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Prédio com invasor pode pagar IPTU Progressivo

É o que pede o Ministério Público Estadual à Prefeitura, que vai analisar a medida

Por Bruno Ribeiro e Sarah Teófilo
Atualização:
Argumento. Prédio invadido em Santa Cecília; para promotoria, imóveis são precários e oferecem riscos a moradores Foto: JF DIORIO /ESTADÃO

SÃO PAULO - O Ministério Público Estadual (MPE) quer que a Prefeitura de São Paulo enquadre dezenas de prédios abandonados do centro da cidade, e que foram invadidos por movimentos de moradia, nas regras do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) Progressivo, que prevê impostos mais altos para imóveis vazios. A Procuradoria-Geral do Município deve apresentar, em até um mês, parecer jurídico sobre o tema. 

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A relutância da gestão Fernando Haddad (PT) em aplicar a norma a esses imóveis reside no fato de não haver entendimento a respeito dessa situação: um imóvel abandonado pelo dono, mas que é usado por outras pessoas. Para a Prefeitura, há dúvida se imóveis ocupados por sem-teto poderiam ser considerados “ociosos”.

A Promotoria de Habitação e Urbanismo abriu inquérito para apurar a falta de notificação para esses imóveis específicos. O entendimento é que a notificação dos prédios passíveis da cobrança de IPTU Progressivo deveria incluir as invasões porque, para o MPE, essas habitações são precárias, podem trazer riscos e não poderiam ser consideradas cumpridoras de sua função social. 

“Tivemos uma reunião na semana passada com representantes das secretarias de Habitação e de Desenvolvimento Urbano. Eles disseram que iriam solicitar um parecer à Procuradoria. Então vamos aguardar”, disse o promotor do caso, Marcus Vinicius Monteiro dos Santos.

O secretário municipal de Habitação, João Sette Whitaker, que também espera o parecer, afirma que a questão de fundo é o texto das regras do IPTU Progressivo. “Quando a legislação regulamentou o IPTU Progressivo, ele não diferenciou a ocupação como regular ou irregular.” Assim, gestores têm receio de aplicar a penalidade de forma indevida. Whitaker afirma que outras soluções podem ser adotadas nesses locais e estão sendo discutidas, como acordos de locação social envolvendo proprietários e ocupantes, com a intermediação da Prefeitura, segundo os termos do Plano Municipal de Habitação.

Imposto. O IPTU Progressivo é um instrumento previsto no Estatuto das Cidades, aprovado no País em 2001. A lei prevê que imóveis devem cumprir uma função social e, caso não o façam, podem ser passíveis de penalidade. Em São Paulo, a regulamentação do tema prevê que a alíquota do IPTU passe de 1% para 2% do valor venal a partir do primeiro ano de notificação, depois indo para 4%, e assim por diante, até o teto de 15%. Depois disso, o imóvel é passível de desapropriação. As regras determinam que, recebida a notificação, o proprietário do imóvel tem um ano para encontrar um uso para sua propriedade - a alíquota maior só passa a vigorar se esse prazo estoura e o dono não faz nada.

Entre especialistas em Direito Urbanístico, entretanto, o consenso é que a Prefeitura deve notificar os proprietários. Mas se eles devem pagar o imposto ou não, há dúvidas.

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“A Prefeitura deve notificar esses imóveis”, diz a doutora em Direito Urbanístico da PUC-SP Daniela Libório. A advogada afirma que os proprietários deixaram seus imóveis ociosos, às vezes para a retenção especulativa, e que o instrumento não pode deixar de ser usado porque outros grupos, “que ocuparam justamente para chamar a atenção para o problema”, passaram a usá-los.

Para o vice-presidente da Comissão de Direito Urbanístico da Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Pedro Augusto Machado Cortez, depois de notificado, o proprietário pode, na Justiça, tentar evitar a cobrança, pedindo a reintegração de posse caso não tenha feito isso antes. “A notificação deve ser feita se o imóvel estiver ocioso. Aí, cabe o dono mostrar que a propriedade não está sendo exercida.” 

Movimentos. O coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Guilherme Boulos, afirma ser favorável ao IPTU Progressivo. “Mas ele não pode ser usado de forma a instrumentar a ação de despejo de pessoas que ocupam imóveis ociosos.” A equipe de transição do prefeito eleito, João Doria (PSDB), informou que ele pretende atuar para resolver o impasse, buscando construir uma saída com os movimentos sociais, o Ministério Público e os proprietários.

Até setembro, 1.152 imóveis foram notificados

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Balanço da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano mostra que, desde novembro de 2014, 1.152 imóveis da capital foram notificados para encontrar alguma destinação para escapar das regras do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) Progressivo. A maioria - 637 locais - é de imóveis não utilizados: construções prontas e vazias.

No restante, 356 endereços notificados eram terrenos vazios, sem nenhuma edificação, e outros 153, imóveis cuja área construída é menor do que o mínimo que a legislação exige.

Do total, 597 endereços ficam na área da Operação Urbana Centro. Cerca de outros 100 estão situados na área da Operação Urbana Água Branca, zona oeste. A Prefeitura havia iniciado a notificação dos imóveis passíveis de aplicação da lei nas áreas de operações urbanas e na região central. O bairro da Mooca, por exemplo, tem cerca de 50 imóveis na relação. Ao todo, a Prefeitura já identificou outros 269 passíveis de notificação pela lei. 

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3 perguntas para Karina Leitão, professora da FAU-USP

1. O IPTU Progressivo é capaz de dar destinação aos imóveis ociosos da cidade?

Sim, mas ele por si só não promove a justiça social. 

2. O poder público deve entender que imóveis ocupados por movimentos sociais são locais ociosos?

Não existe consenso. O Ministério Público entende que deve notificar o proprietário, mas melhor do que isso é o que está sendo discutido no novo plano de habitação, que prevê instrumentos de locação social nesses imóveis.

3. É correta a cobrança de IPTU Progressivo em imóveis invadidos por movimentos sociais?

Não dá para afirmar isso, porque o problema é complexo em termos jurídicos. A Prefeitura não tem toda segurança jurídica para notificar. Se por um lado o proprietário não cumpre suas obrigações, por outro foi o movimento que deu a função social ao imóvel.

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