Nem trem, nem ônibus, nem carro. Maioria ainda vai é a pé

Mas, na década, deslocamentos feitos em ônibus cresceram três vezes mais do que em automóveis

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Por Vitor Hugo Brandalise e de O Estado de S.Paulo
Atualização:

SÃO PAULO - O morador da Região Metropolitana de São Paulo utiliza mais o próprio carro do que os ônibus, mais os ônibus do que o metrô, mais o metrô do que os trens. Também se desloca cada vez mais em motocicletas, em veículos escolares, em bicicletas. E cada vez menos nos táxis. Mas para o morador do maior conglomerado urbano da América Latina, a julgar pelo número de viagens realizadas num dia, o meio de transporte mais comum continua sendo o mais simples - esse morador ainda anda, e muito, a pé.

 

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Os números da última pesquisa “Origem e Destino” permitem entender essa dinâmica. A partir deles se percebe, por exemplo, que o reinado do carro individual está enfraquecendo. Em 2007, foram 10,4 milhões de viagens de carro diárias pela região metropolitana - um aumento de 8,3% em relação à pesquisa anterior, de 1997, quando o número de viagens por dia foi de 9,6 milhões. 

 

 

 

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Trata-se, porém, de uma tendência de aumento muito inferior à ascensão verificada no número de viagens de ônibus, o transporte coletivo mais utilizado. Em 2007, foram cerca de 9 milhões de deslocamentos diários de ônibus, ante 7,2 milhões de viagens por dia em 1997 - aumento de 25%, três vezes superior ao verificado nas viagens individuais de carro. Isso tudo, considerando aumento de 16% na frota de automóveis.

 

Para economistas ouvidos pelo Estado, a explicação está no aumento da oferta de emprego (de 6,9 milhões de pessoas ocupadas em 1997 para 9 milhões, dez anos depois). “Como temos base larga na pirâmide de renda, quando a população dessa faixa consegue melhorar um pouco o faturamento mensal o transporte coletivo já se torna possível. A dificuldade é muito maior, por exemplo, para a população que está acima conseguir comprar um carro”, explica o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Alexandre Gomide, ex-diretor da Secretaria Nacional de Transporte e Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades. “Além disso, só se desloca quem tem o que fazer, onde trabalhar.”

 

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Ir ao trabalho e voltar é, de fato, a razão maior das viagens - envolve cerca de 17 milhões (44,5%) dos 38,2 milhões de deslocamentos (motorizados ou não) por dia. Educação vem logo atrás, como motivação para 13 milhões de viagens (34% do total). Notam-se, também, algumas surpresas, nos hábitos de deslocamento do morador da região metropolitana: como explicar, por exemplo, que o número de viagens a lazer tenha diminuído nesse espaço de dez anos ou que o número de deslocamentos destinados a compras tenha permanecido no mesmo patamar, com aquecimento da economia e tudo? “Por segurança, ou para não enfrentar congestionamentos, as pessoas podem estar preferindo o lazer doméstico. As casas, hoje, estão realmente mais confortáveis”, afirma Gomide. “Até mesmo para compras pelo serviço eletrônico.”

 

Os números da pesquisa redescobrem, também, a figura do pedestre. Dos 38,2 milhões de deslocamentos diários, exatamente um terço (12,6 milhões) é realizado, simplesmente, a pé. “Mostra a importância de oferecer boa infraestrutura, com sinalização e espaço adequados, a quem circula pela cidade”, avalia o consultor Flamínio, especialista em engenharia de tráfego. A OD também registra que a hora do almoço é o momento em que os pedestres reinam mais absolutos nas ruas, quando suas viagens correspondem, sozinhas, a 50% do total de deslocamentos. 

Motos

Veículo mais notado na metrópole e seus arredores, a motocicleta cumpre seu papel na pesquisa: trata-se do meio de transporte que mais registrou aumento (388%) no espaço de dez anos - de 145.651 viagens em 1997 para 710.638, em 2007. “Reflete o que vemos nas ruas”, afirma Fichmann. “São milhares de pedestres atravessando as faixas, milhares de motos cruzando as vias.”

 

Só os taxistas perderam passageiros desde 97

 

Enquanto as viagens de ônibus, metrô e trem aumentaram a taxas de dois dígitos, o táxi - cuja frota, de 33,7 mil carros apenas na capital é a terceira do mundo - amargou diminuição no número de deslocamentos, na comparação entre os dez anos que separam as pesquisas. Em 1997, houve 103.397 deslocamentos diários de táxi na região metropolitana, ante 91.043 em 2007, diminuição de 11,95%. Foi a única queda registrada entre os nove meios de transporte analisados na “Origem e Destino”.

 

Para pesquisadores, a queda é motivada, principalmente, pelo alto preço da “corrida” na cidade. “Comparando com outras capitais, como Buenos Aires, o preço aqui é absurdo. Como hoje há mais opção, o passageiro vai de metrô ou ônibus”, avalia o consultor de tráfego Flamínio Fichmann. Para o pesquisador Alexandre Gomide, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), a queda é reflexo de melhorias na economia. “Hoje, as pessoas que tinham condição de pagar eventualmente para sair de táxi já têm meios para comprar seu carro.” Para o Sindicato dos Taxistas Autônomos de São Paulo, a queda aconteceu por “coincidência geográfica”. “A maioria dos pontos (22 mil) fica no centro, cujas linhas de metrô e ônibus aumentaram nos últimos dez anos”, avalia Natalício Bezerra, presidente da entidade.

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Também chama a atenção o aumento no número de viagens de bicicleta, na comparação entre os dois períodos - em 2007, o número de deslocamentos diários foi 305.052, aumento de 87% em relação a 1997 (162.461). “Sinal de que a população pensa mais em meios de transporte ambientalmente corretos”, afirma Gomide. “A tendência para 2017 é que esse modo de transporte apareça com mais força na próxima pesquisa”, disse Raul Borges, do Departamento de Geografia da Unesp de Presidente Prudente.

 

(Colaborou Eduardo Reina)

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