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Espaços públicos, caminhadas e urbanidade.

Fecharam a porta da rua da minha infância

Por Mauro Calliari
Atualização:

Rua Selma, Campo Belo. Já com a cancela. Foto: Estadão

A rua onde eu passei todas as tardes da minha infância foi fechada. Primeiro uma cancela, depois um portão. O que virá depois?

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A rua Selma, no Campo Belo, era sem saída e tinha só um quarteirão, mas tinha todo tipo de gente e de casas, desde um quase barraco num grande terreno cheio de mato até a "casa do desembargador", que era muito imponente, apesar de eu não ter a menor ideia do que seja um desembargador até hoje. Alguém que desembarga?

Mas o importante é que, todas as tardes, tinha futebol.

Sem ninguém combinar, o pessoal ia aparecendo: o PedrÃO, o SErgiÃO, o SilviÃO e o PaulINHO, que, apesar do diminutivo, era maior que os outros e foi o único a ter coragem de pular uma fogueira numa festa de São João. Havia outros, Felipe, Valdemar, Junior, meus irmãos... Meninas? Só me lembro de uma, a Selma, que, sim, foi quem deu o nome à rua, mas, não, não jogava futebol. Meninas não jogavam futebol naquela época.

O interessante é que esses meninos só se encontravam na rua, nunca nas casas. A rua era nosso quintal e era ali, numa instintiva separação entre o público e o privado, que acontecia o encontro. O jogo se dissolvia automaticamente com o primeiro grito de mãe, chamando para o banho, ou a lição, ou o jantar.

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Nunca mais vi aquelas pessoas, mas me dou conta de que elas fazem parte da minha história e da história de uma cidade que ainda permitia jogo de futebol na rua.

Rua Selma, Campo Belo. Após a instalação do portão. Foto: Estadão

Dei um jeito de passar por lá duas vezes em caminhadas. Talvez buscasse encontrar alguém ou uma sensação do passado. Na primeira vez, encontrei uma cancela e a rua estava vazia. Na segunda, um portão e a rua continuava vazia. Tenho medo do que poderei encontrar da próxima.

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