Trens e ônibus transportam cada vez mais mulheres

Desigualdade na remuneração de homens e mulheres é uma das razões PARA opção do público feminino

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Por Fernanda Aranda
Atualização:

SÃO PAULO - Dados da pesquisa “Origem e Destino” sugerem que, na última década, foi a bordo de trem, metrô e ônibus que as mulheres chegaram às universidades, invadiram o mercado de trabalho e conquistaram cargos de chefia. Esse longo caminho foi percorrido preferencialmente a bordo de transporte coletivo. Nas bolsas das passageiras, o batom fica ao lado do bilhete único. E elas já se deslocam quase tanto quanto os homens.

 

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Os números do estudo revelam que os sexos masculino e feminino se comportaram de maneiras diferentes quanto à mobilidade nos últimos dez anos. No caso das mulheres, entre 1997 e 2007, as viagens em meios de transporte público aumentaram quase dois pontos na escala, enquanto as feitas de carro ou moto diminuíram. Entre os homens, os índices de uso dos dois tipos de locomoção cresceram no mesmo período.

 

A medição foi feita por um coeficiente que contabiliza o número de viagens realizadas por habitante. As contas ficaram assim: entre eles, o índice de uso de transporte público era 0,6 (viagem/homem) em 1997 e subiu para 0,7 em 2007. Entre as mulheres, o modo coletivo de locomoção subiu de 0,65 (viagem/mulher) para 0,85. Em números absolutos, a diferença fica clara: há dez anos, elas faziam 5.169.628 viagens por dia em transporte coletivo; hoje fazem 7.344.076 por dia, quase o dobro do que faziam há 40 anos (3.989.306). Detalhe: o número de viagens por passageiro/dia, seja homem ou mulher, se manteve na média de dois por dia durante todo esse período.

 

Para as entidades que participaram da pesquisa (Metrô, CPTM, EMTU, SPTrans) não existem mudanças ou adequações na estrutura do transporte público que justifiquem o desequilíbrio no comportamento. Isso porque, apesar das tentativas, não foram criados vagões exclusivos para as mulheres ou qualquer “atendimento preferencial”. Os especialistas ouvidos encontram na desigualdade que prevalece na conta bancária de homens e de mulheres uma das razões para a escolha delas pelo transporte coletivo.

 

O último relatório do Departamento de Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revela que o rendimento mensal das mulheres equivale a 76,3% do recebido pelo homem. O relatório mostra ainda que há dez anos elas respondiam por 50,1% dos desempregados e agora somam 57,5%. “Tudo isso interfere na hora de custear o transporte público, que tende a ser mais barato do que o particular, até para comprar um carro”, resume Sérgio Berti, coordenador da ONG Direção Preventiva.

 

Mas a desvantagem financeira não seria a única explicação. As publicações científicas sobre os efeitos da poluição, de grande responsabilidade dos carros, também colocam as mulheres como principais vítimas - o que faz aumentar a conscientização sobre a importância do transporte coletivo, segundo Cláudio Marte, diretor de mobilidade do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). “Um estudo recente (da Unicamp) revelou que os poluentes - 90% deles emitidos por veículos - contaminam até o leite materno. Outra pesquisa (da USP) constatou que em dias poluídos aumentam os índices de aborto, assuntos que mobilizam mais o público feminino a migrar para os meios públicos”, avalia. Outro argumento de Marte e Berti para explicar a vantagem dos homens nas estatísticas do transporte individual é que carro ainda é sinônimo de masculinidade, de status, o que dificulta deixá-lo na garagem.

 

O consultor de trânsito Horácio Figueira, que participou da OD em 1977, faz uma ressalva às conclusões. “A mulher da capital não é a mesma que mora em Francisco Morato e também difere da que vive em Osasco”, alerta. E ressalta que cada uma das 39 cidades que compõem a região metropolitana, onde foi feito o estudo, tem um perfil diferente de sexo feminino.

 

Para ele, a diminuição do índice de viagens individuais entre elas pode ter sido puxado pela população feminina de menor renda. “O que eu mais vejo é mulher ao volante na capital. Não acredito que as paulistanas são responsáveis por esses índices.”

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