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MP que dá R$ 650 mi de folga na dívida a SP causa reação

Dispositivo incluído na Medida Provisória 618 altera norma de contabilidade e gera protesto de outras cidades

Por Lu Aiko Otta e Brasília
Atualização:

A Prefeitura de São Paulo poderá obter folga de R$ 650 milhões no pagamento da dívida ao Tesouro Nacional, graças a um dispositivo incluído na Medida Provisória 618, editada na quinta-feira. O dispositivo - que altera uma norma da contabilidade pública - tem como consequência esse benefício ao Município, o que já despertou reações políticas. A MP, cujo centro é a injeção de R$ 30 bilhões no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e na estatal ferroviária Valec, tem um artigo que autoriza prefeituras a excluir, do cálculo de receitas correntes, recursos obtidos com a emissão de autorizações para construir. São papéis que a prefeitura vende uma única vez para cada terreno, permitindo a instalação de imóvel na área.Segundo o Ministério da Fazenda, a alteração foi feita porque essas são receitas financeiras e não têm a mesma natureza de imposto ou taxa. Ocorre que a receita corrente é a base sobre a qual se calcula o valor da prestação que a prefeitura paga ao Tesouro, pelas dívidas roladas em 2000. A mensalidade corresponde a 13% delas. Ao excluir itens que hoje compõem a receita, a prestação cai. "É uma economia eventual para todos os municípios que emitem esses títulos", explicou o secretário municipal de Finanças, Marcos de Barros Cruz, acrescentando que a mudança no cálculo da receita corrente foi sugerida pela Prefeitura em setembro.O secretário afirmou que a redução só ocorre quando os papéis são emitidos. Neste ano, por exemplo, a Prefeitura não vendeu nenhum, mas houve ano em que a emissão ultrapassou R$ 1 bilhão. Além disso, a MP permite o desconto dos títulos já emitidos. Nesse caso, existe um estoque da ordem de R$ 5 bilhões. A economia decorrente dessa MP seria aproximadamente 13% disso, ou R$ 650 milhões. Isso corresponde a 20% de tudo o que a Prefeitura entregou ao Tesouro no ano passado. A cidade de São Paulo deve R$ 53 bilhões ao governo federal, que em 2000 assumiu as dívidas da cidade com o mercado e passou a ser seu credor, em uma operação de salvamento financeiro feita também com os Estados. Na ocasião, a Prefeitura concordou em pagar uma taxa de juros de 9% acima da inflação, que na época era cara e hoje é considerada exorbitante. "É um grande problema para a cidade", disse Cruz. Os gastos com as prestações são superiores aos investimentos. Por causa disso, a taxa de investimento por habitante em São Paulo é metade da do Rio de Janeiro. Vitrine. O peso da dívida foi tratado pelo prefeito Fernando Haddad em seu discurso de posse. Uma solução para a dívida paulistana é prioridade para o governo federal, que terá a cidade como uma de suas principais vitrines nas eleições de 2014. Esse dispositivo da MP - que beneficia todas as cidades, mas parece ter sido feito sob medida para São Paulo - provocou reações imediatas. Relator de um projeto de lei complementar que muda todos os contratos de refinanciamento de dívidas entre o Tesouro Nacional e os Estados e municípios, o líder do PMDB, deputado Eduardo Cunha (RJ), informou que fará parte da comissão especial que analisará a MP. E vai propor emenda retirando do cálculo das receitas correntes os royalties e participações especiais de petróleo. "Se a justificativa deles é porque a receita é financeira, os royalties e participações especiais também são."Ele disse que não tem nada contra ajudar São Paulo, mas quer que outras cidades também se beneficiem. "Não pode ser um sapato para um pé só." A emenda que ele promete apresentar beneficiaria enormemente o Rio. Admitindo não ter examinado os números, o deputado suspeitava que o benefício para a cidade pode ser maior, de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões, o que permitiria à Prefeitura ficar vários meses sem pagar ao Tesouro.Imbróglio. Um alívio nas dívidas era a contrapartida do governo federal para que Estados aceitassem a reforma do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O imbróglio deve dominar a reunião extraordinária do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) marcada para amanhã.

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