SP terá Comissão da Verdade para apurar crimes cometidos após a redemocratização

Grupo irá investigar mortes, desaparecimentos e torturas atribuídas a policiais militares, especialmente nas periferias das cidades

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Por Bruno Ribeiro
Atualização:

SÃO PAULO - A experiência da Comissão da Verdade, que funcionou a partir de 2012 para investigar mortes, torturas e desaparecimentos durante a ditadura militar do País, será empregada para apurar crimes cometidos pelo Estado de São Paulo no período posterior à redemocratização, a partir de 1988. A Comissão da Verdade da Democracia “Mães de Maio” teve sua primeira reunião realizada na tarde desta sexta-feira, 20, em um dos auditórios da Assembleia Legislativa do Estado.

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A comissão pretende investigar crimes cometidos por policiais militares e arquivados por promotores de Justiça e juízes contra civis.

Os primeiros focos dos trabalhos serão o Massacre do Carandiru, ocorrido em 1992 e cujos policiais envolvidos, já condenados, ainda estão em liberdade, as quase 500 mortes ocorridas durante o confronto entre policiais e membros da facção Primeiro Comando da Capital (PCC) em maio de 2006 e a série de chacinas cometidas por motoqueiros mascarados ao longo de 2012.

Crimes contra mulheres também serão apurados Foto: RENATO S. CERQUEIRA/FUTURA PRESS

Na reunião desta sexta, as diversas entidades presentes determinaram ainda a criação de grupos temáticos para pesquisar especificamente casos de torturas ocorridos na Fundação Casa, abusos contra populações indígenas e o racismo dentro das instituições de segurança – uma vez que a maior parte das vítimas do Estado são jovens negros, de baixa renda e moradores de bairros das periferias.

“É uma ação articulada com o Ministério da Justiça e a Secretaria Especial de Direitos Humanos. É um projeto nacional, pelo menos que vai abranger São Paulo e Rio de Janeiro. Esse projeto está atrasado em um ano, uma vez que 15 dias acaba essa legislatura. Mas, independentemente disso, é uma coisa importantíssima, que vai analisar o modus operandi das execuções extra judiciais que ocorreram após 1985. É uma sequencia dos chamados crimes do esquadrão da morte”, disse o deputado Adriano Diogo (PT), criador da comissão – que também esteve à frente da Comissão Paulista da Verdade.

Com agenda já preenchida até julho, a expectativa é que, com a saída de Diogo, que não foi reeleito, os trabalhos sejam conduzidos pelo petista João Paulo Rillo.

Mães de Maio. A comissão leva o nome do grupo Mães de Maio, um movimento criado por familiares de pessoas executadas, desaparecidas ou mortas em supostos confrontos com a Polícia Militar durante os ataques de maio de 2006. A fundadora do movimento, Débora Maria da Silva, de 55 anos, fez parte da mesa de abertura da comissão. As discussões variaram ao redor da questão racial relacionada às mortes até a inclusão de temas como a desmilitarização da polícia e a descriminalização das drogas.

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“Se a ditadura militar acabou, as práticas da polícia militar não podem ser iguais até hoje”, afirmou Débora Maria, que se emocionou várias vezes na cerimônia de abertura da comissão. Ela disse não se preocupar com eventuais atritos ocorridos com policiais e políticos identificados com a chamada “bancada da bala”. “Nós os enfrentamos na rua, não será na casa do povo que vamos recuar”, afirmou a militante.

A comissão paulista terá consultoria das comissões nacionais da Anistia e de Mortos e Desaparecidos. Dois pesquisadores, Maria Pia e José Filho, foram cedidos pelos órgãos federais para sistematizar os trabalhos: uma parte das ações será a coleta e o detalhamento de casos concretos de violações cometidas por forças de segurança e outra consistirá em analisar os procedimentos herdados do regime militar que ainda são empregados.

“É comum que se diga que as polícias herdaram práticas da ditadura militar, mas ainda não se tem estudos que demonstrem isso”, disse Dario de Negreiros, integrante da Comissão de Anistia que participará dos trabalhos em São Paulo.

O grupo pretende ouvir, além de vítimas e familiares de vítimas de violações da Polícia Militar, os próprios agentes acusados desses delitos. Diferentemente do que ocorreu na Comissão da Verdade da ditadura, muitas dessas pessoas ainda estão nas mesmas funções e, no caso delas, não há discussões sobre

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