''Tem saída. Vale a pena lutar''

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Por Flavia Tavares
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A suposição de que, uma vez usuário de crack, o dependente químico se torna irrecuperável é desmontada, a duras penas, por aqueles que superam o vício. O caminho doloroso da luta contra a droga tem como combustíveis alguns fatores básicos: uma enorme e incorruptível força de vontade, o apoio da família do dependente, o reencontro com a autoestima e com uma atividade profissional estimulante e, muitas vezes, com a espiritualidade.Alex de Oliveira, de 37 anos, é um dos ex-dependentes estudados pela Unifesp. Abstinente desde 1997, ele começou a usar drogas aos 15 anos, em 1989. Foi escalando da cola para a maconha e para a cocaína, até chegar ao crack, que fumou por dois anos. Chegou a ser detido algumas vezes por roubos e furtos para comprar as pedras. Passou por uma internação no Hospital Geral de Taipas, mas recaiu. Só ao se internar em uma instituição evangélica em Caçapava, no interior paulista, começou a se sentir pronto para largar o vício."Lá havia trabalhos manuais, eu carpia grama, isso foi importante para mim", diz o hoje arquiteto. "Mas a força de vontade e o apoio da minha família foram fundamentais. E a fé também." Alex trabalha com decoração e há três anos também parou de beber. "É importante que o usuário saiba que o crack tem saída, sim. Vale a pena lutar para viver", conclui.Uma dessas portas de saída está nas instituições e clínicas que fazem o atendimento a dependentes químicos. A Horto de Deus, em Taquaritinga, por exemplo, tem hoje, entre seus 35 internos, 23 viciados em crack e já recebeu usuários de todo o País. A direção não tem números sobre a taxa de recuperação dos pacientes. Mas Léo de Oliveira, diretor de tratamento, acredita que seja razoavelmente alta. "Nosso controle é a rede informal de informações que os ex-usuários formam", explica. "Quando alguém recai ou morre, logo alguém fica sabendo e nos conta."Oliveira explica que o tratamento na instituição tem quatro pilares principais. O primeiro parte do princípio que a dependência química é uma predisposição genética e, por isso, precisa ser tratada nos âmbitos científico e comportamental. "É basicamente o tratamento dos efeitos físicos e psicológicos da droga." O segundo é o da disciplina. "Aqui temos horários e regras para tudo, para que o paciente volte a entender a importância da rotina."Caráter. O terceiro pilar do tratamento é a laborterapia. Oliveira acredita que é preciso que o dependente reencontre o amor ao trabalho, a uma atividade produtiva. Por fim, há o fator espiritualidade. "Não se trata de religião. Mas de a pessoa descobrir ou redescobrir os valores do caráter, da retidão moral e da ética, normalmente perdidos com o uso prolongado das drogas." O cuidado com o dependente é associado a um cuidado com a família, que também "fica doente". Mas Oliveira concorda com Alex: "Se a pessoa realmente quer parar com o crack, ela consegue, sim."

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