capacidade de falar o que eu ainda não sabia dizer.

* Iuri Rodrigues é jornalista.

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