'Morcegões' espalham lixo pelas ruas

Caminhões clandestinos circulam à noite atrás de material reciclável, deixam rastro de sujeira e empobrecem produção de cooperativas

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Por Vitor Hugo Brandalise
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À noite, uma frota de caminhões clandestinos de lixo percorre as ruas de São Paulo em busca de material reciclável. São os "morcegões", caminhões sem identificação que recolhem produtos recicláveis separados pelos moradores, para levar a centrais de triagem clandestinas. Pelo caminho, deixam um rastro de sujeira nas ruas da capital. Também trazem prejuízo às 16 cooperativas conveniadas com a Prefeitura - os sacos de lixo abandonados nas ruas chegam a ter valor de 20% a 30% menor do que o material recolhido nos condomínios.Os veículos irregulares - caminhões das décadas de 1970 e 1980, com placas apagadas ou escritas à mão - aproveitam-se da ineficiência da rede de coleta seletiva na cidade, que conta com 66 caminhões. Seriam necessários 500. "O resultado é que o material mais valioso não chega às cooperativas. É um dos motivos para a dificuldade que têm em se manter", afirma René Ivo, coordenador da Coleta Seletiva Solidária do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos.Como nunca houve fiscalização específica, a Prefeitura não sabe o número de caminhões que circulam na capital - na estimativa das empresas de coleta, Loga e Ecourbis, são "ao menos cem". Para as cooperativas de reciclagem, "são centenas".Das 22h de quarta-feira às 2h de quinta, o Estado flagrou cinco caminhões irregulares recolhendo lixo em áreas nobres da capital - Jardim Paulista e Cerqueira César, na zona sul, e Pinheiros e Vila Madalena, na zona oeste. Esses locais são procurados pelas características dos resíduos - mais alumínio e plástico - e por serem bairros em que a coleta seletiva é mais difundida (fazem parte das Subprefeituras da Sé e de Pinheiros, duas das que mais reciclam). Itaim-Bibi e Vila Mariana, na zona sul, são outros bairros visados, também pelas características do lixo.Batizados de "morcegões" por atuarem à noite, os caminhões circulam diariamente - diferentemente da coleta seletiva oficial, que passa uma vez por semana. "Vêm toda noite e pegam o que interessa. Deixam o resto para trás, de qualquer jeito", diz o comerciante Joaquim de Araújo, de 55 anos, proprietário de um posto de gasolina nos Jardins.Os caminhões - abarrotados até o topo e com duas ou três pessoas empoleiradas em cima - circulam em alta velocidade. Além do problema da segurança, seus ocupantes, geralmente menores de idade, abrem os sacos de lixo e pegam só o que interessa. Na frente de um flat na Rua Haddock Lobo, por exemplo, abandonaram revistas e embalagens no chão. Do outro lado da rua, o rastro de outro morcegão foram restos de lixo orgânico.Nunca enfrentado. O problema - alvo de reclamação das cooperativas de reciclagem, que dizem ficar com "o lixo" do material reciclado - nunca foi enfrentado. "Não há mapeamento. Para entender o problema e depois enfrentá-lo, é necessário investigação", disse Elisabeth Grimberg, coordenadora executiva do Instituto Pólis. "É uma ponta desconhecida do problema com a coleta seletiva em São Paulo."Segundo o Departamento de Limpeza Urbana (Limpurb), não há previsão de operações específicas contra os clandestinos. "A maioria deles é contratada por estabelecimentos que são grandes geradores de lixo e não respeitam a legislação", informou, em nota. A fiscalização, nesses casos, atua somente em caso de denúncia ou flagrante.PuniçãoR$ 250 é a multa para coleta irregular R$ 12 mil é a multa para quem descarta lixo e entulho nas ruas

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